Brasília - A disputa por protagonismo entre policiais federais e procuradores da República na Operação Lava-Jato paralisou indefinidamente parte das investigações relativa às suspeitas de envolvimento de políticos no esquema de corrupção na Petrobras. A divergência levou o Supremo Tribunal Federal a determinar, a pedido do Ministério Público Federal, a suspensão de diligências a serem cumpridas em inquéritos que abrangem, entre outros, os presidentes da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (RJ), e do Senado, Renan Calheiros (AL), ambos do PMDB, o que deve atrasar as investigações envolvendo políticos.
Os desentendimentos entre policiais e procuradores surgiram desde a abertura dos inquéritos a partir de autorização do Supremo, em março.
A iniciativa de procurar diretamente os investigados incomodou integrantes da PF, o que levou a uma troca de telefonemas entre o diretor-geral do órgão, Leandro Daiello, e o procurador-geral Rodrigo Janot. O primeiro contato partiu do procurador, que teria relatado ao chefe da PF que políticos investigados pediram à sua equipe para serem ouvidos na procuradoria da República e não na sede da PF. Ou seja, sem a presença de policiais.
Em resposta, Janot ouviu que a polícia estava cumprindo uma decisão do STF e que qualquer alteração deveria ocorrer mediante consulta do procurador à Corte. Ocorre que ao averiguar por que razão os investigados não queriam mais depor para os delegados, a PF descobriu que era a PGR quem estava orientando os alvos, o que aprofundou a crise. Coube ao ministro José Eduardo Cardozo, titular da Justiça, a quem a PF é subordinada, tentar buscar o consenso. Na quinta-feira, 16, à noite, Cardozo conversou com Janot e Daiello separadamente. Após esse telefonema, a PF desistiu de divulgar nota a respeito da crise.
Num outro ponto de desentendimento, a polícia teria pedido ao STF novas diligências a partir dos documentos analisados sem consultar previamente a procuradoria. Para os policiais, o estresse quanto a isso foi causado porque a procuradoria quer limitar as investigações e não teria como justificar a negativa de um pedido para avançar no inquérito. Já para os procuradores, a PF tomou a dianteira de forma indevida uma vez que o próprio ministro Teori Zavascki, relator da Lava-Jato no STF, definiu na abertura dos inquéritos que o autor "incontestável" das investigações é o MPF.
Diante do impasse, a PGR encaminhou na terça-feira ao STF pedido para suspender depoimentos programados entre 15 e 17 de abril, o que só foi atendido por Zavascki na noite de anteontem.
O ministro do STF Marco Aurélio Mello criticou ontem a divergência entre os órgãos ao afirmar que "a verdade" a ser desvendada nas investigações fica prejudicada. "O inquérito busca a verdade e é preciso que as instituições funcionem nas áreas reservadas pela lei. A Polícia Federal, o Ministério Público e, capitaneando, o STF. Não é uma coisa boa o desentendimento entre autoridades", disse. Outro integrante da Corte, ouvido reservadamente, afirmou que o desentendimento atrasa as investigações, mas destacou que a divergência entre os dois órgãos é histórica.
A Associação Nacional dos Procuradores da República divulgou nota sobre a crise: "Os procuradores reiteram sua inteira confiança na Polícia Federal - notadamente em seu dever prioritário de cumprir mandados judiciais -, sem que entretanto isso signifique reconhecer pretensões a tarefas perante o Judiciário que não lhe competem, como já reconhecido, no caso, pelo próprio STF".
A Associação dos Delegados da PF também se manifestou em nota: "A ADPF repudia a tentativa do Ministério Público Federal de interferir nas apurações da Polícia Federal na operação Lava-Jato, com o pedido de Janot ao Supremo Tribunal Federal para a suspensão de depoimentos de sete inquéritos que seriam tomados nesta semana".