Brasília – Empreiteiras investigadas na Operação Lava-Jato informaram à Polícia Federal que não têm nenhuma prestação de contas dos serviços de consultoria da empresa do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu. Não há relatórios, fotos de palestras, atas de reuniões ou resumo de negócios que foram aprovados graças à intermediação da JD Assessoria e Consultoria. A suspeita dos investigadores é de que as consultorias tenham sido usadas, ao menos em parte, para mascarar pagamentos de propinas de contratos superfaturados com a Petrobras.
Um dos procuradores da força-tarefa da operação, Carlos Fernando Lima, disse ao Estado de Minas que é improvável que essas consultorias sejam reais, mesmo para abrir portas, como alegou Gérson Almada, executivo da Engevix. Ele quer tomar o depoimento do presidente da holding Camargo Corrêa, Vítor Hallack, para esclarecer o trabalho prestado à empreiteira. A PF estuda ouvir o próprio Dirceu sobre a inexistência de prestação de contas de seus serviços. As próprias empreiteiras, depois de procuradas por vários dias pela reportagem, negaram qualquer informação sobre o resultado efetivo dessas consultorias.
A assessoria de Dirceu nega irregularidades. “A relação comercial da JD com as construtoras investigadas não tem qualquer vínculo com os contratos das empreiteiras com a Petrobras”, afirmaram os auxiliares do ex-ministro ao jornal. “As construtoras investigadas também se manifestaram publicamente e em depoimento à Justiça, confirmando que a JD foi contratada e trabalhou na prestação de serviços no exterior.” Dirceu se ofereceu para prestar esclarecimentos à polícia e afirmou que sua empresa encerrou as atividades.
Em 17 de março, Almada disse à 13ª Vara Federal de Curitiba que fez pagamentos ao operador Milton Pascowitch, que trabalhava para o estaleiro ERG, vinculado à empreiteira.
Almada disse que Pascowitch, cuja empresa pagou R$ 1,4 milhão à JD Consultoria, indicou os serviços do ex-ministro à Engevix. O executivo atestou que Dirceu prestou serviço no exterior e era um “brilhante open door”, ou “abridor de portas” em “vendas em toda a América Latina, Cuba e África”, locais onde o ex-ministro “tinha um capital humano de relacionamento muito forte”.
O procurador Carlos Fernando duvida. Para ele, os serviços podem até ser necessários à Engevix e outras clientes da JD, como a UTC e a Camargo Corrêa — cujos executivos confessaram pagamentos de propina no esquema da Petrobras. “Você pediria para uma mesma pessoa fazer a mesma atividade no mesmo período sabendo que ela está atuando para todos os concorrentes?”, afirmou Fernando. “É incompatível a ideia de que ele prestou lobby para cinco empreiteiras ao mesmo tempo. Isso foge de qualquer razoabilidade comercial.” Lima disse que a atuação era sempre “nos mesmos países”, como Peru, Cuba e Venezuela.
HABILIDADE
Dirceu cumpre prisão domiciliar em Brasília após ser condenado no mensalão. Sua assessoria disse que o ex-ministro “possui inegável e reconhecida capacidade de análise de conjuntura política e econômica do Brasil e, sobretudo, da América Latina, Europa e Estados Unidos”. “Tal capacidade é reconhecida internacionalmente e foi de fundamental importância para a JD construir sua reputação e sua clientela.” A JD atendeu cerca 60 clientes e quase 20 setores diferentes da economia, segundo a assessoria.
A JD recebeu R$ 29 milhões entre 2006 e 2013. Desse valor, R$ 10 milhões (35%) foram para empresas envolvidas na Lava-Jato e citadas em parecer do Ministério Público no inquérito sobre a empresa de Dirceu. Procurada, a Camargo Corrêa silenciou. A OAS disse que todos os seus contratos seguem a lei e que “exerce suas atividades com integridade e pautada pela conduta ética”.