Brasília – O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), acompanha passo a passo os movimentos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras – acusada pela advogada Beatriz Catta Preta de fazer “ameaças veladas” a ela a fim de intimidar a defensora e seus clientes, que denunciam a participação de parlamentares no esquema de propinas investigado pela Operação Lava-Jato. O principal canal do deputado é o presidente da CPI, Hugo Motta (PMDB-PB), indicado para o cargo pelo próprio Cunha. Ambos negam o controle, mas o grupo aliado do dirigente máximo da Câmara tem apresentado uma série de requerimentos para constranger delatores. Nessa sexta-feira, os peemedebistas reagiram às acusações da advogada e negaram qualquer ingerência sobre a comissão ou alguma tentativa de ameaça. Motta subiu o tom e disse que há “indícios” de “alguns atos ilícios que ela tenha cometido no âmbito do processo da Lava-Jato”.
Hugo Motta criticou a advogada e disse que, apesar da decisão do STF de impedir que ela revelasse dados dos clientes e de seus honorários, a convocação da defensora está mantida. “O que é mais estranho é uma advogada criminalista alegar que está sendo ameaçada e não trazer nenhum fato concreto”, ironizou. “E vir a um jornal de rede nacional querer usar a vitimização para esconder, talvez, alguns atos ilícios que ela tenha cometido no âmbito do processo da Lava-Jato”, acrecentou o presidente da CPI.
Outro aliado de Cunha na CPI é o deputado Celso Panseira (PMDB-RJ), professor de português em seu primeiro mandato e que apresenta a maioria dos requerimentos polêmicos. Saiu do gabinete dele os dois pedidos – ambos aprovados – para quebrar os sigilos da mulher, da filha e da irmã do doleiro Alberto Youssef. O delator o chamou de “pau-mandado do senhor Eduardo Cunha”. Panseira rejeita a pecha de perseguição: “Quem é que achaca? O bandido ou o deputado?”, afirmou ele ao Estado de Minas. O deputado conseguiu também aprovar requerimento para que Catta Preta explicasse a origem dos honorários. Os três requerimentos da CPI foram derrubados no Supremo Tribunal Federal (STF).
Na quinta-feira, Catta Preta disse, em entrevista à TV Globo, que recebia “ameaças veladas” de integrantes da comissão, e que essa “pressão” aumentou após o novo depoimento de seu cliente Júlio Camargo – ele disse ao juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, Sérgio Moro, que Cunha lhe cobrou US$ 5 milhões de propina na venda de dois navios-sondas para a Petrobras.
Os ministros da Justiça, Jaques Wagner, defendeu ontem que as denúncias sejam apuradas pela própria Câmara dos Deputados. Para o titular da Justiça, José Eduardo Cardozo, o caso, que considerou “grave”, deve ser investigado também pelo Ministério Público.
“Autonomia” Eduardo Cunha foi às redes sociais ontem se defender das suspeitas de controle da CPI e de intimidação indireta. “Não participei, não participo nem participarei de qualquer decisão sobre investigações da CPI, que tem a sua autonomia”, assegurou. O presidente da Câmara disse que Catta Preta foi convocada antes do depoimento de Júlio Camargo. “Desconhecia a sua convocação, que se deu, com certeza, antes de o delator mudar de versão. E se pesquisarem na mídia, como fiz, fica claro que ela foi convocada antes de o delator depor no dia 16.” Antes disso, porém, já corria a informação no Congresso de que Júlio Camargo havia mudado seu depoimento e acusado Cunha. Segundo Catta Preta, uma oitiva já foi prestada na Procuradoria-Geral da República, mas não se sabe se isso ocorreu antes da convocação da CPI.
Hugo Motta disse que a empresa britância Kroll – contratada pela Câmara para conduzir uma investigação própria – pode ter delatores entre seus alvos. “Os delatores, confessadamente, assumiram que cometeram delitos. Nós precisamos investigar se eles devolveram tudo que desviaram no âmbito da Petrobras”, disse o peemedebista. Para o deputado Júlio Delgado (PSB-MG), a intenção da CPI é anular toda a Operação Lava-Jato. “A Kroll foi colocada para encontrar algo que fosse divergente, anular as delações e dar uma grande gelatina”, afirmou. Ele duvida que Cunha não interfira na investigação da CPI após decretar sigilo ampliado do trabalho da empresa investigativa. “Como não tem interferência?”, questionou.
O deputado Ivan Valente (Psol-SP) disse ontem que pedirá a quebra de sigilo bancário de Eduardo Cunha e sua convocação na CPI. “Para provar sua versão, Eduardo Cunha deveria abrir os seus sigilos fiscal, bancário, telefônico e telemático. Seria coerente com sua política ofensiva, mas isso ele não faz”, ressaltou o socialista, por meio de nota. O deputado defende a convocação de Júlio Camargo, que, segundo Valente, nunca ocorreu por pressão de Eduardo Cunha.