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Estado de Minas

Escolas de Montes Claros adotam cartilha para conscientizar alunos contra a corrupção

Cartilha que aborda desvios de conduta na rotina de cidadãos comuns e servidores é distribuída na rede municipal de ensino de Montes Claros


postado em 07/09/2015 06:00 / atualizado em 07/09/2015 07:59

Escola Municipal Vidinha Pires, onde a cartilha foi distribuída aos alunos. Maioria desconhece o significado da palavra corrupção(foto: Luiz Ribeiro / EM / D.A Press)
Escola Municipal Vidinha Pires, onde a cartilha foi distribuída aos alunos. Maioria desconhece o significado da palavra corrupção (foto: Luiz Ribeiro / EM / D.A Press)

A educação, a partir de uma cartilha com linguagem simples e exemplos de situações corriqueiras, que mostram desvios de conduta no dia a dia do cidadão, pode ser a melhor ferramenta no combate à corrupção. É essa a aposta do corregedor do município de Montes Claros (Norte de Minas), o delegado aposentado da Polícia Federal Geraldo Guimarães, autor da cartilha “Corrupção – Tolerância Zero”, que será distribuída aos 35 mil alunos matriculados na rede municipal de ensino da cidade no Norte de Minas. São apenas 10 páginas, que ensinam, com exemplos claros, como evitar atos que podem ser associados à corrupção.

Só para ilustrar o tamanho do problema, de acordo com levantamento da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a corrupção é responsável por desvios de pelo menos R$ 50,8 bilhões por ano no país, que podem chegar a R$ 84,5 bilhões.

“Entendemos que a prevenção é o caminho mais curto para combater todo tipo de crime. Neste momento, em que estamos vendo tantas mazelas e tantos corruptos divulgados pela imprensa, decidimos fazer esse trabalho, dentro do projeto ‘Tolerância Zero com o Errado’, da prefeitura, com o objetivo de levar o tema corrupção para ser discutido dentro da sala de aula e, consequentemente, na casa de cada um dos alunos”, explica Guimarães.

A secretária de Transparência e Prevenção da Corrupção da Controladoria-Geral da União (CGU), Patrícia Audi, explica que, ao se estudar o fenômeno da corrupção, múltiplas vertentes são indicadas para explicar a sua ocorrência, desde problemas institucionais a aspectos culturais e éticos. “Sabe-se que medidas preventivas, em especial aquelas de caráter formativo e educativo, se apresentam como uma das mais importantes estratégias para o combate à corrupção de maneira estruturante, uma vez que atua diretamente na formação do cidadão”, diz ela. A CGU também desenvolve campanhas pedagógicas no sentido de prevenir os desvios.

“No momento em que a mídia dá muito destaque aos escândalos de corrupção no país, queremos mostrar para as crianças uma nova visão sobre importância da honestidade e do respeito aos bens públicos”, diz a secretária municipal de Educação de Montes Claros, Sueli Nobre Ferreira. Para a professora Amália Maria da Silva, que leciona no quinto ano do ensino fundamental, a cartilha anticorrupção, com linguagem simples, vai interferir também no comportamento dos adultos. “Às vezes, uma criança não consegue ter noção do mal que é a corrupção, com potencial para tornar-se um possível corrupto. Com essa cartilha, elas vão saber o que é realmente errado e vão conscientizar os seus pais para que evitem esses tipos de conduta”, avalia a professora.


‘JEITINHO’
O corregedor Geraldo Guimarães defende que o tema seja abordado de alguma forma no currículo dos ensinos fundamental e médio. “No passado, aprendíamos sobre os valores civis, éticos e morais nas aulas de educação moral e cívica. A corrupção nada mais é do que a deterioração do comportamento e desses valores. Muitas vezes, ela começa em atos simples, dentro da cultura do ‘jeitinho’ e de ‘levar vantagem em tudo’. Mais tarde, corrói a pessoa. Ela deteriora o convívio social. Qualquer ato que leva a pessoa a obter vantagem em detrimento de alguém é um ato de corrupção”, diz.

A importância da prevenção também é ressaltada pelo secretário-geral da organização não governamental (ONG) Contas Abertas, o economista Gil Castello Branco. “O mais grave da corrupção no Brasil é que ela provoca desânimo na população e o descrédito nas instituições públicas. Só se muda a cultura de um país pela educação, e é essencial começar a trabalhar as novas gerações, conscientizando as crianças e mostrando que todos ganham quando se diminui a corrupção”, enfatiza.

O fundador da Contas Abertas ressalta que, se for levado em conta o montante de R$ 50,8 bilhões apurado pela Fiesp, com o dinheiro desviado pela corrupção no país a cada ano, será possível construir 918 mil casas populares ou implantar 57,6 mil escolas de ensino fundamental.

Castello Branco ressalta que, ultimamente, sobretudo por conta da Operação Lava-Jato, é verificada uma mudança no combate aos desvios de recursos públicos no Brasil, diminuindo a impunidade. “Mais recentemente, passamos a assistir a cenas que antes eram inéditas, com prisões de empresários e condenações de políticos importantes. Essa mudança também aconteceu a partir de cobranças da sociedade, que está num nível de indignação muito grande diante de tudo isso que está ocorrendo”, afirmou o secretário-geral da ONG.

Ele também defende que a prevenção da corrupção e o respeito ao patrimônio público deveriam ser inseridos na grade curricular do ensino básico. “Precisamos conscientizar nossas crianças e jovens. Poderia voltar a disciplina moral e cívica para as escolas. Mas, em vez de as crianças aprenderem apenas a cantar o hino nacional, deveria ser mostrada a elas a importância do combate à corrupção para se ter uma sociedade melhor.

Dever que termina em casa

Os alunos da Escola Municipal Vidinha Pires, no Bairro Vargem Grande, área de baixa renda de Montes Claros, estão entre os primeiros a receber a cartilha “Corrupção – Tolerância zero”. A reportagem acompanhou a “aula contra corrupção”, que contou com a presença do corregedor Geraldo Guimarães. A maioria dos alunos, entre 7 e 10 anos, desconhece o significado de corrupção e ouviu atentamente as explicações sobre o tema. Mas alguns se arriscaram a dar sua opinião.

“Corrupção é um ato de vandalismo”, define Felipe Soares Campos, de 10. Para Vitória Gabriele, de 9, corrupção ocorre “quando as pessoas roubam coisas que não são delas”. “Sei que roubar não compensa”, declarou Vitor Gabriel, de 10, prometendo levar a cartilha para seus pais, o marceneiro João Nunes Araújo e a doméstica Solange dos Santos.

E é entre os adultos de baixa renda e com pouca instrução que o tema se mostra ainda mais distante, mesmo com o constante noticiário dos desvios de recursos da Petrobras e outros escândalos no país. A reportagem constatou esse desconhecimento ao visitar a Vila Castelo Branco, uma das áreas mais pobres de Montes Claros, onde os moradores sofrem com a falta de posto de saúde e escola, serviços afetados no país pelo mau uso de recursos.

“Não sei o que é corrupção. Vejo as pessoas dizendo... Mas penso que não é coisa boa”, responde Maria Aparecida de Jesus, de 64 anos. “Não tenho nem ideia do que é isso”, respondeu o marido dela, o aposentado Geraldo José de Jesus, 71. A doméstica Eleuza Ferreira Fraga, de 43, diz “achar” que a corrupção é praticada por “aqueles que desviam as merendas das crianças e o Bolsa-Família”.

DEMISSÕES
Desde que a Subscretaria de Combate à Corrupção e Informação Estratégica foi criada pela Prefeitura de Montes Claros, em menos de dois anos, já foram afastados dos seus postos de trabalho pelo menos 25 servidores, entre efetivos, contratados e comissionados, por envolvimento em atos ilícitos, incluindo os chamados “pequenos atos de corrupção do dia a dia”, como o uso de atestados médicos falsos para faltar ao serviço. “Fazemos as investigações e, a partir das provas, tomamos as medidas cabíveis”, afirma o subsecretário, o capitão da Polícia Militar José Pedro Oliveira.

Ele cita, entre os casos que acabaram em demissão, a investigação de uma denúncia de que servidores do município estavam recebendo indevidamente o benefício do Bolsa-Familia, administrado por eles próprios, e a de um servidor comissionado que fiscalizava a prestação de serviços de aluguel de carros por uma empresa e estava recebendo salário da própria prestadora de serviço. Houve também um caso de funcionários que falsificaram decreto municipal para receber gratificação salarial indevida.


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