Brasília – O agravamento da crise política do país e o aprofundamento da recessão acentuaram o racha da equipe econômica. Escolhido para fazer um contraponto a linha ortodoxa do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, o chefe do Planejamento, Nelson Barbosa, passou a ganhar as quedas de braço com o colega na medida que a base aliada se mostrou contraria a mais medidas de arrocho. Sempre que são chamados ao Palácio do Planalto pela presidente Dilma Rousseff os dois divergem em qual seria a melhor opção para ajustar as contas públicas e a falta de sintonia entre eles tem ficado evidente a cada pronunciamento dos dois.
Após perder espaço no governo com a chegada de Levy e com a escolha do vice-presidente, Michel Temer, para assumir a coordenação política, Mercadante voltou a ser ouvido no momento que a chefe do Executivo deixou de ter o apoio do PMDB e ficou acuada diante da crise política. Com mais acesso ao gabinete presidencial, Barbosa e o chefe da Casa Civil convenceram Dilma a anunciar, sem qualquer estudo prévio, a redução de ministérios que trouxe mais um problema para a equipe econômica. O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, não gostou de ser informado pelos jornais dá possibilidade de perda do status de ministro em uma eventual reforma coordenada pelo Planejamento.
Na prática, a autoridade monetária voltaria a ser subordinada à Fazenda e Tombini teria de pedir autorização a Levy para fazer uma viagem internacional para participar, por exemplo, das reuniões bimestrais do Banco de Compensações Internacionais (BIS), em Basiléia, na Suíça. Ainda que o chefe do BC tenha, em boa parte do primeiro mandato de Dilma, se submetido aos desejos do Planalto, ele goza de uma autonomia operacional que ruiria por terra com a vinculação ao Ministério da Fazenda.
Para o professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB) Jorge Arbache, na medida em que as crises política e econômica se agravarem, a divisão entre os chefes do Planejamento e da Fazenda aumentará. Para ele, falta no governo uma liderança política para construir pontes entre as diferentes visões e demandas. “Não vejo um líder para conduzir o barco pelas águas turvas que enfrentamos. Os ministros concordam que o país precisa de um tratamento, mas na hora de definir os remédios ficam claras as divergências”, comentou.
Duelo no Congresso
Nessa terça-feira (1º,) tanto o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, quanto o do Planejamento, Nelson Barbosa foram ao Congresso no esforço do governo para tentar diminuir o déficit de R$ 30,5 bilhões previsto para o ano que vem. O ministro do Planejamento passou parte do dia em reuniões com bancadas de partidos aliados para explicar os números da peça orçamentária e pedir apoio dos parlamentares. O primeiro foco foi o PT. Barbosa chegou à reunião da bancada e explicou o rombo no orçamento, ressaltando que as despesas obrigatórias têm pouco espaço para contingenciamento. Segundo ele, a apenas 9,5% delas cabe economia.
Ao apresentar números da situação do país, frisou a Previdência Social como o maior gasto fixo do governo, correspondente a 41% das despesas, e ressaltou a necessidade de reformas estruturantes. “Precisamos retomar uma ampla discussão sobre a Previdência Social. Hoje é o gasto que mais cresce”. Barbosa destacou a todo momento a necessidade de mudanças em gastos obrigatórios do governo, reiterando por diversas vezes que isso deve ser feito via Congresso Nacional.
Já o ministro da Fazenda disse, na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara, que há disposição do governo para alcançar a meta fiscal traçada anteriormente. “Vivemos um desequilíbrio do orçamento, mas há disposição do governo para alcançarmos a meta (de superávit primário em 2016), que já é uma meta reduzida, de 0,7% do PIB”, disse Levy. O ministro disse também que se a “casa” não for colocada “em ordem”, o dólar vai disparar. “É preciso tomar medidas para o Brasil voltar para a rota do crescimento”, afirmou.
Buraco maior
A missão da equipe econômica para convencer os parlamentares, no entanto, será mais difícil. O relator-geral do Orçamento da União de 2016, deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), informou nessa terça-feira que a proposta apresentada pelo governo federal não incluiu despesas que podem chegar a R$ 3,4 bilhões, o que pode aprofundar ainda mais a previsão de rombo. Segundo o deputado federal, não foram computados no documento emendas parlamentares impositivas, em um total de R$ 1,5 bilhão, e recursos da Lei Kandir, em um montante de R$ 1,9 bilhão.
Ele ressaltou, contudo, que normalmente a Lei Kandir é incluída pelo Congresso Nacional no Orçamento da União e que ela não tem sido executada nos últimos anos integralmente, apesar da pressão de governadores do país. As emendas parlamentares também costumam ser incluídas pelo Congresso, não pelo Poder Executivo. “São R$ 3,4 bilhões. Nós vamos ter de ajustar, isso não está previsto. O governo federal normalmente não manda a Lei Kandir e é o Congresso Nacional que coloca. Neste ano, excepcionalmente, mandaram metade, R$ 1,9 bilhão”, explicou.