São Paulo, 11 - O anúncio do governo do Rio Grande do Sul, que confirmou nesta terça-feira, 11, que não vai pagar uma parcela de R$ 280 milhões de sua dívida com a União referente a julho, é preocupante e pode servir de exemplo negativo para os demais Estados. A avaliação foi feita ao Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado, pelo consultor Raul Velloso, especialista em finanças públicas. "Se o compromisso não for honrado, passa a impressão ruim para o setor privado, quando ele tiver que fazer algo com o Estado e com garantia da União", comentou.
Tecnicamente, de acordo com Velloso, a União tem instrumentos para receber a dívida, seja por meio dos recursos das transferências automáticas ao Rio Grande do Sul, seja por meio da conta de ICMS - uma das principais fontes de receita dos Estados. "Essa é a garantia do contrato e vai forçar a União a fazer isso. Se não fizer, criará um caso e passará a impressão de que o setor público não é capaz de cumprir seus compromissos."
Pensando nisso, o governador do Rio Grande do Sul, José Ivo Sartori (PMDB), vai amanhã à Brasília para negociar com representantes da Secretaria do Tesouro e do Supremo Tribunal Federal (STF). O STF julga atualmente um recurso do Estado para reverter uma primeira decisão em favor de liminares obtidas em maio por entidades representativas dos servidores, determinando a necessidade de o Executivo gaúcho pagar os salários em dia na sua totalidade, e não em parcelas.
Ontem, o caixa do Estado recebeu o aporte de R$ 520 milhões proveniente do ICMS e de repasses federais, que serão usados para pagamentos de parte dos salários atrasados. São justamente estes repasses que, em função do calote contra a União, estão ameaçados agora.
Por outro lado, continuou Velloso, em um momento de dificuldades para vários Estados, a União também não pode dar o "mau exemplo", aliviando a situação do Rio Grande do Sul. "Se isso ocorrer, outros Estados poderão sair com a mesma solução.
Pagamentos a servidores
O governo do Rio Grande do Sul confirmou hoje o pagamento integral dos salários atrasados de julho dos servidores públicos estaduais, antecipando o cronograma de parcelamento anunciado no final do mês passado. O Executivo informou que a decisão foi possível devido ao ingresso de R$ 520 milhões, na segunda-feira, 10, no caixa do Estado, provenientes da arrecadação de ICMS e repassas federais, que foram suficientes para cobrir o déficit existente.
Para quitar a folha dos servidores, o governador optou por atrasar ainda mais o pagamento da parcela mensal da dívida com a União, mesmo correndo o risco de sofrer bloqueios por parte do governo federal.
"Todos do governo sabemos os riscos e as consequências desta decisão", disse Sartori em pronunciamento, na manhã de hoje, no Palácio Piratini. "Mas temos também de dizer que é mais um esforço que estamos fazendo no sentido de colocar em dia o pagamento dos servidores", complementou o governador, que não respondeu a perguntas da imprensa.
Em 31 de julho, quando anunciou o parcelamento dos salários em função do agravamento da crise financeira, o Executivo gaúcho já havia reconhecido que o pagamento da dívida com a União iria para o fim da fila. Desde que começou a atrasar o serviço da dívida, em abril, o RS vinha conseguindo acertar a pendência até a segunda semana do mês subsequente, o que evitou, até o momento, qualquer tipo de sanção por parte do governo federal. Agora, no entanto, não há previsão para o pagamento dos R$ 280 milhões relativos à parcela mensal relativa a julho. Hoje, nem Sartori nem o secretário da Fazenda, Giovane Feltes, sinalizaram quando isso ocorrerá.
"Não há nenhuma carta na manga que possa ser lançada para fazer frente a uma dificuldade momentânea. Existe sim uma razoabilidade e um consenso no sentido de matar um leão a cada dia e ao mesmo tempo sofrer uma dor a cada dia", disse Feltes, que classificou a iniciativa do governo gaúcho de quitar a folha como uma decisão política.
Salários
A linha de corte da primeira parcela dos salários, paga no dia 31 de julho, foi de R$ 2.150. De acordo com o planejamento inicial do Executivo gaúcho, uma segunda parcela no valor de R$ 1 mil seria desembolsada até 13 de agosto. Os profissionais com vencimentos superiores a R$ 3.150 só receberiam o restante em uma terceira parcela, que será quitada até 25 de agosto.
Feltes afirmou que, apesar de ter priorizado o pagamento dos servidores, o Estado conta com o bom senso do governo federal e espera que repasses como o Fundo de Participação dos Estados e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) continuem sendo creditados "de forma regular e tranquila", assim como as transferências relativas ao Sistema Único de Saúde e outros recursos que resultam de convênios com secretarias. Ele admitiu, no entanto, que existe a possibilidade de sanções ao RS.
"Temos tido boa acolhida por parte do Ministério da Fazenda e da Secretaria do Tesouro Nacional, com quem estabelecemos relação respeitosa e republicana. Mas o contrato (da dívida) é duro. E temos de entender quando a União possa agir de acordo com o contrato. Não temos muito o que fazer, até porque pode haver responsabilizações aos gestores federais", avaliou.
Feltes não garantiu o pagamento integral dos salários dos servidores em agosto e disse que o déficit mensal do Executivo gaúcho continua sendo da ordem de R$ 450 milhões..