O governo de Dilma Rousseff cometeu delitos na manipulação das contas públicas e deve cair para que o Brasil retome a ordem jurídica, afirmou, em entrevista à AFP, o jurista Helio Bicudo, fundador do PT e promotor do pedido de impeachment da presidente.
Ex-deputado de 93 anos, Bicudo foi um dos fundadores do PT, muito ligado ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a quem hoje diz considerar um farsante. Ele rompeu com o partido há uma década e hoje é um dos nomes mais atuantes do movimento que tenta tirar o PT do poder no Brasil.
Leia Mais
Intelectuais divulgam manifesto contra tentativas de impeachment de DilmaCunha se reúne com advogados para finalizar recursos sobre impeachmentNovo pedido de impeachment de Dilma será entregue terça-feira à CâmaraPF abre inquérito para investigar irregularidades na campanha de DilmaDilma vai à Suécia e Finlândia para ampliar cooperação comercial e educacionalEsta semana, Bicudo formalizou um novo pedido de julgamento político contra Dilma junto a outros juristas, representantes de dezenas de movimentos políticos e sociais, assim como do deputado Carlos Sampaio, do PSDB. O pedido seria apresentado nesta sexta ao Congresso, mas o trâmite foi adiado para a próxima terça. O pedido baseia-se nas acusações das chamadas "pedaladas fiscais", que maquiaram o orçamento oficial com empréstimos de bancos federais para dar a ideia de uma boa gestão.
AFP: Por que o senhor acha que o governo de Dilma deve cair?
HB: Porque não é um governo. Dilma Rousseff já não governa mais, ela vai tomando decisões segundo os acontecimentos, e um governo sem norte é muito ruim.
AFP: Quais são os principais pontos do pedido de impeachment?
HB: O pedido mostra que Dilma violou os princípios constitucionais e legais. Por exemplo, os empréstimos dos bancos federais. É proibido fazer isso, e ela fez. A lei proíbe que se use bancos oficiais para resolver problemas financeiros do governo.
AFP: Mas a própria presidente, como o ex-presidente Lula, disse que essas são práticas antigas no Brasil.
HB: Eu não vejo essas práticas como práticas antigas. O crime não tem práticas antigas ou modernas. Há um momento em que os fatos têm de ser levantados. E agora é o momento de mostrar que o governo comete ilegalidades, e essas ilegalidades embasam o pedido de impeachment da presidente. Já li comentários que se Dilma se mantiver no poder, o Brasil vai para o abismo.
AFP: O senhor acredita que a presidente tem conhecimento desses fatos, como, por exemplo, os casos de corrupção?
HB: Eu acho que ela sabe perfeitamente o que está fazendo. Se não sabe, então não deveria estar no governo. Se ela não tem consciência de que está atuando de uma maneira ilegal, contra os princípios da Constituição e da Lei de Responsabilidade, é completamente irresponsável.
AFP: O ex-presidente Lula disse por estes dias que esse mecanismo permitiu que seguissem adiante os programas sociais promovidos pelo governo.
HB: Essa é uma maneira muito frágil de explicar a violação de uma lei.
AFP: Para iniciar um julgamento contra a presidente, o pedido de impeachment deve ser aceito pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que hoje é questionado por corrupção. Isso não tira a legitimidade do processo?
HB: É preciso distinguir a pessoa dele da pessoa do presidente da Câmara. Se Cunha deixar o cargo um dia, nada impedirá que o processo de impeachment siga normalmente. Não é um processo pessoal, é impessoal.
AFP: O que o senhor acha da possibilidade de o governo e Cunha chegarem a um acordo para impedir a abertura do processo de impeachment e para que Cunha se mantenha em seu cargo?
HB: Isso é vergonhoso. É o sistema de toma lá, dá cá. É vergonhoso para um país que essa seja a política governamental.
AFP: Quais seriam os custos para o país se o governo vier a cair?
HB: Nenhum, ao contrário. É a maneira do Brasil passar a atuar dentro da ordem jurídica. Dizer que o impeachment é um golpe, não é um golpe. A Constituição diz que há um crime quando um presidente comete atos e fatos contra as leis. Está escrito que é crime e acabou. Quando houve o impeachment do Collor, não houve nenhum distúrbio maior no país. Porque o país tem instituições bastante sedimentadas. E todos sabem que Dilma não governa, e que o Brasil vai aos trancos e barrancos, fora de qualquer norma jurídica ou política aceitável.
AFP: Qual o papel que cabe aos partidos de oposição, como o PSDB, neste processo?
HB: Este não é problema partidário, é do Brasil.
AFP: Mas é um processo que está estreitamente vinculado a partidos políticos.
HB: Não estamos com esse partido, ou aquele partido. Estamos usando de uma atuação própria do cidadão brasileiro.
AFP: Como o senhor vê o PT agora?
HB: O PT passou a ser um partido para o exercício do poder. Era um partido que objetivava uma política a favor do Brasil, e não a favor do partido. Hoje o PT atua politicamente para benefício do PT. E ignora o Brasil como um todo. .