Pela casa dela já passaram centenas de juízes, desembargadores, promotores, procuradores e advogados de todo o Brasil. Todos com o mesmo objetivo: adquirir a vestimenta preta, até os calcanhares, que simboliza poder para quem a usa. Aos 81 anos de idade, a costureira Aristel Anna Bavosi acumula 69 deles dedicados à confecção das becas e togas usadas por profissionais do direito durante as sessões de julgamento. Tempo que dá a ela a experiência de saber na ponta da língua a diferença entre os vários tipos de veste talar – nome jurídico da “capa preta” – e a agilidade para confeccionar os modelos mais simples no mesmo dia e os mais complexos em três dias.
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Há quase 70 anos, costureira de BH confecciona togas usadas por juízes de todo paísCúpula de empreiteiras é transferida para presídio no ParanáLideranças religiosas debatem 'ideologia de gênero' durante encontro em BHEstudantes do ensino médio de BH apresentam propostas na CâmaraDestituição de Eduardo Cunha está na pauta do PT mineiroIgrejas querem direito de ajuizar ações no SupremoPartidos de oposição adotam postura crítica ou de distanciamento em relação a CunhaHelvécio Magalhães assume mais funções no governo de MinasO trabalho aumentou tanto que o pai de Aristel passou a ajudar o patriarca da família. Em meio às agulhas, linhas e crepe negra, Aristel tomou gosto pela costura e, aos 12 anos, confeccionou as primeiras gravatas e capelos. Desde então não parou mais, e, com a morte do avô, aos 100 anos, e do pai, aos 90, assumiu sozinha o ofício. Nos vários caderninhos anotados de próprio punho, ela mantém intactos os nomes dos clientes, telefones e medidas de todos eles. São recordações de uma tarefa que ela se enche de orgulho.
“Para mim, é uma emoção ver um juiz, um desembargador, com uma toga que eu fiz. Sinto-me muito bem, e nesses anos todos penso quanta gente importante já passou por aqui”, diz a costureira à reportagem, entre lágrimas. Mas ela logo sorri quando se refere aos mais jovens, que vestirão a roupa pela primeira vez.
HORA EXTRA Nem mesmo uma cirurgia nos olhos fez com que Aristel Bavosi alterasse a rotina de trabalho. Somente neste ano, ela já fez 23 togas, 22 para promotores e uma para um jovem juiz, aprovado recentemente em um concurso para o Tribunal de Justiça do Mato Grosso. Procurada pela mãe do rapaz – que precisava da toga com urgência para o filho tomar posse no tão sonhado cargo –, não se furtou a fazer hora extra para entregar a roupa a tempo. “A alegria dele por ter passado no concurso e por poder vestir a toga valeram a pena a correria”, afirma.
Entre as recordações que guarda da profissão, Aristel Bavosi ressalta o carinho e a simplicidade com que é tratada pelos “poderosos” que a procuram atrás de uma toga. E uma em especial a deixou emocionada: há alguns anos, foi procurada para fazer uma capa preta e capelo para o ex-vice-presidente José Alencar, falecido em março de 2011. A roupa foi usada por ele em uma homenagem na cidade natal, Ubá, na Zona da Mata mineira.
Mas a história de quase 90 anos de corte e costura da família Bavosi um dia chegará ao fim. Mãe de quatro filhos – três homens e uma mulher –, nenhum deles receberá o legado de Aristel. “Eles nunca tiveram interesse em aprender a fazer as togas, mas isso não me deixa triste não”, afirma a costureira, que nega qualquer ressentimento. Atualmente, apenas uma pessoa da família – uma sobrinha – a ajuda quando pode..