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Estado de Minas

Reforma política aprovada no Congresso é confusa e fica pela metade

Mudanças nas regras eleitorais definidas até agora não têm parâmetros internacionais. Para especialistas, as alterações podem piorar o já ruim modelo de representação no Congresso


postado em 07/06/2015 06:00 / atualizado em 07/06/2015 08:20

Deputados durante discussão da reforma política, que prossegue nesta semana na Câmara (foto: J.Batista/Câmara dos Deputados - 28/5/15)
Deputados durante discussão da reforma política, que prossegue nesta semana na Câmara (foto: J.Batista/Câmara dos Deputados - 28/5/15)

Brasília – A reforma política brasileira, com três significativas modificações aprovadas até o momento, que ainda será concluída na Câmara dos Deputados e posteriormente encaminhada ao Senado Federal, é um bicho estranho, uma espécie de mistão pouco lógico dos sistemas em vigor pelo mundo. A combinação de eleição proporcional sem lista pré-ordenada, cláusula de barreira inócua, fim da reeleição e financiamento empresarial para as legendas, na opinião de cientistas políticos ouvidos pelo Estado de Minas, significa uma reforma confusa, pela metade e sem parâmetros internacionais.

Em relação ao sistema político, segundo informações da comissão instalada na Câmara para debater o tema, 57% dos países do mundo adotam o proporcional com lista, 26% majoritário distrital e 15% o distrital misto. Outros 2%, a exemplo de Jordânia e Afeganistão, utilizam o formato conhecido como distritão, modelo em que o mais votado ganha a vaga. A grande maioria dos países que adota o mecanismo de proporcionalidade coloca uma cláusula de barreira para valer efetivamente. Não é o caso do Brasil. O texto aprovado, de autoria do deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), prevê que a sigla precisa eleger apenas um deputado federal para acessar o fundo partidário e ter direito à propaganda gratuita no rádio e na televisão.

“Normalmente, os países usam uma cláusula de desempenho entre 3% e 5% de todos os votos, a exemplo da Alemanha, Japão e Itália. O partido que não alcança, não acessa o fundo partidário. A Turquia, por exemplo, exige 10%, o que é um absurdo”, explica o deputado Marcelo Castro (PMDB-PI), responsável pelo relatório da comissão especial para debater a reforma política no Brasil. Após uma manobra do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que queria aprovar o “distritão”, o documento não chegou nem a ser votado. A cláusula de barreira suave fez parte da barganha política para tentar fazer com que partidos pequenos apoiassem o modelo defendido por Cunha, que acabou sendo derrotado.

“Se continuarmos com coligações e sem cláusula de barreira de verdade, os partidos vão ser sempre fragmentados. Qual o país do mundo que tem 28 partidos? Qual o primeiro-ministro ou presidente de uma nação cujo seu partido só tem 13% dos votos do parlamento? É possível imaginar o presidente dos Estados Unidos e o partido democrata com apenas 13% de representação? É por isso que temos uma baixa governabilidade”, opinou Castro. “Essa cláusula de barreira é ridícula. Melhor seria que não tivesse sido colocada. O meu relatório previa cláusula de desempenho progressiva. O objetivo era adequar ao longo do tempo para termos um sistema racional mais na frente”, salientou.

Outro ponto controverso é o que diz respeito ao financiamento das campanhas políticas. Os parlamentares brasileiros aprovaram o modelo misto, que predomina no mundo, no entanto, com uma pequena modificação em relação ao formato atual. As empresas, agora, só podem repassar recursos para os partidos e não mais diretamente aos candidatos. Nas últimas eleições, legendas e políticos conseguiram arrecadar cerca de R$ 5 bilhões em doações privadas, quase na sua totalidade feitas por empresas. As doações de pessoas físicas são irrisórias. Por meio do fundo partidário, os partidos receberam em 2014, R$ 308 milhões de recursos públicos.

O cientista político e professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) Carlos Melo critica a modificação aprovada pela Câmara dos Deputados. “O modelo anterior era ruim, mas não deixa de ser melhor do que esse que foi acolhido. Antes, pelo menos, poderíamos saber quem doou para quem. Agora, não vamos saber o que o partido fez com aquele dinheiro repassado pela empresa. Tem um filtro que esconde esta informação. Você tinha ao menos uma alternativa. Acabou”, avisou.

A Idea, uma organização intergovernamental que funciona como observadora da Organização das Nações Unidas, fez uma pesquisa que apontou a proibição de doações de grupos empresariais diretamente para candidatos em 39 países. Entre outros, são listados, por exemplo, México, França, Polônia, Canadá, Paraguai, Ucrânia, Costa Rica, Peru, Portugal, Colômbia e Egito. Assim como o Brasil, há ainda 126 países que permitem o financiamento empresarial diretamente para os candidatos, a exemplo da Argentina, Chile, Reino Unido, Itália, Alemanha, Noruega e grande parte das nações africanas e asiáticas. O financiamento público exclusivo,  defendido pelo PT, existe em pouquíssimos países. Um deles é o Butão, no sul da Ásia.

Restrições e transparência

 Nos Estados Unidos, de acordo levantamento feito por consultores do Senado, até o final de 2003, vigorava regra estrita para as contribuições diretas de indivíduos a candidatos (não podiam ser superiores a US$ 1 mil por ano e ciclo eleitoral) e a partidos (não podiam ultrapassar US$ 25 mil por ano e ciclo eleitoral). O estudo mostra que existia uma brecha legal que permitia doações acima desses limites por empresas, sindicatos e indivíduos. Propagandas nos meios de comunicação em torno de temas específicos de interesse dos financiadores também podiam ser custeadas por empresas e sindicatos. Hoje, há restrições mais severas que estabelecem limites para as doações de pessoas físicas e jurídicas.

Na Alemanha, um dos sistemas políticos mais sólidos do mundo, os gastos eleitorais são reembolsados pelo governo. Há também contribuição privada, com mecanismos de transparência absoluta e limites para proteger partidos e candidatos da influência do poder econômico de grandes financiados.
“No Brasil, o financiamento empresarial como é feito hoje é nocivo. Como dizem, as empresas não fazem financiamento. Fazem investimento. O dinheiro doado é cobrado lá na frente. A gente precisa que a cobrança seja de princípios”, avaliou o cientista político Carlos Melo.

Pontos aprovados

Financiamento misto

Os parlamentares aprovaram em primeiro turno emenda do deputado Celso Russomano (PRB-SP) que prevê doações a partidos feitas por empresas e pessoas físicas. Pelo texto, os candidatos podem receber recursos apenas de pessoas físicas. O teto ainda será definido em lei. A medida começa a vigorar nas próximas eleições.

Como é hoje
Empresas podem doar para partidos e diretamente para candidatos. A determinação não está na Constituição.

Fim da reeleição
A medida prevê o fim da reeleição para presidente, governadores e prefeitos. O texto foi aprovado com folga. Foram 452 votos a favor, 19 contra e 1 abstenção. A determinação não se aplica aos governadores eleitos em 2014 e aos prefeitos que venceram as eleições em 2012, nem a quem os suceder ou substituir nos seis meses anteriores ao pleito subsequente.

Como é hoje

Presidente da República, governadores e prefeitos podem se candidatar à reeleição.

Cláusula de barreira
Foi aprovada por 369 votos favoráveis e 39 contrários, além de cinco abstenções. Estabelece que os partidos precisarão concorrer com candidatos próprios e eleger pelo menos um representante para a Câmara ou para o Senado para continuar recebendo recursos do Fundo Partidário e ter acesso ao tempo gratuito de TV. Vale a partir de 2018. Partidos hoje sem representantes no Congresso, como PSTU, PPL, PCB e PCO ficariam de fora.

Como é hoje
Não existe cláusula de barreira


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