Disputa entre PT e PMDB torna governo Dilma refém de Cunha

Com o agravamento da tensão entre PT e PMDB, Palácio do Planalto volta a ficar dependente do presidente da Câmara dos Deputados para a votação de temas importantes no Congresso

André Shalders Júlia Chaib
Cunha reclama do tratamento: " PT sempre insiste em buscar as agressões" - Foto: Gustavo Lima/Câmara dos Deputados
Brasília – O governo está mais uma vez dependente do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Depois de um leve distensionamento com a indicação do vice-presidente Michel Temer como coordenador político, a tensão voltou a aumentar entre o PT, o Planalto e o peemedebista fluminense a ponto de o Executivo admitir a possibilidade de perder o semestre no Legislativo, caso não consiga votar, pelo menos na Câmara, o projeto que desonera a folha de pagamentos.

Embora tenha evitado discutir abertamente o assunto na reunião da coordenação política – a estratégia é manter o canal de negociações aberto para tentar votar o projeto na Câmara antes do recesso parlamentar de julho –, a sensação de que a relação travou é inevitável. “Foram muitos erros nos últimos dias que complicaram um cenário que jamais esteve pacificado. Temos muito a caminhar ainda para normalizar essa relação”, admitiu uma liderança governista.

Nas últimas duas semanas, o PT insinuou que a articulação política do governo deveria voltar para as mãos do partido, deixando de ser exercida por Michel Temer. O PMDB, como vingança, montou uma operação na CPI da Petrobras para aprovar a convocação do presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto. Lula ligou para Temer para perguntar porque o PMDB fizera aquilo e para indagar se a legenda tinha algo contra ele.

Ao longo do fim de semana, mais problemas. Os deputados do partido pressionaram para que o congresso do PT suspendesse a aliança com o PMDB e o ex-vice-líder do governo na Câmara Carlos Zarattini (PT-SP) chamou Cunha de oportunista. Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, o presidente da Câmara elevou o tom e esgarçou de vez as relações com o PT.

Após a reunião de coordenação, o ministro da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva, tentou colocar panos quentes na crise.
“Não tem mal-estar com o presidente Eduardo Cunha. O governo respeita a liderança dele. O presidente da Câmara dos Deputados tem o respeito do governo. Numa democracia, é natural que muitas vezes posições divergentes possam existir. Isso faz parte da democracia e é bom que haja diálogo”, disse.

O problema é que, neste momento, há um descompasso. Segundo admitiu um interlocutor governista, a presidente Dilma Rousseff e a equipe econômica terão de ceder nas negociações sobre a desoneração da folha de pagamentos. Cunha tem feito lobby pessoal e pressionado o relator do projeto, deputado Leonardo Picciani (PMDB-RJ), para conseguir manter alguns setores, como comunicações e transportes, fora da lista daqueles que terão as alíquotas reajustadas.

Na noite dessa segunda-feira (15), Temer se reuniu com Eduardo Cunha e o ministro da Fazenda, Joaquim Levy. O ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, que também participou da reunião, saiu confiante e disse que haverá acordo para votar o projeto da desoneração da folha de pagamentos e que ele será divulgado amanhã. “Está muito próximo do acordo (...) Só depois da gente conversar com os líderes que a gente vai anunciar. Mas houve excelente entendimento”, disse o ministro.

Nessa segunda-feira, Cunha voltou a reclamar do tratamento recebido dos petistas, mas garantiu que a pauta de votações da Câmara continuará inalterada, independentemente das rusgas, e que o problema dele é com o partido, não com o governo. “O presente, com as agressões continuadas, é sempre um problema. O PT sempre insiste em buscar as agressões. E não foi só um ‘movimento’ que foi ali (no 5º Congresso, em Salvador) fazer coro.
Ali teve pessoas que defenderam a manutenção da aliança atacando”, disse. Ele também lembrou de uma rusga antiga com o presidente do PT, Rui Falcão, no começo de 2014. “É um ataque continuado”, avaliou. “Eu não vou aceitar que o PMDB continue sendo agredido pelo PT o tempo todo”, reforçou..