Desde que iniciou o segundo mandato, em janeiro, Dilma está isolada. Sem conseguir dialogar com os atores econômicos e políticos, tornou-se refém de seu ministro da Fazenda, Joaquim Levy - de uma escola liberal tão atacada por ela durante a campanha -, e de seu principal aliado no Congresso, o PMDB, partido cujos integrantes sempre dizem se sentir "desprezados" pela presidente e por outros petistas.
"A vida é mais complexa do que parece", costuma repetir Dilma aos auxiliares mais próximos.
Com a popularidade em queda - 64% dos brasileiros consideram seu governo ruim ou péssimo - e a base de sustentação parlamentar em frangalhos, a presidente sofre uma derrota atrás da outra no Congresso. Todas elas protagonizadas pelo PMDB, que chefia a Câmara dos Deputados com Eduardo Cunha (RJ) e o Senado com Renan Calheiros (AL). Os dois peemedebistas - ao lado de outros 33 parlamentares - são alvo da Operação Lava Jato, um dos principais fatores da desestabilização política. Desde que a dupla passou a ser considerada suspeita oficialmente, com a abertura de inquéritos no Supremo Tribunal Federal, o clima político recrudesceu.
Em pouco mais de três meses de segundo mandato, Dilma já trocou cinco ministros. Além de Cid Gomes, que deixou a pasta de Educação após protagonizar um confronto direto com Cunha na Câmara, saíram Thomas Traumann (Comunicação Social), defenestrado após vazamento de um documento que apontava "caos político" no governo; Pepe Vargas, que foi transferido para Direitos Humanos logo após Dilma ser obrigada a passar a articulação política do governo para o vice Michel Temer; e Marcelo Neri, substituído na Secretaria de Assuntos Estratégicos pelo peemedebista Mangabeira Unger. Ideli Salvatti, que estava nos Direitos Humanos foi a quinta a perder o cargo.
Oposição
"São cem dias de desgoverno", disse na quinta-feira o líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE), que levou um bolo preto ao plenário com a inscrição "Sem (sic) dias de Dilma 2", acompanhado de duas estrelas vermelhas do PT.
Até dois dias atrás, quando Dilma oficializou seu vice peemedebista no posto de articulador político, quem se destacou na função foi o ministro da Fazenda. Levy foi obrigado a entrar em cena para negociar com os parlamentares e pedir apoio ao ajuste fiscal que o governo tenta aprovar. Mas até o PT é contra as medidas, que restringem o acesso de trabalhadores a benefícios como seguro-desemprego e abono salarial.
"Levy tem se esforçado bastante para aprovar as medidas, mas um ministro da Fazenda não pode se expor assim", disse o senador Delcídio Amaral (PT-MS). "A articulação política do governo precisa funcionar."
Nesses cem dias, não foram poucas as queixas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em relação à sua sucessora, que não lhe dá ouvidos. Nos bastidores, até mesmo auxiliares de Dilma dizem que ela não tira a crise de cima da mesa e "o máximo que consegue é encaixá-la na gaveta".
Num cenário marcado por problemas com aliados, nomeações emperradas, inflação alta, "pibinho" e desemprego batendo à porta, a crise política acabou se convertendo no principal fator de incerteza na economia.
Se, por um lado, a chegada de Levy aumentou a confiança de que as contas públicas serão ajustadas, abrindo espaço para a queda dos juros, por outro, as dificuldades de relacionamento do Planalto com o Congresso lançam dúvidas sobre o quanto será possível avançar com os cortes de gastos e aumento das receitas.
É por causa desse ambiente negativo que os investimentos privados - grande aposta do governo para a retomada do crescimento - não deslancham. Do ponto de vista dos investidores estrangeiros, por exemplo, o momento é favorável para trazer recursos ao Brasil. O dólar chegou a valores astronômicos, ultrapassando, em muito, a marca dos
R$ 3 e a Operação Lava Jato forçou as grandes construtoras e a Petrobras a colocarem ativos à venda. Mesmo assim, muitos optaram pela cautela, à espera de um quadro político mais claro.
Ruas
Dilma, que assumiu com o discurso de que ia defender a Petrobras dos "inimigos externos", foi obrigada a afastar da presidência da estatal sua amiga Graça Foster e viu a empresa entrar em uma crise sem precedentes. Além dos problemas da economia e da política, Dilma enfrentou apagões, greve de caminhoneiros e uma manifestação contrária a seu governo que reuniu milhares nas ruas do País no dia 15 de março - os protestos devem se repetir no próximo domingo. No Planalto, a aposta é que - aprovado o ajuste fiscal - a economia começará a reagir até o fim do ano. Assim, os três anos seguintes serão menos tumultuados..