O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, principal líder do PSDB e, portanto, um dos expoentes da oposição, já tem uma posição clara diante da crise: nem apoio ao impeachment nem pacto com o PT. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, na segunda-feira, 9, FHC disse que o horizonte mais provável é de que o governo "fique cozinhando o galo em fogo brando" nos próximos quatro anos. Mas ressalvou que, em política, "nada é impossível". E criticou Lula: "Ele quer é acusar. Ele é o bom, nós somos os maus. Então, não há como dialogar com quem não quer dialogar".
"Como todo brasileiro, com muita preocupação. Sem esperança, não vendo uma saída.
Sobre o panelaço de domingo e a manifestação de 15 de março, Fernando Henrique acredita que o movimento será de grandes proporções. "Essa manifestação vai ser realmente grande, mas é produto das redes sociais, de vários setores da sociedade, independentes uns dos outros, por motivos diferentes. E totalmente independente dos partidos".
Comparando os protestos atuais com as manifestações que tomaram as ruas em junho de 2013, o ex-presidente afirma que, "sociologicamente, vai ser uma comparação interessante. Em 2013, era contra tudo, agora é direcionada contra o governo. Mas vamos esperar para ver. O PSDB faz bem em não chamar para a rua. A rua, neste momento, não é dos partidos, é do povo. É o povo que vai para a rua".
Petrobras
Para FHC, o peso da Petrobras na crise é muito grande, "a Petrobras é uma empresa vital para o Brasil.
Congresso
"O governo criou caso com a própria base, então fica difícil. A presidência do Senado devolveu a medida provisória das desonerações.
Questionado sobre se o envolvimento de 47 políticos na Lava Jato poderia ajudar o Planalto, FHC acredita que sim. "De certo ponto, sim. Mas acho que o importante para o Planalto é dar eficiência ao Congresso, para conseguir as votações do ajuste. Isso não dá eficiência ao Congresso, muito pelo contrário. Dá é paralisia."
Comparação histórica
"Eu só vi uma situação parecida, em 1963, quando houve um descolamento entre o Congresso e o governo, e o governo foi perdendo a capacidade de governar. Quando o Congresso percebe que o Executivo não tem agenda, está tonto, fazendo uma agenda que não é a dele, o Congresso fica mais inerte. E se você perde a força aqui, você perde a força no mundo", diz FHC.
Collor
Fernando Henrique descarta fazer uma conexão do governo Dilma com o de Collor. "Não creio. A conexão com o Collor é que ele não sabia como manejar com o Congresso, não tinha amor pelo Congresso, ficava isolado. Nesse sentido, há alguma similitude, mas só nisso. Na época, a sociedade sancionou o impeachment, Collor não reagiu e os partidos tinham condição de operar a transição. Não vejo a mesma coisa hoje."
PMDB
Perguntado sobre se a crise jogaria o PMDB para o PSDB, o ex-presidente discorda. "Não para o PSDB, mas para a oposição. O PMDB já está na oposição e com razão. Que ministérios eles têm? Qual o peso deles? Não tem. O PMDB não participa da negociação política, das decisões do governo", analisa.
Sobre a frase do senador Aloysio Nunes se referindo aos próximos quatro de governo anos como "deterioração controlada", FHC acredita que seu partido está 'digerindo' a crise e tentando entender até onde ela vai. "O que ele quis dizer é que não haverá uma ruptura, as coisas vão ficando mais desengonçadas, mas se mantêm".
Eduardo Cunha e Renan Calheiros
"Bem, até que esses dois atuam e, no próprio PSDB, raramente nós tivemos uma bancada de senadores tão poderosa. Só não sei no que vai dar tudo isso da Lava Jato. E tem uma coisa: a circunstância é que faz as lideranças. O desafio é tão grande que vai empurrar as lideranças, senão para controlar a onda, porque às vezes é impossível, pelo menos surfar nela", afirma Fernando Henrique sobre os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB), envolvidas na Operação Lava Jato.
Anastasia
Sobre Antonio Anastasia, alvo de inquérito criminal no Supremo sob suspeita de ter recebido dinheiro desviado da Petrobras, FHC acredita que o nome do senador foi colocado na lista do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para enfraquecer o PSDB. "Ele foi posto lá para isso." Questionado sobre quem teria inserido o nome, FHC é enfático, "Ora, quem? O responsável final é o procurador. A acusação é vaga, parece história da carochinha. Se encontrarem, vale aquilo: errou, pagou. Mas acho que não vai chegar a isso".
PT-PSDB
"Qual seria o significado de um encontro meu com o presidente Lula?", questiona Fernando Henrique. "Ele tem que, primeiro, pacificar lá a situação do partido dele. E qual é a pauta? Nunca me neguei a discutir uma pauta. Agora, essa discussão não pode ser um conchavo, tem de ser uma discussão sobre como melhorar a situação política, econômica e social. Quais são os itens? Dá para convergir? Não dá? Mas a visão do presidente Lula não é essa, ele quer o contrário, quer acusar. Ele quer dizer quem são os bons, quem são os maus. Ele é o bom, nós somos os maus. Então, é quase impossível. Não há como dialogar com quem não quer dialogar", avalia.
A convocação de Lula ao "exército do Stédile" é uma retórica preocupante, acredita FHC, "quem foi presidente da República não tem o direito de brincar com questões sérias. Convocar para a briga e menosprezar inclusive o Exército, porque citou um outro exército, é indesculpável. Todo mundo está vendo o que está acontecendo aqui. Um descalabro".
Foi o FHC
Questionado sobre o "Foi o FHC", o ex-presidente se diz envaidecido: "Foi o FHC! É patético, mas eu fico até envaidecido, porque, depois de mais de 12 anos, eu até fico pensando: 'Meu Deus, que força que eu tive!'".