São Paulo, 21 - O ex-coordenador jurídico da Petrobras Thales Rodrigues de Miranda, que participou das negociações nos Estados Unidos para a compra da primeira metade da refinaria de Pasadena, em 2006, afirmou ao jornal O Estado de S. Paulo que houve orientação do "Rio" - em referência à sede da estatal - para aceitar as polêmicas cláusulas do contrato e omiti-las do Conselho de Administração da estatal. Miranda se recusou a assinar os termos do polêmico acordo com a empresa belga Astra Oil, então proprietária da outra metade do empreendimento.
Em 2014, o advogado publicou um texto em seu perfil no Facebook, que foi encontrado pelos investigadores da Lava Jato no computador de Jorge Zelada, ex-diretor de Internacional da Petrobras preso na operação, em que dizia que pagou "um preço alto por esta decisão". "Ter que sofrer tudo que sofri na pele por ter me recusado a assinar o parecer jurídico que respaldava a compra da refinaria de Pasadena pela Petrobras foi duro", afirma Miranda em um trecho da publicação.
Ao Estado, o advogado, que deixou a estatal em 2013, segundo ele, após pressões, confirma o teor de seu desabafo e conta que o parecer jurídico encaminhado ao Conselho de Administração da Petrobras não falava nada sobre a multa de 20% na cláusula put option - que previa que a estatal tinha que comprar a outra metade da refinaria em caso desentendimento com a Astra Oil.
De acordo com Miranda, já no primeiro encontro com os executivos da Astra Oil nos Estados Unidos, em 2005, houve uma “guerra de minutas” sobre qual versão do contrato da compra seria definida entre a Petrobrás e a Astra Oil. "Nós levamos a nossa minuta, chegando lá mudaram a minuta e não fizemos nada, falaram que tinha ordem do Rio (em referência à sede da Petrobras) para usarmos a minuta da Astra, e não a da Petrobras", relata.
Mesmo sem saber detalhar exatamente de quem veio a ordem, ele conta que, dentro da Petrobras, sofreu pressão da diretoria Internacional - cujos ex-funcionários foram alvo da 20.ª etapa da Lava Jato, na segunda-feira passada, sob suspeita de terem recebido R$ 6 milhões de propina no negócio - ao apontar os problemas no contrato proposto pela companhia belga.
"Não sabia que havia esse nível todo de envolvimento de corrupção. Fui avisando, 'olha tá errado isso vai dar merda', e as pessoas batendo em mim e eu não entendendo o porquê. Na época não conseguia captar que estava todo mundo envolvido", diz ele, que foi deslocado de área, sendo mandado para o jurídico da estatal na Argentina e depois para Gerência de Finanças Corporativa, após o acerto da compra da primeira metade da refinaria, em 2006.
Em 2013, após tirar licença médica, ele pediu demissão da estatal, onde entrou como concursado para a Braspetro - posteriormente incorporada à área Internacional da Petrobras - em 2001.
Cláusula
Ao analisar o contrato sugerido pela Astra o então coordenador jurídico diz que logo percebeu que havia algo incomum na chamada cláusula put option. "O que eles (Petrobras) estão toda hora enfatizando é que essa cláusula de put option é normal nos contratos, sim ela é normal nos contratos internacionais. Essa multa de 20% em cima é que não é", diz o advogado.
Miranda diz que conversou sobre os 20% com seu superior, o gerente-jurídico Internacional, Carlos Cesar Borromeu. "Essa foi uma das coisas que discutimos, que eu achava que deveria estar no parecer e não estava", relata. "Quem produziu o parecer foi o Carlos Cesar, eu simplesmente avisei que teria que ser dito (sobre a multa de 20%), mas ele disse que não precisava, que seria um detalhe. Ai eu disse 'toma aí, você assina, você faz o que você quiser'."
A investigação sobre o caso foi encaminhada ao juiz Sérgio Moro, responsável pela Lava Jato, e por meio de delações, lobistas e ex-executivos da estatal confirmaram que houve o acerto de propinas no negócio para atender "compromissos políticos". Diante disso, foi deflagrada a 20.ª etapa da operação, que determinou buscas e apreensões nos endereços de ex-funcionários da estatal envolvidos no negócio. Miranda não foi citado por nenhum delator como destinatário de propinas e não foi alvo da operação.
Procurada pela reportagem, a assessoria da Presidência da República afirmou que não comenta investigações em andamento. A reportagem também encaminhou um e-mail à Petrobras, mas não obteve retorno até a conclusão desta reportagem.
Em depoimento à CPI Mista da Petrobras no ano passado, Borromeu negou irregularidades no acordo de compra de Pasadena. As informações são do jornal
O Estado de S. Paulo.