São Paulo - A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) seção de São Paulo anunciou que irá protocolar uma representação na Procuradoria-Geral de Justiça, com pedido de instauração de inquérito contra o prefeito de Ilhabela, no litoral norte paulista, Antonio Luiz Colucci (PPS). A entidade da advocacia atribui a Colucci suposto abuso de autoridade. A decisão da OAB ocorreu após o prefeito comparecer na noite da quinta-feira, 8, a uma sessão pública de desagravo à advogada Fernanda Carbonelli.
Na sessão pública, segundo advogados que foram ao ato, Colucci chegou acompanhado de seu secretariado e funcionários da prefeitura. A OAB-SP afirma em texto divulgado em sua página na internet que Colucci e assessores arrancaram das cadeiras postadas à frente da mesa diretora as indicações de que elas estavam reservadas a advogados. Os secretários de Colucci ocuparam os lugares.
Segundo o advogado Mário de Oliveira Filho, designado pelo Conselho Regional de Prerrogativas da OAB/SP, por meio de seu celular o prefeito fez imagens do ato, "numa forma de intimidação". Oliveira Filho presidiu o ato de desagravo em nome do presidente da OAB/Seccional de São Paulo, Marcos da Costa.
"Em sessões públicas de desagravo, o cidadão que causa constrangimentos a membros da advocacia não são convidados", diz a OAB/SP. Um Boletim de Ocorrência da Polícia Militar (BOPM) foi registrado.
Para que um desagravo ocorra, a OAB segue ritual semelhante a um julgamento, no qual testemunhas são ouvidas em oitivas, provas são produzidas e o requerido, no caso o prefeito, tenha todas as chances de defesa. Segundo a OAB, o prefeito apresentou defesa escrita, e depois foi intimado por duas oportunidades, para apresentar suas testemunhas.
"Colucci não compareceu para fazer sua defesa oral e negou os fatos apenas por escrito", afirma a o criminalista Mário de Oliveira Filho. "Ele não compareceu à defesa oral e fez com que testemunhas que poderiam defendê-lo também não comparecessem, mostrando inclusive, desprestígio contra o próprio procedimento da OAB."
"Estou de alma lavada”, resumiu a advogada Fernanda Carbonelli, que aguardou durante seis anos a concessão do desagravo. A sessão estava lotada, contou com a presença de dezenas de advogados de Ilhabela, São Sebastião, de cidades do Vale do Paraíba, de São Paulo e de estudantes de Direito.
"A concessão do desagravo foi uma vitória para a democracia de Ilhabela e, consequentemente, para toda a classe no Estado de São Paulo. Apesar do incidente, ficou claro que a defesa da prerrogativa dos advogados é de suma importância para garantir o pleno exercício da democracia", disse o presidente da recém-criada 244ª subseção da OAB de Ilhabela, Geralcílio Pereira da Costa Filho, que congrega 134 advogados na cidade.
A OAB realizou a sessão pública de desagravo à advogada "pelo fato de ela ter sido ofendida pelo prefeito em 20 de julho de 2009". A solicitação da advogada foi submetida ao crivo da Comissão de Direitos e Prerrogativas OAB de São Paulo e o ato de desagravo aprovado por 13 votos a 0. Foi a primeira sessão deste gênero em Ilhabela.
Ao final do ato, na noite de quinta, 8, o prefeito Colucci pegou o microfone e disse. "Eu queria dizer a todos aqui que isso ocorreu sem a minha defesa, a Ordem deveria ter dado a mim o direito de defesa e não deu".
O prefeito foi interrompido por vaias dos advogados, que gritavam. "Viva a democracia!" Naquele 20 de julho de 2009, segundo a OAB, Fernanda Carbonelli foi expulsa do gabinete do prefeito após tentar obter informações sobre a demora da prefeitura em liberar a reconstrução do muro de uma residência pertencente a um cliente, que foi destruído pela força da maré.
A advogada afirma que a Secretaria de Obras e o Departamento Jurídico da prefeitura deliberaram para a reconstrução do muro "já que o local pertence à União e o proprietário tinha as respectivas autorizações do órgão".
Fernanda Carbonelli diz que foi ao gabinete de Colucci para mostrar, por meio de um dossiê fotográfico e documental, que a propriedade era regular, que o muro era muito antigo e que estava sendo reconstruído no mesmo alinhamento anterior e que a própria prefeitura havia liberado sua reconstrução.
De acordo com a representação da Comissão de Direitos e Prerrogativas OAB de São Paulo, "em certo momento, Colucci a empurrou e gritou 'ponha-se para fora daqui e não volte nunca mais'." A OAB afirma que cerca de 20 pessoas testemunharam o episódio.
No dia seguinte, Colucci determinou a demolição do muro. "A advogada buscou no Poder Judiciário a anulação da demolição e após uma batalha judicial, a sentença, já transitada em julgado, determinou que o muro era regular", diz a OAB.
"Quando uma autoridade viola a prerrogativa ou direito de um advogado, o profissional pode recorrer à OAB e requisitar o ato de desagravo. Neste caso, o prefeito, como funcionário público, deveria agir ao contrário. Portanto, após o julgamento, a Ordem dos Advogados do Brasil entendeu que houve ofensa à prerrogativa da advogada e ele ainda pode ser processado por danos morais", explicou o advogado Mário de Oliveira Filho, conhecido por defender as prerrogativas dos advogados.
Defesa
O prefeito Colucci reagiu enfaticamente à acusação da OAB. Ele não admite ter cometido abuso de autoridade no ato de desagravo. "Eu nunca fui ouvido pela Ordem, por isso fui ao ato (de desagravo). Queria entender o que ocorreu, o motivo do desagravo, e fazer uso da palavra. Mas não pude falar. A Ordem deveria primar por ouvir as pessoas, não só o associado ou filiado dela", afirmou.
Colucci disse que em 2009, de fato, recebeu em seu gabinete a advogada Fernanda Carbonelli. "Ela pediu uma audiência breve para cuidar dos interesses de um cliente, um veranista que invadiu uma área da praia, uma área pública. Eu disse à advogada que a Prefeitura iria retomar a área. Encerrei a reunião porque já era tarde. Levantei e disse a ela: 'a audiência acabou'. Pedi para ela se retirar do meu gabinete. Ela começou a gritar. Me xingou."
O prefeito disse que se surpreendeu com o pedido de desagravo. "Eles fizeram o procedimento à minha revelia. Por isso fui ao ato, que é público. Não vou ter o direito a falar nada? A OAB deveria me ouvir, não apenas defender sua filiada. Deveria dar oportunidade a mim de falar. Não pode agir de forma unilateral. Nunca fui ouvido, nunca me chamaram."
Colucci afirma que não promoveu nenhuma hostilidade no ato de desagravo. "Quando chegamos (ele e seus secretários e assessores), por volta de 19h30, as cadeiras estavam vazias e nos sentamos. Não fazia sentido ficarmos de pé. Fui ao ato para entender o que estava acontecendo e ter a palavra. O ato era só para os associados? O convite que anunciaram até pela imprensa era para todos da sociedade. Quando o ato já estava encerrado eu pedi a palavra, mas não me deram oportunidade", disse.