Brasília – O depoimento do executivo da empresa Toyo Setal, Augusto Mendonça, um dos principais delatores do esquema criminoso de desvio bilionário de recursos da Petrobras, prestado nessa quinta-feira (23), na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apura irregularidades na estatal, evidenciou que o dinheiro sujo de propina mascarou doações eleitorais feitas dentro da lei. Ele informou que, após obter contratos na petroleira, pode ter pago entre R$ 100 milhões e R$ 110 milhões em suborno e doações a partidos políticos. Bastante tranquilo, articulado e disposto a responder a todos os questionamentos, Mendonça comunicou que, por orientação do ex-diretor de Serviços da estatal Renato Duque, esteve com o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto para repassar à legenda dinheiro destinado a campanhas políticas.
Segundo o depoimento de Augusto Mendonça, os recursos eram provenientes dos acertos realizados no âmbito dos contratos da Petrobras. “Duque me pediu que eu fizesse contribuições ao PT. Na primeira vez, fui procurar João Vaccari no escritório do PT, dizendo a ele que tinha interesse em fazer contribuição ao partido. Ele me indicou onde a gente deveria contribuir. Duque me pediu outras vezes. Tenho todas as contribuições detalhadas, os comprovantes entregues, no meu depoimento (da delação premiada)”, afirmou.
Mendonça ressaltou que todas as doações eram legais. Posteriormente, afirmou que o dinheiro doado fazia parte do acerto que teria feito com Renato Duque. Disse também que fez doações a vários parlamentares e a partidos políticos, incluindo o PSDB, o PPS e o PTB. O próprio relator da CPI, deputado Luiz Sérgio (PT-RJ), teve parte da campanha para a Câmara financiada pela Toyo Setal.
Durante o depoimento, Augusto Mendonça evitou falar as palavras “propina” e “suborno”. Referia-se sempre a comissões negociadas. O deputado André Moura (PSC-BA) chegou a se irritar. “O senhor pagou de R$ 50 milhões a R$ 60 milhões ao Duque. O senhor não vai chamar isso de contribuição”, disse. Em seguida, perguntou se Mendonça não havia pago propina disfarçada de consultoria aos ex-ministros Antônio Palocci e José Dirceu. “Não, senhor. Em hipótese nenhuma”, respondeu. No entanto, admitiu que se encontrou com o ex-ministro para discutir assuntos institucionais do mercado offshore: “Já estive algumas vezes com José Dirceu”.
O delator explicou que as comissões em questão se referiam a dois contratos firmados com a Petrobras por um consórcio formado pelas construtoras Setal e Mendes Junior. “Nós tínhamos dois contratos, acredito que para a Diretoria de Serviços, entre R$ 70 milhões e R$ 80 milhões (de propina), e para a Diretoria de Abastecimento, na faixa de R$ 30 milhões”, destacou.
Desagravo
Na CPI, Mendonça chegou a fazer uma defesa da Petrobras e disse que a corrupção era generalizada apenas nas Diretorias de Abastecimento e de Serviços. Segundo relatou, só sabia de três pessoas que participavam da organização criminosa no âmbito da estatal: Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento, Renato Duque e o ex-gerente Pedro Barusco. “(A Petrobras) Aparece como uma companhia de segunda categoria, repleta de gente corrupta, mas é o inverso. Tive uma participação longa e meu único contato com corrupção foi com essas três pessoas. Antes disso, nunca soube de nada, nunca houve nada. Durante esse período, foi com essas pessoas”, atestou.
O executivo explicou que as empresas começaram a se unir ainda nos anos 1990, como uma forma de se proteger. De acordo com o delator, havia uma concorrência acirrada, e isso não era bom para os negócios. Inicialmente, nove empresas fizeram parte desse seleto grupo. “Era uma ação interna dentro dessas companhias.” Mendonça destacou que, a partir de 2005 e 2006, o grupo foi ampliado e ganhou força dentro da estatal, com apoio de integrantes da petroleira.
Ao ser questionado por que aceitou pagar propina aos servidores da petroleira, Mendonça disse que chegou a ser ameaçado pelo ex-deputado José Janene, já falecido. “Ele disse que eu tinha que procurar o Duque para acertar. Eu fui ameaçado por ele”, declarou. “O poder que um diretor da Petrobras tinha de atrapalhar era enorme. De ajudar, era pequeno. Na minha opinião, eles vendiam muito mais dificuldade do que facilidade. Na minha opinião, as empresas participavam muito mais por medo do que por facilidades”, concluiu.