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Estado de Minas

Polícia Federal descobre esquema de corrupção na Eletronuclear

Presidente licenciado da Eletronuclear e executivo da Andrade Gutierrez são acusados de desvio de dinheiro da usina Angra 3. Senador e ministro do TCU estão entre os investigados


postado em 29/07/2015 06:00 / atualizado em 29/07/2015 07:20

Othon Silva (de boné) e Flávio Barra (de terno) durante o embarque para Curitiba, ontem à noite (foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)
Othon Silva (de boné) e Flávio Barra (de terno) durante o embarque para Curitiba, ontem à noite (foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)

Brasília – A Operação Radioatividade, a 16ª fase da Lava-Jato que investigou corrupção na usina de Angra 3 e foi deflagrada nessa terça-feira, abriu mais uma janela na apuração de suspeitas que pesam sobre o senador e ex-ministro das Minas e Energia Edison Lobão (PMDB-MA); o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Raimundo Carreiro; e o advogado Tiago Cedraz, filho do presidente do TCU, Aroldo Cedraz. Policiais federais ouvidos pela reportagem adiantaram que um grupo de investigadores que apura o caso no Supremo Tribunal Federal (STF) deve ir a Curitiba avaliar o material apreendido pelos colegas do Paraná em busca de provas para embasar inquéritos na Corte. Os três foram foram apontados em delação premiada pelo presidente da UTC Engenharia, Ricardo Pessoa, de serem beneficiários de pagamento de subornos, mas negam as acusações. “Nunca recebi dinheiro ilegal”, disse Carreiro ontem à noite.

Nessa terça-feira, a PF prendeu o ex-presidente da Eletronuclear Othon Luiz Pinheiro da Silva, almirante da reserva acusado de receber ao menos R$ 4,5 milhões em propinas, para beneficiar empreiteiras em obras na usina de Angra 3. Também foi detido o presidente global da Andrade Gutierrez (AG) Energia Flávio David Barra. Cerca de 180 policiais cumpriram 23 mandados de busca e apreensão de e-mails e documentos em salas de executivos e endereços de Othon Pinheiro.

Também ontem, ainda se avaliava em que momento os investigadores deveriam ir a Curitiba, se já ou só quando os relatórios de análise do material apreendido estivessem prontos, daqui a alguns dias ou semanas. Um investigador considerou fortes as provas que mostraram que o almirante recebeu dinheiro das empreiteiras na conta de sua empresa no mesmo período em que era presidente da Eletronuclear.

Para os policiais, Othon, ligado do grupo do PMDB do ex-presidente José Sarney, pode acabar encurralado e revelar novos personagens do caso. Em março, o então presidente da Camargo Corrêa Dalton Avancini afirmou que as propinas atendiam o partido e o presidente da Eletronuclear. No Ministério Público, a expectativa é que as provas produzidas alimentem o inquérito no STF naturalmente. É uma via de mão dupla, avaliou uma fonte ligada às investigações.

Parlamentares e integrantes do governo se mostraram chocados ontem com a prisão do almirante Othon Pinheiro. Considerado um técnico extremamente qualificado e competente, ele tinha relações próximas com o PMDB. Um parlamentar que atua no setor classificou Othon como “um dos melhores quadros” da área de energia. “Respeitadíssimo nos foros internacionais sobre energia nuclear”, qualificou. O mesmo político lembrou que Othon praticamente reformulou sozinho o funcionamento de Angra 3 e o projeto dos submarinos nucleares que estão em construção, em uma parceria dos governos brasileiro e francês. O militar ainda tem proximidade com o diretor da Eletrobras Valter Cardeal, ligado à presidente Dilma Rousseff.

CORRUPÇÃO ENDÊMICA
Segundo o Ministério Público e a Polícia Federal, a Andrade Gutierrez, seis empreiteiras reunidas no consórcio Angramon e a Engevix bancaram propinas para Othon em três negócios. No primeiro, a AG conseguiu um aditivo de R$ 1,248 bilhão em 2009 para retomar as obras de Angra 3, que começaram em 1983, mas estavam paradas desde os anos 1990. No segundo, a Engevix abocanhou vários contratos entre 2010 e 2013, que somaram R$ 122 milhões. No terceiro, o consórcio Angramon, formado pelos consórcios Uma-3 e Angra-3, conseguiu eliminar um concorrente na pré-qualificação de dois pacotes de obras que somam R$ 3 bilhões. “Houve direcionamento na licitação para que essas empresas concorressem sozinhas”, afirmou o procurador Athayde Ribeiro Costa, um especialista em licitações que integra a força-tarefa da Lava-Jato. “Já sabiam que ganhariam de antemão a licitação.”

Segundo ele, os R$ 4,5 milhões nas contas da Aratec Engenharia, a empresa de Othon, foram pagos entre 2009 e 12 de dezembro do ano passado pela AG e pela Engevix. Não se sabe ainda o valor exato pago por todas as empresas. Os autos do processo mostram, porém, que houve R$ 109 mil pagos pela Camargo Corrêa, R$ 371 mil pela Techint, além de R$ 504 mil pela OAS, que não fez nenhum negócio investigado na operação de ontem. Ribeiro disse que a corrupção para além da Petrobras mostra problemas. “A corrupção no Brasil, infelizmente, é endêmica e está em estado de metástase.”

A Eletrobrás, controladora da Eletronuclear, disse que em comunicado ao mercado que ainda analisa a prisão de Othon. O diretor financeiro da Eletrobrás, Armando Casado, afirmou que um escritório de advocacia contratado para apurar as denúncias de corrupção não terminou o trabalho. A defesa de Othon não foi localizada. O advogado de Barra, Edward Carvalho, considerou a prisão desnecessária. A Andrade Gutierrez afirmou, em nota, que sempre esteve à disposição da Justiça e que seus advogados analisam o caso.

Saiba mais

Angra 3


A usina de Angra 3, localizada na Praia de Itaorna, em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, só entrará em pleno funcionamento em 2018. De acordo com a página oficial da Eletrobras, a energia que será produzida é suficiente, por exemplo, para abastecer Brasília e Belo Horizonte ao mesmo tempo. Com a usina operando normalmente, a energia nuclear passará a gerar o equivalente a 50% do consumo do estado do Rio. Angra 3 ocupa uma área de aproximadamente 82 mil metros quadrados. Conforme dados oficiais, foram executados, até o momento, 60% das obras civis previstas. O investimento total é de R$ 14,9 bilhões. Os recursos estão sendo obtidos, principalmente, por meio de empréstimos tomados pela Eletrobrás, controladora da Eletronuclear. Os equipamentos e serviços contratados são custeados por meio de financiamento BNDES. Já o financiamento para a aquisição de máquinas e equipamentos importados e a contratação de serviços externos são viabilizados mediante contrato com a Caixa Econômica Federal.


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