O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unanimidade, nesta quarta-feira, que as biografias não precisarão ser submetidas aos biografados ou aos familiares, no caso da personalidade já ter morrido, antes de serem publicadas. Dessa forma não é mais necessário o consentimento para que haja a publicação de obras literárias ou audiovisuais de pessoas públicas ou relacionadas a atos de relevância. Em seu voto, a ministra Cármen Lúcia - relatora da ação -, argumentou que eventuais abusos que ocorrerem devem ser alvo de ação de reparação, mas a possibilidade de existir erros não pode ser usada como justificativa. “Não é admissível que o esquartejamento dos direitos de todos pelo interesse de uns”, afirmou.
A ação direta de inconstitucionalidade (Adin) foi impetrada em 2012 pela Associação Nacional dos Editores de Livros (Anel) contra liminares que proíbem o lançamento das biografias. A Anel questiona a constitucionalidade dos artigos 20 e 21 do Código Civil. A entidade argumenta que a norma contraria a liberdade de expressão e de informação. Um dos casos que podem ser influenciados pela decisão do Supremo é a biografia não autorizada do cantor Roberto Carlos.
Ainda durante a argumentação de seu voto, a ministra usou trechos de cantigas de roda para falar sobre a necessidade de manter o direito à liberdade de expressão. “Cala a boca já morreu, quem manda em minha boca sou eu”, disse. Expressão que ela usou outras vezes durante a leitura do seu voto em plenário.
O ministro Luís Roberto Barroso, que também seguiu o voto de Cármen Lúcia, disse que ninguém está livre de inverdades publicadas. Ele relembrou que seu voto na Ação Penal 470 – o mensalão –, foi considerado pela imprensa como atrelado ao fato de ter sido indicado pela presidente Dilma Rousseff para ocupar a cadeira.
O ministro Dias Toffoli disse que a votação do Supremo não dá liberdade absoluta para uso da imagem das pessoas e que haverá recursos à Justiça em caso de abusos. Já Gilmar Mendes considerou que a necessidade de autorização do biografado traz “sério dano para a liberdade de publicação, científica e artística”. O ministro Marco Aurélio Mello afirmou que, mesmo não autorizadas, as biografias representam "a memória do país". O decano Celso de Mello disse que "não é possível que destruamos livros". Ainda no entedimento do ministro, "todos têm direito absoluto de expressar sua opinião".
Votaram ainda Rosa Weber, Luiz Fux e o presidente da corte, Ricardo Lewandowski. Não participou da análise da matéria o ministro Teori Zavascki, que está em viagem oficial à Turquia.
Em coro, os advogados que pediam a queda do consentimento falaram que a necessidade de submeter o texto ao biografado revela um ato de censura prévia. Dessa forma, a liberdade de expressão estaria comprometida.
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinícius Furtado Coêlho, defendeu que não haja necessidade da autorização prévia do biografado e afirmou que acredita no equilíbrio da Justiça para julgar possíveis abusos. “Os fatos inverídicos, as ofensas à honra devem ser punidos.” A advogada do Instituto dos Advogados de São Paulo, Ivana Có Galdino Crivelli, também defendeu o fim da autorização prévia para biografias.
O advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, representante do Instituto Amigo, do cantor Roberto Carlos, disse que não se trata de censura. Ele afirmou que ao falar de vidas, o assunto deve ser tratado como cuidado para não comprometer reputações. “Um homem não é um objeto, é ser de direitos”, disse, enfatizando que todas as pessoas têm direito a privacidade. .