Maioridade penal pode parar no STF

Caso o Congresso Nacional aprove a proposta, governo federal pode recorrer ao Supremo alegando que mudança na constituição é ilegal

Isabella Souto

O governo federal pode recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) caso o Congresso Nacional aprove a proposta que reduz a maioridade penal para 16 anos.
A alegação é que a alteração na Constituição é ilegal porque trata-se de um dispositivo conhecido como “cláusula pétrea”, ou seja, não pode ser modificado. A afirmação foi feita ontem pelo ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, que esteve em Belo Horizonte para a assinatura de liberação de recursos e convênios com o governo estadual para o setor de segurança pública.

Embora o ministro tenha reforçado que “não fala sobre hipóteses”, afirmou que o Judiciário é uma das alternativas possíveis para evitar o que chamou de um “equívoco”. “Na situação em que estão nossos presídios, colocar os menores lá só vai permitir que a violência aumente”, disse Cardozo, completando que não há qualquer estudo no mundo mostrando que a prisão de menores tenha contribuído para reduzir a criminalidade.

De acordo com ele, o governo tende a apoiar boa parte do projeto defendido por integrantes do PSDB, que é a ampliação do prazo-limite de internação dos menores dos atuais três anos para até 10 anos. O novo prazo seria definido por meio de uma alteração no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O ministro tratou do assunto ontem com o senador José Serra (PSDB-SP), que defende internação até 10 anos. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), propõe o limite de oito anos. “Em conversa com eles, senti uma proximidade entre o projeto deles e o que nos parece mais adequado”, afirmou.
Diante da possibilidade de uma aliança entre o PT e o PSDB para barrar a aprovação da proposta no Congresso, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), começou a articular ontem uma contraofensiva.
Ele vai apoiar projeto do senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) de que a redução só ocorra em casos de crimes hediondos. Com isso, Cunha espera aplicar mais uma derrota ao governo federal e assegurar que a proposta tenha os 308 votos mínimos para sua aprovação (60% das 513 cadeiras da Câmara). Ele colocará o tema em votação no plenário no dia 30.

Segundo aliados, Cunha também vai abandonar a proposta de que qualquer decisão do Congresso só entre em vigor após ser referendada pela população, o que ocorreria em outubro de 2016. Com o recuo, eventual alteração feita pelo Congresso entrará em vigor imediatamente. Pelo texto em discussão na Câmara, os jovens de 16 e 17 anos não poderão cumprir pena nos presídios comuns, mas em novas unidades construídas pelos estados ou nos atuais centros de internação, como a Fundação Casa (ex-Febem) de São Paulo. Já o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), disse que o Congresso não vai “sonegar nenhuma discussão”, mas que o assunto não pode ser discutido com “afogadilho”.

Tumulto Em meio a protestos de estudantes e de deputados contrários à proposta, a comissão especial da Câmara dos Deputados suspendeu ontem a votação do relatório do projeto de emenda à Constituição que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos. Estudantes da União Nacional dos Estudantes (UNE) e da União dos Estudantes Secundaristas (Ubes) protestavam contra o projeto com palavras de ordem e, após ordem de esvaziar o plenário, houve confusão, envolvendo também os parlamentares, entre eles, o deputado mineiro Edson Moreira (PTN). A Polícia Legislativa usou gás de pimenta. O adiamento se deu por um pedido de vista coletivo de deputados petistas que integram o colegiado. Com isso, a PEC voltará a ser analisada na quarta-feira.

Diante das manifestações em plenário, deputados favoráveis ao texto pediram que os jovens fossem retirados, porque estariam “pressionando” os parlamentares. Os estudantes, então, vaiaram a sugestão, o que fez com que o presidente da comissão, André Moura (PSC-CE), pedisse a saída deles do plenário. Irritados, os jovens decidiram invadir o plenário da comissão especial, furaram o bloqueio da segurança e ocuparam os espaços onde ficam os deputados. Alguns chegaram a subir nas mesas e gritaram: “A Casa é do povo, a Casa é do povo!” e “Para estudante, não! Polícia é para ladrão”.
(Com agências).