Investigadores da Lava Jato não encontraram lastro financeiro para a aquisição e investigam suposta relação entre as compras e os recebimentos da JD por consultorias prestadas para empresas do cartel, acusado de corrupção e desvios na Petrobras entre 2004 e 2014.
"José Dirceu de Oliveira e Silva e Luiz Eduardo de Oliveira e Silva teriam adquirido imóveis sem lastro financeiro para a operação, havendo indícios da formalização de contratos de consultoria fictícios com a empresa JD Assessoria e Consultoria Ltda de propriedade dos mesmos", informa portaria de abertura do inquérito, assinada pelo delegado da Polícia Federal Márcio Adriano Anselmo.
A JD recebeu entre 2006 e 2013 um total de R$ 29 milhões de empreiteiras acusadas na Lava Jato por pagarem propinas de 1% a 3% dos contratos com a Petrobras para políticos e partidos, por meio de diretores da estatal indicados pelo PT, PMDB e PP. Entre elas a Engevix, UTC e Camargo Corrêa.
O inquérito 0212/2015, da Polícia Federal de Curitiba, foi instaurado em 30 de janeiro, a pedido dos procuradores da República Diogo Castor de Mattos e Deltan Dallagnol, membros da força-tarefa da Lava Jato.
"Trata-se de inquérito instaurado com a finalidade de apurar a possível prática dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro por José Dirceu de Oliveira e Silva e Luiz Eduardo de Oliveira e Silva por intermédio da empresa JD Assessoria e Consultoria Ltda", registra o juiz federal Sérgio Moro, que conduz os processos da Lava Jato, em despacho do dia 8 de maio.
Negócios imobiliários
São dois negócios imobiliários ocorridos em 2012, ano que começou o julgamento do mensalão. A partir de informações da Receita Federal, a Lava Jato identificou que Dirceu "declarou a aquisição de um imóvel na Rua República do Líbano, 1827, Indianópolis, São Paulo, no ano de 2012 no valor de R$ 1,6 milhão".
No local, funcionou a sede da JD, empresa de consultoria aberta por Dirceu, após ele deixar o governo em 2006 - envolvido no escândalo do mensalão -, até o ano passado, quando ela foi desativada.
"O pagamento teria ocorrido por meio de uma entrada de R$ 400 mil em maio de 2012, paga com recursos próprios, e o restante financiado pelo Banco do Brasil. Contudo, a partir de informações da Dimof, constatou-se que o valor de R$ 400 mil não circulou na conta corrente do investigado naquele ano", informa notícia crime do MPF.
Documento da Receita Federal que serviu como base para a abertura das apurações registra que Dirceu declarou que em 2012 pagou pelo imóvel os R$ 400 mil e outros R$ 210,2 mil das primeiras das 161 parcelas do financiamento feito com o Banco do Brasil - que lhe emprestou R$ 1,2 milhão. "Portanto o montante pago em 2012 foi de R$ 610.265,36".
Para a Receita, há "possível movimentação financeira incompatível (especialmente em maio)".
No mesmo ano, o irmão de Dirceu e sócio na empresa de consultoria JD "Luiz Eduardo de Oliveira e Silva declarou ter adquirido um imóvel na Rua Estado de Israel, nº 379, Saúde, São Paulo, no valor de R$ 700 mil, em 23 de na janeiro de 2012". O apartamento era usado como residência do ex-ministro em São Paulo, quando ele estava na cidade, até sua condenação em 2013.
"(Luiz Eduardo) afirmou que utilizou para pagamento do imóvel R$ 230 mil provenientes de um empréstimo feito por José Dirceu.
Dirceu informou, via nota, que o empréstimo que "consta no relatório dos sigilos fiscal e bancário, foi um erro de lançamento na declaração do imposto de renda de ambos, o que já foi retificado e aceito pela Receita Federal".
A Receita Federal registra que "no ano-calendário de 2012, a movimentação financeira do contribuinte" foi de "R$ 229.121,93" em nome de Dirceu.
"Considerando que a JD recebeu recursos das empreiteiras a título de "consultoria", tipologia usada para desvio de recursos públicos na operação Lava Jato, bem como o envolvimento pretérito do investigado em esquemas de corrupção e lavagem de dinheiro (caso Mensalão), os fatos merecem ser melhor apurados", escreveram os dois procuradores da Lava Jato, no pedido de novo inquérito.
Dirceu, o irmão e a JD eram alvo de uma apuração que gerou a quebra dos sigilos fiscal e bancários, no final de 2014 - por conta do recebimento de valores das empresas do cartel da Petrobras.
Foi nesse inquérito que a PF pediu o rastreamento das viagens de Dirceu ao exterior e também informações sobre o atual presidente do Conselho de Administração da Camargo Corrêa Vitor Hallack.
Defesa
O ex-ministro José Dirceu refuta, com veemência, qualquer ilação de prática de crimes de lavagem de dinheiro ou ocultação patrimonial, como questiona o jornal O Estado de S. Paulo.
"As suspeitas não têm qualquer fundamento, já apresentamos à Justiça do Paraná todos os esclarecimentos pedidos e é preciso ficar claro que não existe nenhuma acusação formal contra o ex-ministro", afirma o advogado Roberto Podval. "Já demonstramos a partir de vasta documentação que José Dirceu atendeu a cerca de 60 clientes e que todos os serviços foram plenamente prestados, os impostos recolhidos e os rendimentos declarados."
Segundo a defesa, o imóvel da Avenida República do Líbano foi adquirido, em 2012, "conforme consta nas declarações de renda do ex-ministro apresentadas à Receita e em posse da Justiça Federal do Paraná. Os antigos proprietários, intimados pela Justiça a falar sobre a venda do imóvel, confirmaram a legalidade da negociação e o recebimento integral no montante de R$ 1,6 milhão, conforme estabelecia o contrato entre as partes e seus representantes."
A nota afirma que valor foi definido entre as partes, ainda em setembro de 2008, quando o imóvel foi alugado pela JD Assessoria e Consultoria. "O contrato de locação previa cláusula de opção de compra, que foi exercida pela JD no início de 2010. A venda, no entanto, só se concluiu no início de 2012 porque o imóvel, como registra a escritura no 14º Registro de Imóveis de São Paulo e consta no inquérito da Polícia Federal, fazia parte do espólio deixado pela mãe dos antigos proprietários. A documentação do inventário exigida para o financiamento bancário só foi concluída no final de 2011, permitindo a conclusão do negócio nas bases pré-estabelecidas."
"A operação foi perfeitamente legal", afirma Podval. "A forma como se deu o pagamento - diretamente para conta de terceiro - estava explicitamente prevista no contrato entre a JD e a JAMP.".