Curitiba – Quase quatro anos depois de afirmar que não havia superfaturamento, sobrepreço ou qualquer outra irregularidade nas obras da Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), a Petrobras decidiu abrir processo de apuração interna para verificar prejuízos na unidade em Araucária (PR), Região Metropolitana de Curitiba. A apuração foi pedida pela Polícia Federal em inquérito de 2011, anterior à Operação Lava-Jato, mas que foi anexado à investigação por causa das relações com as mesmas empreiteiras envolvidas no caso. O Tribunal de Contas da União identificou R$ 1,4 bilhão de superfaturamento em obras de modernização tocadas por empreiteiras sob suspeita — valor confirmado pela Polícia Federal.
As obras de modernização da refinaria reuniram cinco consórcios e contratos de R$ 7,5 bilhões. Segundo o delator da Lava-Jato Augusto Mendonça, executivo da Setal, o pool Interpar, formado por Setal, Mendes Júnior e MPE Montagens, só ganhou a licitação com o apoio do cartel de empresas que loteava obras na petroleira. O gestor disse ao delegado Felipe Hayashi, em 29 de outubro de 2014, que negociou “comissões” para os então diretores da Petrobras Renato Duque (Engenharia) e Paulo Roberto Costa (Abastecimento). Para o primeiro, foram R$ 20 milhões em depósitos no exterior feitos pelo operador Júlio Camargo. O segundo ficou com o mesmo valor, após “duras negociações” com o ex-líder do PP na Câmara José Janene (PR).
Integrante de um dos consórcios responsáveis pela Repar, a MPE Montagens fechou contrato de R$ 1 milhão com empresa controlada pelo doleiro Alberto Youssef, operador do PP. Assim como no caso da Setal, outros exemplos ligam o sobrepreço apontado pelo TCU a confissões de delatores e transferências de dinheiro de empreiteiras para firmas usadas para lavar dinheiro.
O juiz responsável pela Lava-Jato, Sérgio Moro, destaca que o inquérito sobre a obra avalia superfaturamento tocado por empreiteiras “como a Odebrecht, a OAS, a UTC e a Mendes Júnior.” As duas primeiras empresas negaram irregularidades. UTC e Mendes Júnior silenciaram sobre o caso. Delegados e procuradores aguardam o resultado da apuração interna da Petrobras para subsidiar as investigações. A expectativa é de que o resultado aponte o mesmo detalhamento dos desvios revelados pela auditoria feita no Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj).
MODERNIZAÇÃO Para os auditores do TCU, o sobrepreço foi de R$ 223 milhões na modernização de unidades de coque e gasolina, feita pelo Consórcio Conpar (Odebrecht, OAS e UTC). As obras foram concluídas em 2014. Segundo documentos apreendidos pela PF na Lava-Jato, a OAS repassou R$ 617 mil para a MO Consultoria, empresa controlada por Youssef — a construtora nega as alegações. “A OAS exerce suas atividades com integridade, pautada pela conduta ética e pelo respeito à legislação em vigor”, afirma a empresa.
No caso da unidade de coque, a Camargo Côrrea, integrante do consórcio responsável pela modernização, subcontratou a fornecedora de tubos Sanko Sider. A empresa fez repasses de R$ 3,2 milhões para Youssef, segundo a PF. A Sanko alega não ser fornecedora direta da Petrobras. O TCU ainda identificou sobrepreço de R$ 70 milhões em áreas de tratamento de água, executadas pela VWSB-Enfil, não localizada pela reportagem.
Propina negada
Citados nas delações premiadas do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e do doleiro Alberto Youssef como beneficiários do esquema de corrupção na estatal, o ex-ministro das Comunicações Paulo Bernardo e a senadora Gleisi Hoffmann negaram que tenha havido irregularidades na arrecadação de campanha de Gleisi ao Senado, em 2010. Em depoimentos feitos em 2 e 14 deste mês à Polícia Federal, Bernardo e Gleisi disseram que não foi solicitado ao empresário Ernesto Kugler, amigo do casal, que intermediasse o repasse de dinheiro para financiar a campanha de Gleisi. Em delação, o doleiro Alberto Youssef disse ter repassado recursos de propina em contratos da Petrobras a Paulo Bernardo, por intermédio de Kugler. No depoimento, Paulo Bernardo declarou que, quando ocupava o cargo de secretário da Fazenda no Mato Grosso do Sul, em 1990, conheceu Paulo Roberto Costa, pivô das delações da Lava-Jato.