Brasília - Depois de dois dias de expectativas, prevaleceu a lógica e o deputado Fausto Pinato (PRB-SP) foi escolhido relator do processo no Conselho de Ética que pode culminar com a cassação do mandato do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). A partir de hoje, Pinato terá 10 dias úteis para entregar um relatório preliminar sobre a admissibilidade da representação feita pelo PSOL e pela Rede. A próxima reunião do Conselho de Ética está marcada para o dia 24. Parlamentar de primeiro mandato, Pinato garantiu que está preparado para assumir o desafio de relatar “o processo mais delicado da história da Casa”. Jamais um presidente da Câmara foi processado no exercício do cargo. A situação mais próxima ocorreu com o processo movido contra o ex-deputado João Paulo Cunha (PT-SP) por envolvimento no mensalão. Mas, quando ele foi julgado por seus pares, não estava mais no comando da Câmara.
“Sou independente. É meu primeiro mandato e isso pesa a meu favor, pois quem tem muitos mandatos também tem muitas relações”, destacou ele. Pinato assegurou também que o partido dele, o PRB, deixou-o bastante à vontade para exercer a relatoria. “O senhor Eduardo Cunha vai ser julgado como um deputado comum, e não como presidente da Câmara. Eu me torno um juiz que deve ter imparcialidade e julgar conforme as provas dos autos”, ressaltou. No relatório preliminar que será apresentado no dia 24, Pinato não precisará analisar o mérito das acusações que pesam contra Cunha, atendo-se apenas à admissibilidade do processo. O parlamentar deu a entender — informação confirmada por lideranças expressivas do partido dele — de que a denúncia será aceita.
“Vamos usar argumentos técnicos. Eu não tenho convencimento formado ainda; vamos estudar, mas, pelo que estamos sabendo pela imprensa, existe uma grande possibilidade de eu aceitar a denúncia. Assim que estiver com o processo em mãos, vou buscar provas documentais, abrindo o direito de ampla defesa e atendendo a requerimentos de colegas, que também poderão sugerir conjuntos probatórios”, explicou. Integrantes da bancada do PRB ressaltaram, contudo, que é preciso buscar mais provas para embasar o processo já que a representação protocolada no Conselho de Ética ampara-se, basicamente, em notícias de jornal. Pinato já sinalizou que requisitará documentos que embasam a investigação junto ao Supremo Tribunal Federal, ao Ministério Público Federal e à Polícia Federal.
Escolha acertada
O presidente do Conselho de Ética da Câmara, José Carlos Araújo (PSD-BA), acredita ter feito uma escolha acertada ao optar por Pinato — os dois outros concorrentes eram Zé Geraldo (PT-PA) e Vinicius Gurgel (PR-AP). O primeiro poderia sofrer pressão da cúpula do partido e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que, receosos quanto ao poder de Cunha de dar andamento aos processos de impeachment contra Dilma, defendem uma postura mais branda contra o peemedebista.
Já Vinicius Gurgel é ligado a Cunha, tendo sido, inclusive, coordenador da campanha do parlamentar fluminense à presidência da Câmara, em fevereiro. Existem, inclusive, fotos com o deputado do PR ao lado de Cunha celebrando a vitória no início do ano. “Eu não tinha como inventar muito. Eu não posso entrar em um restaurante de comida japonesa e pedir uma massa. Três nomes foram sorteados, decidi por aquele que considerei mais preparado para cumprir a missão”, disse José Carlos Araújo. Mais cedo, Araújo afirmou que Pinato “é um jovem advogado e foi assessor de dois ex-parlamentares nesta Casa”. Acrescentou que ele “pertence a um partido que não é muito grande, mas que o PRB garantiu que não vai interferir em hipótese alguma. Tenho certeza de que ele vai fazer justiça no processo”. Cunha manteve a indiferença demonstrada nos últimos dias em relação à escolha do relator: “Para mim é indiferente qualquer um dos escolhidos”.
Carona de Russomano
Confirmado relator do processo contra Cunha, Pinato está em seu primeiro mandato como parlamentar e conseguiu uma cadeira na Casa com apenas 22 mil votos. A escolha do PRB como a legenda a se filiar foi pragmática: Pinato acreditou que o partido seria aquele com as melhores condições para se eleger em outubro do ano passado. A aposta foi acertada, já que o atual líder do PRB na Casa, Celso Russomanno (SP), conquistou 1,5 milhão de votos — a maior votação do país —, puxando outros candidatos com base no quociente eleitoral. Antes de se filiar ao PRB, Pinato era do PPS, mas jamais disputou qualquer eleição. Ele projetou-se para a política em 2011, quando denunciou ao Ministério Público o então prefeito de Fernandópolis (SP), Luiz Vilar de Siqueira (DEM). A acusação era de que o prefeito teria realizado licitações irregulares durante o mandato. Pinato responde a uma ação no STF por falso testemunho. Duas testemunhas trazidas em um processo por Pinato recuaram em suas declarações e o deputado acabou processado.