Jornal Estado de Minas

Sigilo bancário é quebrado por doação de R$ 25

Recém-formada em direito, R.S, de 25 anos, doou ano passado R$ 25 para a campanha da então candidata a presidente do Psol, Luciano Genro. Agora é acusada pela Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE) por doação ilegal e teve seu sigilo bancário quebrado por determinação da Justiça. Mesmo caso da agricultora L.B, 29 anos, que doou R$ 30 para Maria da Consolação, candidata não eleita a deputada federal, também do Psol, partido que veda doações de pessoas jurídicas. Essas ações são baseadas na legislação que impede as pessoas físicas de doar para as campanhas mais do que 10% de seus rendimentos declarados no Imposto de Renda (IR). Como as duas são isentas de IR – ou porque não têm renda ou porque ganham abaixo do limite que obriga o pagamento do imposto –, suas doações foram enquadradas como ilegais. Casos semelhantes aconteceram em outros estados, principalmente no Rio de Janeiro.


Por causa dessas pequenas quantias, principalmente se comparadas com as doações na casa dos milhões recebidas por diversos candidatos Brasil afora, as duas tiveram de contratar advogados e acabaram tendo de desembolsar bem mais do que a doação. Mas não é só isso que chateia as duas jovens. Além da despesa, da dor de cabeça e do constrangimento de receber, de surpresa, a visita de um oficial de justiça e terem de responder a um processo, elas acreditam que essas ações vão inibir as doações espontâneas, feitas por identidade ideológica.

“É uma forma de criminalização dos partidos com menos representação, que não recebem doações de grandes empresas e somente de pessoas físicas.
Não sabemos quais serão os critérios para o julgamento, e aí, por causa de uma doação de um valor irrisório, que não cobre nem as custas do estado com o processo, criminalizam diversas pessoas que não concordam com o financiamento empresarial de campanhas e tentam na doação militante apoiar partidos e candidatos que representam a sociedade e não empresas”, critica LO, moradora do Sul de Minas.

“Eu doei por ideologia. Pensei que deveria fazer a minha parte pelo que eu acredito e acabei sendo acusada em um processo. Agora, com aqueles que ganham e recebem milhões na campanha não acontece nada. Eu acho que isso vai acabar afastando os jovens da política e inibindo essas doações”, afirma S.R, que mora na Zona da Mata. Ela conta que ano passado, ainda estudante de direito, não tinha renda e vivia de mesada dos pais. Foi com esse dinheiro que doou para a campanha. Além disso, ela cita o custo dessas ações.
“Só o custo do oficial de justiça já representa mais da metade da minha doação”, critica.

Alerta

O presidente da Comissão Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Minas Gerais, Wederson Advincula, disse que está defendendo cerca de 100 clientes acusados de doação ilegal pelo mesmo motivo das de L.B e R.S. Segundo ele, todas elas são julgadas improcedentes pela Justiça Eleitoral. O advogado disse que alertou a PGE sobre esse problema. “Isso é um desserviço à democracia, afasta o cidadão de bem da política e mantém os que não cumprem a lei. Tinha que ter sido feita um diligência antes de entrar com a representação”.

O procurador-geral eleitoral, Patrick Salgado, disse que a Receita Federal cruzou os dados das doações com a renda declarada e elaborou uma listagem com os doadores supostamente irregulares que foi enviada para todos os estados. Foi a partir dessa listagem que as representações foram propostas. Mas, segundo ele, houve uma orientação expressa da PGE para que as doações de baixo valor de pessoas isentas não fossem alvo de ação. Salgado garante que em Minas foram poucos casos e os que chegaram na Justiça estão sendo rejeitados.
A orientação, de acordo com o procurador, foi para que, em caso suspeita de doações formiguinhas (grupo grande de pessoas que assumem ter doado pequenas quantias para despistar doações vultuosas ilegais), elas fossem enviadas para a PGE apurar. “Mas os promotores tem autonomia para agir”..