Em apenas duas conversas secretas – uma em setembro e outra no último dia 4 –, o senador Delcídio Amaral (PT-MS), o advogado Edson Ribeiro, o chefe de gabinete do senador, Diogo Ferreira, e o filho do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, Bernardo Cerveró, arquitetaram pelo menos seis crimes previstos na legislação brasileira: facilitação de fuga de pessoa legalmente presa, tráfico de influência, corrupção ativa e passiva, prevaricação, comunicação falsa de crime e constituição de organização criminosa. Isso sem contar a tentativa de obstrução da Justiça, que motivou a autorização da prisão de Delcídio, Ribeiro e Ferreira na última quarta-feira. Em relação a Delcídio, a decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) foi referendada pelo plenário do Senado.
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Também foi discutida pelo grupo a possibilidade de a Justiça solicitar um novo pedido de prisão para Nestor Cerveró depois da fuga, caso em que o advogado Edson Ribeiro diz que faria um discurso político em que alegaria que o cliente foi alvo de “tortura e tudo mais”. Essa estratégia poderia ser enquadrada em comunicação falsa de crime, artigo 340 do Código Penal, com pena prevista de detenção de um a seis meses ou pagamento de multa.
O tráfico de influência – que se resume a solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função – pode ser encontrado em duas situações: quando Delcídio afirma ter contato com alguns ministros do STF e que poderia tentar um habeas corpus para Nestor Ceveró; e quando discutem a possibilidade de indicar um nome para a gerência de Tecnologia e Inovação da Petrobras, órgão que tem orçamento de R$ 1 bilhão.
PROPINA Ao oferecer uma mesada de R$ 50 mil para a família de Nestor Cerveró para que ele omitisse informações na Operação Lava-Jato, o senador Delcídio Amaral não teria cometido nenhum crime. Mas se o valor fosse aceito pelo filho do delator, Bernardo Cerveró, poderia ser configurada a prevaricação, prevista no artigo 319 do Código Penal. O texto prevê pena de detenção de três meses a um ano e multa para quem retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal.
O diálogo do grupo demonstra claramente que o banqueiro André Esteves – preso na quarta-feira pela Polícia Federal – tem uma cópia de minuta de anexo do acordo de delação premiada assinada por Nestor Cerveró, o que demonstra um canal de vazamento da Operação Lava-Jato. Caso a informação seja verdadeira e o documento tenha sido negociado com um funcionário público em troca de benefício, trata-se de corrupção passiva, que é aquele ato ilegal praticado em troca de vantagem indevida. Já o banqueiro poderia ser enquadrado em corrupção ativa, que é oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público para que ele pratique, omita ou retarde ato de ofício. As duas modalidades são punidas com reclusão de dois a 12 anos e multa.
ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA Embora os especialistas tenham alertado que é preciso mais dados para avaliar a possibilidade do crime de organização criminosa, o teor das conversas traz evidências do delito, que está previsto na Lei 12.850/13 e é classificado como a associação de quatro ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais que tenham penas máximas superiores a quatro anos ou que tenham caráter transnacional.
As gravações das conversas foram feitas por Bernardo Cerveró e entregues à Procuradoria Geral da República por ele próprio. Ele disse aos procuradores ser contra os planos, especialmente a fuga de Cerveró, mas parece concordar para não “constranger” os demais participantes.
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