Cerca de 150 mil brasileiros condenados pela Justiça a viver atrás das grades – mas que trabalham internamente nos presídios ou em empresas conveniadas pelo Estado – podem ter um reajuste no salário de 33,3%. Tudo porque a Procuradoria-Geral da República quer garantir a esses trabalhadores o direito de receber o equivalente a pelo menos um salário mínimo mensal. Para isso, o procurador-geral, Rodrigo Janot, entrou com ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para derrubar o artigo 29 da Lei de Execução Penal (LEP). Sancionada há 31 anos, a legislação estabelece que presidiários têm o direito de receber três quartos do salário mínimo vigente, atualmente R$ 591.
De acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) do ano passado, a população carcerária brasileira é de 711.463 presos, o que coloca o Brasil como a terceira maior do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da China. Deste total, cerca de 150 mil (dados de junho de 2012) exercem alguma espécie de atividade remunerada. “Por tudo o que se disse e se continuará dizendo sobre a importância do trabalho como respeito à dignidade do preso e ao êxito da recuperação do infrator, não vemos motivos plausíveis para que o condenado seja remunerado com um estipêndio menor ao colocado como mínimo em todo o território nacional”, afirmou Janot na ação.
O ponto central da tese do procurador-geral é que o artigo 7º da Constituição Federal assegura a todos um contracheque não inferior ao salário mínimo. Janot se baseou ainda em obras de juristas que defendem a remuneração isonômica para os presos. “O trabalho recompensado de forma injusta e extorsiva é substancialmente inútil para os efeitos de qualquer suposto ‘tratamento’ carcerário”, escreveu o procurador. Ele ainda citou a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), que dá a todos, sem distinção, o direito a condições justas e favoráveis de trabalho. Artigo da DUDH determina ainda que “a restrição ao direito à liberdade de ir e vir não impede o exercício do direito ao trabalho não forçado, bem como o direito à pertinente remuneração”.
Ditadura
O trabalho dos presos está regulamentado na Lei 7.210, sancionada pelo presidente João Batista Figueiredo, o último representante do regime militar, em julho de 1984. Conhecida como Lei de Execução Penal (LEP), a legislação foi aprovada quatro anos antes da atual Constituição Federal, que trouxe diversos direitos trabalhistas. Nos argumentos, Janot alega que a lei fere os princípios da isonomia e da dignidade da pessoa humana – ambos retratados nos artigos 1º e 5º da Constituição. Na avaliação do procurador, com a promulgação da Constituição há quase 27 anos, a LEP já deveria ter sido atualizada. Dessa forma, optou por uma ação denominada arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF), usada sempre que é verificada omissão do poder público.
O artigo 28 a Lei 7.210/84 anuncia o trabalho do condenado como “dever social e condição de dignidade humana”, com a finalidade “educativa e produtiva”. Vale lembrar que as normas trabalhistas da LEP se aplicam apenas aos condenados ao regime fechado que trabalham dentro dos presídios ou aqueles em regime semiaberto que são empregados em empresas conveniadas. Os empregados não estão sujeitos às regras da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Já aqueles que recebem penas no regime semiaberto e arrumarem emprego em outras empresas têm o salário negociado e pago por elas.
O que diz a lei
O salário do preso deverá atender:
a) À indenização dos danos causados pelo crime, desde que determinados judicialmente e não reparados por outros meios;
b) Assistência à família;
c) Pequenas despesas pessoais;
d) Ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação prevista anteriormente;
Havendo “sobra” do salário, ela será depositada em caderneta de poupança, que será entregue ao condenado quanto colocado em liberdade.