No dia seguinte ao panelaço realizado em diversas cidades do País durante seu pronunciamento em rádio e TV, a presidente Dilma Rousseff disse ontem não ver motivo para um pedido de impeachment de seu mandato, criticou a tentativa de se criar um “terceiro turno” e avisou que a sociedade brasileira está amadurecida a ponto de não permitir uma “ruptura democrática”. A presidente defendeu, no entanto, o direito das pessoas se manifestarem, desde que sem violência. Uma série de novas manifestações contra seu governo está programada para ocorrer no próximo domingo.
“Eu acho que há de caracterizar razões para o impeachment, e não o terceiro turno das eleições. O que não é possível no Brasil é a gente também não aceitar a regra do jogo democrático. A eleição acabou, houve o primeiro e o segundo turno”, disse Dilma, depois de participar de solenidade no Palácio do Planalto em que sancionou lei que tipifica o crime do feminicídio.
“Terceiro turno das eleições para qualquer cidadão brasileiro não pode ocorrer, a não ser que você queira uma ruptura democrática. Se quiser uma ruptura democrática, eu acredito que a sociedade brasileira não aceitará rupturas democráticas e acho que nós amadurecemos suficiente para isso.”
Questionada se as manifestações pró-impeachment seriam legítimas, Dilma respondeu: “Convocar, quem convocar, convoque do jeito que quiser, ninguém controla quem convoca. A manifestação vai ter as características que tiver seus convocadores. Ela em si não representa nem a legalidade nem a legitimidade de pedidos que rompem a democracia”.
Sobre a manifestação de brasileiros com panelaços, vaias e xingamentos durante a transmissão do pronunciamento em rede nacional de rádio e TV, Dilma disse que na democracia é preciso “conviver com a diferença”. E comemorou o fato de no Brasil as pessoas poderem se manifestar. “O Brasil tem uma característica que eu julgo muito importante e que todos nós temos de valorizar, que é o fato de que aqui as pessoas podem se manifestar, e têm espaço para isso, e têm direito a isso. Eu sou de uma época que, se a gente se manifestasse, fizesse alguma coisa, acabava na cadeia, podia ser torturado ou morto. O fato de o Brasil evoluir, passar pela Constituinte de 1988, passar por processos democráticos e garantir o direito de manifestação é algo absolutamente valorizado por todos nós, que chegamos à democracia e temos de conviver com a diferença”, afirmou. “O que nós não podemos aceitar é a violência, qualquer forma de violência não podemos aceitar, mas manifestação pacífica elas são da regra democrática”, ressaltou.
Já perdeu. Mais cedo, o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, minimizou o panelaço, ao dizer que as manifestações ocorreram em cidades e em bairros onde a presidente petista perdeu as eleições “por uma grande diferença”. Usou também a mesma expressão de Dilma ao dizer que estão querendo promover um terceiro turno. “A primeira regra do sistema democrático é reconhecer o resultado das urnas. Só tem dois turnos, não tem terceiro turno. Nós vencemos pela quarta vez (as eleições)”, declarou o ministro, argumentando que Dilma sempre usa a cadeia de rádio e televisão para o dia da mulher.
Mercadante destacou que toda manifestação pacífica “é um direito da população”, mas pediu que não haja “intolerância” ou “radicalismo”. Ele demonstrou ainda “preocupação” com o momento pelo qual o País atravessa: recém-saído de uma eleição “bastante polarizada”, com momento de “radicalização”.
“Precisamos construir uma cultura de tolerância, de diálogo e respeito. Uma agenda de convergência é fundamental para o País poder superar dificuldades conjunturais o mais rápido possível, garantir a estabilidade (econômica) e a retomada do crescimento”, disse.
Mercadante aproveitou para voltar a defender o ajuste fiscal e comparou a necessidade de adotar estas duras medidas, com a ida ao dentista. “Ajuste fiscal é como ir ao dentista. Ninguém quer, mas de vez em quando tem que ir”, disse ele, ao comentar que o governo “esgotou” os instrumentos que vinha adotando para enfrentar a fase mais aguda da crise e que agora parte do sacrifício terá de ser dividido com a sociedade. Foi o mesmo argumento usado por Dilma no domingo na TV.
(Tânia Monteiro e
Rafael Moraes Moura)