Apontado na Operação Zelotes como responsável por sacar dinheiro do esquema de corrupção no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), o motorista Hugo Rodrigues Borges afirmou que a ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra mantinha vínculo com um dos escritórios suspeitos de pagar propina a conselheiros do órgão, espécie de "tribunal" que julga casos de grandes contribuintes em débito com a Receita Federal.
Leia Mais
Operação Zelotes investiga uso de notas fiscais friasPF deflagra segunda fase da Operação ZelotesCNJ pede que juiz da Zelotes preste esclarecimentos sobre condução do casoPF deflagra nova etapa da Operação ZelotesEm depoimento à CPI do Carf, prestado na última quinta-feira, o motorista contou que Erenice frequentava semanalmente a sede das empresas de Silva, no Lago Sul, em Brasília, acompanhada do ex-ministro de Minas e Energia Silas Roudeau, ligado ao senador Edison Lobão (PMDB-MA), ex-titular da mesma pasta. Questionado, Borges disse que as idas "eram bem frequentes" até que a "sociedade" se desfez, em 2012.
"Eram ele (Roudeau) e a Erenice que frequentavam o escritório lá. Eram várias salas de reuniões, então fechavam as portas", relatou o depoente, que não soube dar detalhes dos assuntos tratados pelos ex-ministros. "Cruzei várias vezes com ela na sala do escritório... era um poço de arrogância."
À CPI, Borges explicou que quando a imprensa começou a rondar o escritório e publicar reportagens sobre as atividades de Erenice após deixar a Casa Civil o grupo resolveu se afastar. José Ricardo, segundo o motorista, não queria ter sua imagem associada à ex-ministra, envolvida em escândalos. "Eles (Roudeau e Erenice) não se importavam muito (com a associação).
Erenice era a principal auxiliar da então chefe da Casa Civil Dilma Rousseff no governo Lula e a substituiu em 2010, quando a petista se lançou candidata à Presidência de República. Deixou o cargo no mesmo ano, após ser acusada de exercer tráfico de influência na pasta.
Após sair do governo, Erenice passou a atuar formalmente como advogada. Um contrato apreendido na Operação Zelotes indica que a ex-ministra se associou a José Ricardo para defender no Carf os interesses da multinacional de telecomunicações Huawei, que questionava débito de R$ 705 milhões com a Receita. Conforme o documento, revelado pela revista Veja, ela receberia 1,5% do valor que conseguisse abater no Fisco.
Borges admitiu no depoimento que sacou os R$ 4 milhões de três contas das empresas de consultoria. Em ao menos três ocasiões, as retiradas foram de R$ 400 mil. O motorista disse que levava as quantias para a sede das empresas, onde eram distribuídas a várias pessoas. À CPI, contudo, alegou não saber identificá-las.
Apesar do vaivém de altas somas de dinheiro, Borges contou que as consultorias viviam em dificuldades financeiras, não raro com as contas de luz, água e telefone "penduradas".
'Bocudo'
Procurada, Erenice negou ser sócia das consultorias: "Não procede". Ela não quis dar mais informações a respeito, justificando que não fala com a imprensa: "Não é pessoal. Lembre-se sempre disso, tá? É uma definição minha: realmente não falo". A ex-ministra acrescentou apenas que o motorista é "uma pessoa que não merece crédito". "Você me desculpe, mas ele mesmo diz que ninguém o leva a sério porque fala demais."
Ao explicar porque nem sempre os patrões lhe contavam tudo, Borges declarou: "O problema é que falo demais. Se sei de alguma coisa, poderia (sic) contar para um, para outro, e complicaria a situação. Todos sabem que eu era 'bocudo'".
As defesas de José Ricardo e de APS negam que eles participem de esquema de corrupção no Carf. O Estado não localizou o ex-ministro Silas Rondeau ou seus representantes.
.