Brasília - O Congresso aguarda, apreensivo, a deflagração de uma etapa importante da Operação Lava-Jato: as primeiras denúncias, no Supremo Tribunal Federal (STF), contra políticos com mandato. A expectativa é de que, até esta sexta-feira (21), a Procuradoria-Geral da República denuncie o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o ex-presidente da República e senador Fernando Collor (PTB-AL) por lavagem de dinheiro e corrupção. Os procuradores trabalhavam nessa quarta-feira (19) para finalizar as peças e entregar as acusações por desvios na Petrobras o quanto antes.
Uma fonte ligada ao caso informou ao Estado de Minas que as duas denúncias são “as mais maduras” entre os 50 políticos suspeitos de receberem propina de desvio de dinheiro da petroleira. Para esse investigador, a eventual ação no STF não isentará Cunha de responder a outros inquéritos, que continuarão em aberto para apurar a suposta intimidação de pessoas pelo deputado.
AFASTAMENTO Um grupo de deputados liderado pelo PSol prepara um manifesto popular para pressionar Eduardo Cunha a se afastar do cargo. Foi formada uma comissão de redaçãonessa quarta-feira (19) para definir detalhes do texto. “A decisão da PGR vai mudar o jogo de forças”, disse Ivan Valente (SP). “Não há resistência (dos parlamentares) que resista às ruas, à verdade dos fatos”, afirmou. O objetivo é impedir que Cunha interfira nas investigações contra ele. Na reunião desta quinta-feira da CPI da Petrobras, o PSol pedirá convocação imediata de Cunha e Júlio Camargo. A sigla aguarda o STF receber a denúncia da PGR para abrir um processo no Conselho de Ética contra o peemedebista.
Nessa quarta-feira (19), Cunha não comentou as acusações que devem ser feitas pela PGR. Sobre o manifesto, negou a possibilidade de renúncia. “Não é a minha natureza”, disse. “Vou continuar exatamente no exercício para o qual fui eleito pela maioria desta Casa. Estou absolutamente tranquilo e sereno com relação a isso”, afirmou. O líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), defendeu a manutenção de Cunha no cargo. “No Estado de direito, vale a presunção da inocência.”
CONTA BANCÁRIA No caso de Collor, o senador foi acusado por Alberto Youssef de receber dinheiro em sua própria conta bancária — com comprovantes obtidos pela Polícia Federal — a pedido de seu amigo e ex-ministro Pedro Paulo Leoni Ramos. Segundo o doleiro, os valores foram pagos antes, durante e depois de um negócio intermediado por Leoni entre a BR Distribuidora, onde Collor tinha afilhados políticos, e uma rede de postos de combustíveis.
A Procuradoria-Geral da República afirma que Collor recebeu R$ 26 milhões em propinas do esquema na Petrobras por meio de um “sofisticado esquema de lavagem de dinheiro”. Carros esportivos e documentos de Collor foram apreendidos pela PF nas residências e empresas do ex-presidente em Brasília e em Maceió, na Operação Politeia, um desdobramento da Lava-Jato.
Collor não quis comentar o caso. Ele tem negado irregularidades, mas ainda não explicou por que recebeu dinheiro de Youssef em sua conta bancária. O senador tem dedicado a defesa a desqualificar o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Nessa quarta-feira, o senador apresentou voto em separado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) contra a recondução de Janot ao cargo — o mandato do chefe do Ministério Público Federal se encerra em setembro.
Fontes da PGR acreditam que Janot terá 70% dos votos do Senado para continuar no cargo. Mas Collor — que chamou o procurador-geral de “filho da p*” na tribuna do plenário — afirmou que Janot não pode ser reconduzido por responder a processos no Tribunal der Contas da União (TCU), em procedimentos feitos a pedido do próprio senador para apurar a contratação de empresas sem licitação. “Há uma infindável lista de condutas ilícitas, reprováveis e abusivas praticadas pelo PGR, e que foram objeto de denúncias”, disse Collor na peça.
STF nega pedido
O ministro Teori Zavascki, relator da Operação Lava-Jato no STF, rejeitou nessa quarta-feira o pedido do presidente da Câmara, Eduardo Cunha para retirar da Justiça Federal do Paraná a ação em que o deputado é citado. Em depoimento no curso do processo, o lobista Júlio Camargo relatou pagamento de US$ 5 milhões ao peemedebista. A defesa de Cunha alegava que o juiz Sérgio Moro “usurpou a competência do Supremo” ao colher depoimento em que o deputado, que tem foro privilegiado, é citado. Os advogados do presidente da Câmara tentavam, com a ação, anular todos os atos relativos a Cunha no processo do Paraná, como o depoimento de Camargo. Em resposta à reclamação de Cunha, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, alegou que foi “absolutamente correto todo o procedimento de colheita de provas realizado” e chamou de “ilação” a acusação feita pelo peemedebista de que o depoimento de Camargo tem por objetivo afastá-lo da presidência da Câmara.