Curitiba e São Paulo - O operador de propinas Milton Pascowitch afirmou em sua delação premiada que José Dirceu - preso desde segunda-feira, 3, pela Operação Pixuleco - participou de uma reunião em sua casa, no Rio, em que participaram ele, o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque e Roberto Marques, o Bob, que era braço direito do ex-ministro.
Leia Mais
Começa depoimento de Milton Pascowitch à CPI da PetrobrasPascowitch avisa à CPI da Petrobras que ficará em silêncioDefesa de Vaccari diz que lei proíbe condenação com base apenas em delaçãoDelator diz que Vaccari mandou pagar R$ 120 mil a 'uma mulher humilde do PT'Por unanimidade, STJ mantém prisão de Renato DuquePF aponta R$ 1,1 milhão de empresa de Dirceu para escritório de deputado petista'O Zé nunca foi dinheirista', afirma defensor"Laranja" paga casa para mãe de José Dirceu em MinasDuque havia deixado a Petrobras e atuava como consultor em sua empresa D3TM Consultoria - usada para receber propina, segundo a Lava Jato -, mas ainda exerceria influência na estatal.
Os contratos discutidos no encontro eram da Hope Serviços e da Personal Service, que pagavam propina para o esquema de Dirceu, segundo apontam os procuradores da Lava Jato.
A Hope tem contrato bilionário de terceirização de mão de obra técnica e a Personal de serviços de recepção e limpeza. Segundo Pascowitch, no início da gestão da diretoria de Duque, por volta de 2003, 2004, o grupo político de Dirceu, representado pelo lobista Fernando de Moura, se aproximou da Hope, "estabelecendo um 'relacionamento comercial’" que teria perdurado até o Mensalão.
"Na ocasião do Mensalão, a área política se afastou dessas demandas, tendo sido estabelecido um 'interlocutor', entre as áreas, que no caso foi a pessoa de Julio Camargo", registra o delator. "Antes do Mensalão esse recebimento era feito diretamente dos interessados da área política."
Divisão
"Hope pagava 1,5% do valor bruto constante de planilha com o valor faturado dos contratos, o que significava 3% líquido. A Personal pagava valores fixos mensais, apurados de acordo com cada contrato", informa o MPF no pedido de prisão de Dirceu e dos outros alvos da Pixuleco.
"Esses recursos somavam uma média de R$ 500 mil mensais, alcançando R$ 700 mil a R$ 800 mil." Pascowitch apontou a divisão dos valores: "A Fernando Moura (representante de Dirceu na Petrobras) cabiam R$ 180 mil/mês. Duque recebia uma 'cota' de 40% dos valores ilícitos que restavam depois de deduzida a parcela mensal de R$ 180 mil, o que equivalia a cerca de R$ 280 mil mensais; Dirceu, 30%", informou o delator, que disse ficar com outros "30%".
Pascowitch acrescentou ainda que, após certo momento, "por autorização de Dirceu, Luiz Eduardo (seu irmão) e Roberto Marques passaram a receber R$ 30 mil cada". "Quando havia sobras por parte de Dirceu (quando este não precisava de recursos), elas ficavam com Vaccari."
Representante dos pagamentos das duas empresas a partir de 2008 ou 2009, após o lobista Moura se desentender com Julio Camargo, Pascowitch afirma saber que a Hope teria pago os valores até final de 2013 e que a Personal continuou até ser deflagrada a Lava Jato, em março de 2014.
"Os prazos de contratos haviam sido encerrados, havendo necessidade de nova licitação", explicou o delator, que confirmou ter entregue R$ 10 milhões em propina na sede do PT.
Segundo Pascowitch, "Duque atuava diretamente no direcionamento dos convites em novos procedimentos licitatórios". O delator afirmou que a Hope e a Personal ganharam os novos contratos, mas não soube dizer se os pagamentos voltaram a ocorrer.
Defesa de José Dirceu
Em nota à imprensa, o criminalista Roberto Podval, defensor de Dirceu, classifica como desnecessária e sem fundamento jurídico a prisão preventiva do ex-ministro, decretada pela Justiça Federal do Paraná na segunda-feira, 3, e afirma que irá recorrer da decisão nos próximos dias.
Segundo o advogado Roberto Podval, o ex-ministro cumpre prisão domiciliar e já havia se colocado à disposição da Justiça por diversas vezes para prestar depoimento e esclarecer o trabalho de consultoria prestado às construtoras sob investigação.
"Como já havíamos argumentado no habeas corpus preventivo, José Dirceu não se enquadra em nenhuma das três condições jurídicas necessárias para a decretação de uma prisão preventiva: ele não apresenta risco de fuga, não tem como obstruir o trabalho da Justiça nem tampouco é capaz de manter qualquer suposta atividade criminosa", afirma.
"Mesmo sem entrar no mérito apresentado pelo Ministério Público para justificar a prisão, o argumento da Procuradoria de que Dirceu teria cometido crime desde a época em que era ministro da Casa Civil até o período de sua prisão pela Ação Penal 470 também não tem fundamento porque as atividades da JD Assessoria e Consultoria foram encerradas no ano passado e o meu cliente não tem qualquer contato ou recebeu qualquer recurso do delator Milton Pascowitch."
Roberto Podval alerta para o cálculo equivocado apresentado pela Polícia Federal sobre os supostos recebimentos ilícitos por meio da JDA.
Desde 2006, a JDA foi contratada por empresas como a Ambev, Hypermarcas, Grupo ABC, Telefonica, EMS, além dos empresários Carlos Slim e Gustavo Cisneros. Todos, quando procurados pela imprensa, confirmaram a contratação do ex-ministro para orientação de negócios no exterior ou consultoria política.
"Querem apontar a JDA como uma empresa de fachada, o que é muito inconsistente", completa Roberto Podval. "O ex-ministro sempre teve profundo reconhecimento internacional e desenvolveu importantes laços de relacionamento com destacadas figuras públicas ao longo de toda sua trajetória e militância política. Esse era o ativo e o valor de José Dirceu como consultor, sem que nunca fosse exigido dele, por parte dos clientes, o envio de relatórios ou qualquer outro tipo de comprovação dos serviços prestados."
A defesa do ex-ministro reitera que o trabalho de consultoria nunca teve qualquer relação com contratos da Petrobras e que Dirceu sempre trabalhou para ajudar as construtoras na abertura de novos negócios no exterior, em especial em países como Peru, Cuba, Venezuela e Portugal.
Defesa de João Vaccari Neto
O criminalista Luiz Flávio Borges D’Urso reagiu enfaticamente aos termos da delação de Milton Pascowitch, que afirmou ter entregue propina em dinheiro vivo para o ex-tesoureiro do PT. Pascowitch disse que pagou R$ 10 milhões em espécie na sede do PT, em São Paulo.
"Não procede qualquer afirmação, nem desse delator nem de qualquer outro, de que o sr. Vaccari tenha recebido qualquer quantia em espécie. Na verdade, cumprindo sua função de tesoureiro do PT, o sr.Vaccari sempre solicitou doações legais ao partido", declara D’Urso.
O advogado afirmou que todas as doações solicitadas pelo ex-tesoureiro "foram invariavelmente realizadas por depósitos bancários, com o respectivo recibo".
"De tudo foi prestado contas às autoridades competentes", declarou Luiz D’Urso. "Vale lembrar, mais uma vez, que palavra de delator não é prova. E que até hoje nenhuma palavra que acuse o sr. Vaccari nas várias delações foi objeto de comprovação."
Defesa do Partido dos Trabalhadores
"O Partido dos Trabalhadores refuta as acusações de que teria realizado operações financeiras ilegais ou participado de qualquer esquema de corrupção. Todas as doações feitas ao PT ocorreram estritamente dentro da legalidade, por intermédio de transferências bancárias, e foram posteriormente declaradas à Justiça Eleitoral."
Defesa da Hope
"A Hope informa que sempre colaborou e continuará colaborando com as autoridades. A empresa tem certeza de que, ao final das apurações, tudo será esclarecido.".