Brasília - Ministros do governo trabalham para constranger o vice-presidente Michel Temer (PMDB) a se solidarizar publicamente com a petista durante a tramitação do processo de impeachment. A estratégia ficou evidente nessa quinta-feira (3) quando aliados de Dilma e de Temer deram versões conflitantes sobre o primeiro encontro de ambos após o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ter anunciado que daria prosseguimento a um pedido de afastamento da petista.
Enquanto auxiliares da presidente se anteciparam a divulgar que o peemedebista “assumiu o compromisso” de estar junto com Dilma “na defesa da legalidade e da instabilidade institucional do país”, aliados do vice diziam que ele se limitou a recomendar à presidente uma “postura institucional”, evitando o conflito com Cunha para “não aprofundar a crise já posta”.
Até mesmo a duração do encontro foi motivo de divergência. O Palácio do Planalto divulgou que a reunião durou toda a manhã, enquanto pessoas próximas a Temer diziam que os dois estiveram juntos por apenas 30 minutos.
O ministro Jaques Wagner (Casa Civil), porém, negou que Temer tenha sugerido a Dilma não entrar em conflito público com Cunha. “Eu estava presente na conversa inteira e não vi essa citação do vice-presidente”. Wagner aproveitou para dizer que Temer tem “uma longa trajetória de ser democrata e constitucionalista”. O PT e a própria presidente Dilma têm chamado de “golpe” a instauração do pedido de afastamento.
“Assim como nós, Temer não vê nenhum lastro para esse processo de impeachment”, completou o ministro. À noite, Temer desmentiu Wagner, por meio de sua assessoria, afirmando que não afirmou que não havia lastro para o afastamento da petista. “Eu não disse isso em momento algum da minha conversa com a presidente”.
Prevendo o afastamento do vice que reuniu-se com senadores da oposição às vésperas de Cunha anunciar que aceitaria o pedido de afastamento de Dilma, o governo passou a tentar levar Temer para o núcleo decisório do Planalto, com o argumento de que ele “precisa defender um governo que é dele”.
A ação é chancelada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que, diante do afastamento de Temer das articulações políticas do governo, defendeu junto a Dilma que o vice tivesse mais importância no governo. Lula chegou a incentivar que o vice ocupasse o Ministério da Justiça no lugar de José Eduardo Cardozo.
Ontem, durante evento no Rio de Janeiro, Lula atacou Cunha. “A tarefa maior neste instante é não permitir que essa loucura que o Eduardo Cunha fez tenha prosseguimento. Precisa decidir isso logo. Se a gente for esperar passar Natal, passar fevereiro, passar o carnaval, qual será o clima político neste país? Qual investidor vai querer investir no Brasil? Qual empresário brasileiro vai querer colocar dinheiro na economia?”, disse Lula.
Estratégias
Acatando ou não o conselho de Temer, a petista sentou-se nessa quinta-feira (3) com os ministros da coordenação política do governo para discutir estratégias contra o processo. Segundo na linha sucessória, Temer justificou sua ausência no encontro pela agenda previamente marcada em São Paulo. Ele viajou ontem pela manhã, logo após conversar com a presidente e só deve retornar na terça-feira. Mesmo longe, o peemedebista deve continuar nas articulações políticas. Após a deflagração do impeachment, o Palácio do Planalto adotou uma postura de que Temer é jurista, constitucionalista e pode ajudar nas relações com o Congresso.
Na quarta-feira à noite (2), Temer recebeu no Palácio do Jaburu o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e os senadores Romero Jucá (PMDB-RR), Eunício Oliveira (PMDB-CE), Valdir Raupp (PMDB-RO), além de Henrique Alves (PMDB-RN) e Hélder Barbalho. No jantar, ele reforçou pedidos de cautela. O peemedebista não quer que o momento seja acirrado pelos senadores e recomendou se manterem na retaguarda. Inevitavelmente, alguns parlamentares da oposição confirmaram apoio ao vice caso ele seja conduzido ao cargo numa suposta saída da presidente. Temer, porém, evita o tema e alega não querer concorrer em 2018, seguindo a trajetória de Itamar Franco após a saída do ex-presidente Fernando Collor, em 1992.