Congresso dissolve ajuste fiscal do governo Dilma Rousseff

Projetos aprovados por deputados e senadores já elevaram em quase R$ 85 bilhões o prejuízo nos cofres da União. Valor é quase R$ 20 bilhões acima da meta de superávit para este ano

Paulo de Tarso Lyra
Joaquim Levy e Michel Temer (ao fundo) em mais uma reunião com senadores da base para discutir projetos com impacto nas contas do governo - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Brasília – Fragilizada politicamente e administrando uma economia em frangalhos, unindo inflação, juros e desemprego e alta e contração acelerada do Produto Interno Bruto (PIB), a presidente Dilma Rousseff vê o Congresso Nacional destruindo o tênue ajuste fiscal desenhado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Projetos aprovados recentemente por deputados e senadores já aumentaram em quase R$ 85 bilhões o prejuízo nos cofres da União. Na ponta do lápis, isso seria quase R$ 20 bilhões a mais do que a meta original de superávit primário estipulada pelo governo — R$ 66 bilhões. Seria, porque, diante do atual quadro negativo, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) já propôs a Levy diminuir essa projeção para R$ 22,1 bilhões.

“A impressão é de que aqui, no Congresso Nacional, as eleições não acabaram”, reclamou o líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS). Há duas semanas, o plenário do Senado impôs uma derrota acachapante ao Planalto ao aprovar o reajuste de 59,9% aos servidores do Judiciário, o que provoca um rombo de R$ 25,7 bilhões aos cofres públicos ao longo dos próximos quatro anos. O resultado de 62 a 0 foi influenciado, em grande parte, pelo buzinaço feito por um grupo de servidores fora do Congresso e pela pressão feita por outro no ouvido dos senadores. “Com uma barulheira dessas e um governo com 9% de aprovação de popular, fica difícil convencer os aliados a votarem contra os servidores”, reclamou um articulador palaciano.

O medo do Planalto é de que a movimentação dos servidores do judiciário seja a senha para que outras categorias organizadas pressionem os congressistas em busca de aumento e estourem de vez as finanças do país. Na semana que passou, em mais um sinal de descompasso entre o Executivo e o Legislativo, os senadores impuseram nova derrota dura ao Planalto.
Tudo caminhava para a apresentação de um destaque à medida provisória que reajustava o salário mínimo, suprimindo o repasse do mesmo percentual de aumento a todos os aposentados. Esse mecanismo causou um impacto de R$ 9,2 bilhões ao Tesouro.

Caso o destaque fosse aprovado pelos senadores, a matéria voltaria para a Câmara e caberia aos deputados decidir o que fazer. Mas a medida provisória foi aprovada sem qualquer alteração e, agora, caberá à presidente Dilma Rousseff o desgaste de mais um veto. “Eu acho que eles vão arguir a inconstitucionalidade do reajuste alegando não ser possível indexar aumentos ao salário mínimo”, apostou o deputado Ricardo Trípoli (PSDB-SP). “Mas isso é problema do governo, não meu”, completou o tucano. “Também não é justo fazer um ajuste que só puna os trabalhadores e aposentados sem atacar aqueles que estão no topo da pirâmide”, completou.

Se quando vota as matérias o Congresso atrapalha o sossego do Planalto, quando adia as votações a tempestade fica completa. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), decidiu estender as discussões em torno da desoneração da folha de pagamento e definiu que a matéria só será pautada no plenário em meados de agosto. No início do ano, Levy calculou que a desoneração causou um rombo de R$ 25 bilhões. Com a proposta enviada ao Congresso reajustando as alíquotas, esse rombo diminui para R$ 12 bilhões — uma recuperação, portanto, de R$ 13 bilhões.

Mas o projeto foi alterado na Câmara e o ganho passou para R$ 10 bilhões apenas. Na prática, significa que o benefício tributário dado a alguns setores da economia continua representando uma perda de R$ 15 bilhões para o fisco federal. Por ser uma matéria tributária, ela precisa cumprir uma noventena antes de entrar em vigor. Pelo calendário original, os novos recursos começariam a entrar nos cofres do governo em meados de outubro. Agora, a nova receita só virá em 2016.
“Se estava ruim para o governo, agora piorou, porque não entrará nada no caixa este ano”, divertiu-se um integrante do PMDB.

O ministro da Secretaria de Aviação Civil (SAC), Eliseu Padilha, reconhece que a baixa popularidade do governo faz com que os parlamentares se sintam mais pressionados e dispostos a ceder às pressões das ruas. “Enquanto o salário estiver terminando antes do mês e o carrinho de supermercado estiver menor do que as compras da semana, estaremos sujeitos a isso”. Mas ele lembrou que o cobertor não é infinito e que é fundamental que todos tenham consciência disso..