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Estado de Minas

Igrejas querem direito de ajuizar ações no Supremo

Proposta em tramitação no Legislativo permite que entidades de cunho religioso ajuízem ações no STF. Com essa prerrogativa, elas teriam direito de contestar leis com as quais não concordam


postado em 26/07/2015 00:12 / atualizado em 26/07/2015 07:43

Dos cultos e missas para os tribunais. As entidades religiosas querem ter o direito de ajuizar ações no Supremo Tribunal Federal (STF). Alegam que é para barrar qualquer tipo de “interferência” do poder público nos seus diversos segmentos. Com o respaldo do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que é evangélico, tramita na Casa uma proposta de emenda à constituição (PEC) que inclui as associações religiosas de âmbito nacional no rol daqueles que podem ajuizar ações diretas de inconstitucionalidade (adin) no Supremo.


A PEC foi apresentada há quatro anos e arquivada no final da legislatura passada, mas foi desarquivada pelo autor, João Campos (PSDB-GO), em fevereiro, e neste mês começou a andar na Câmara. Na justificativa do texto, o goiano alega que “cada segmento religioso se rege por valores e normas próprios” e tem a “autonomia de se auto-organizar, sem a intromissão do poder público ou qualquer outra inferência”. O parlamentar diz ainda que a PEC busca apenas corrigir uma “omissão” na Constituição.

“Temos diversos princípios na Constituição Federal ligados à fé e à religião. Achei que estava faltando uma cobertura em relação aos segmentos religiosos”, alegou João Campos em entrevista ao Estado de Minas. Pela Constituição, podem ajuizar adins no STF apenas o presidente da República, governadores, mesas da Câmara, do Senado e das assembleias legislativas, Procuradoria-Geral da República, Conselho Federal da Ordem dos Advogados do BrasiL (OAB), partidos políticos e entidades de classe de âmbito nacional.

Presidente da Frente Parlamentar Evangélica, composta por 85 deputados e cinco senadores, João Campos se diz confiante na aceitação da PEC – que precisa de 308 votos para ser aprovada. “Não é uma questão de dogma religioso, mas um mecanismo de proteção da Constituição brasileira. Estamos fazendo um debate de natureza técnica”, argumenta.

O deputado jura que a ideia da PEC não tem relação com qualquer projeto em tramitação ou lei aprovada que desagradou aos evangélicos. Mas o fato é que existe uma série de propostas no Congresso que ferem diretamente dogmas religiosos, envolvendo por exemplo o aborto, drogas, direitos dos homossexuais. Um deles, do deputado Jean Wyllys (PSPL-RJ) e da deputada Erika Kokay (PT-DF), obriga o Sistema Único de Saúde (SUS) e os planos de saúde a custear tratamentos hormonais integrais e cirurgias de mudança de sexo a todos os interessados maiores de 18 anos, aos quais não será exigido nenhum tipo de diagnóstico, tratamento ou autorização judicial. É o chamado direito à “identidade de gênero”. Há ainda um texto que regulamenta a profissão de prostituta e outro que legaliza a união civil entre pessoas do mesmo sexo.

IMPASSE O tema aborto é tratado em projeto apresentado também por Jean Wyllys. Ele é autor de uma proposta que garante às mulheres o direito de interromper voluntariamente a gravidez de até 12 semanas. De acordo com o texto protocolado há dois meses, o aborto seria realizado pelo SUS. Também está prevista a criação de políticas públicas para educação sexual e dos direitos reprodutivos e sexuais. O presidente da Casa, Eduardo Cunha, já declarou que mudanças na legislação sobre aborto só seriam votadas “por cima de meu cadáver”. “No aborto sou radical, não vou pautar nem que a vaca tussa”, disse o parlamentar na ocasião.

Caso encontrem brecha jurídica, os evangélicos já têm em mente qual seria a primeira ação ajuizada no STF. Favoráveis ao artigo 28 da Lei Antidrogas, que criminaliza o porte de entorpecentes para uso próprio, o grupo torce para que os ministros do Supremo não derrubem a regra ao julgar ação que a considera inconstitucional. Caso o artigo caia, eles poderão entrar com um novo processo para que a norma volte a vigorar. “Mas precisamos ver antes se o assunto tem pertinência temática para que possamos entrar no processo”, explicou João Campos.

 

CONFIANÇA

Pesquisa realizada pela Confederação Nacional de Transporte (CNT) em parceria com o Instituto MDA, divulgada na terça-feira passada, relevou que a Igreja é a instituição mais confiável no Brasil, apontada por 53,5% dos entrevistados. Neste grupo, 43% disseram “sempre” confiar na Igreja. Na sequência vêm as Forças Armadas (15,5%) e a Justiça (10,1%). O levantamento ouviu 2.002 pessoas entre 12 e 16 de julho, em 137 municípios de 25 estados. A margem de erro da pesquisa é de 2,2 pontos percentuais, para mais ou para menos, e o nível de confiança é de 95%.

 

Na pauta da Câmara

 

Aspectos religiosos são o tema de vários projetos de lei na pauta da Câmara. Um deles, apresentado por Rogério Rosso (PSD-DF), torna crime hediondo a ofensa religiosa e aumenta de quatro para oito anos o período de reclusão dos infratores. A alegação do autor da proposta é que os protestos direcionados às religiões cristãs têm se tornado cada vez mais frequentes, especialmente nas manifestações LGBT e marchas a favor dos direitos das mulheres. A proposta altera o Código Penal e ainda tem que ser analisada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).

O texto ganhou força depois do apedrejamento de uma menina no Rio, quando deixava um culto de candomblé, e o assassinato violento de um médium, que foi amarrado e amordaçado. Há a defesa para que sejam incluídas no projeto punições a quem pratica atos de intolerância religiosa, cuja sanção aumentaria de um para oito anos de prisão.

E depende dos deputados federais e senadores a instituição de um Estatuto Jurídico da Liberdade Religiosa – documento com 55 artigos apresentado pelo deputado mineiro Leonardo Quintão (PMDB). Um deles, o de número 44, considera ato “discriminatório e de intolerância contra a liberdade religiosa praticar qualquer tipo de ação violenta, seja esta real ou simbólica, que seja, assim, constrangedora, intimidatória ou vexatória baseada na religião ou crença da vítima”. A punição prevista é multa de 20 salários mínimos (R$ 15.760), podendo chegar a 60 (R$ 47.280) no caso de reincidência.
 


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