Em pelo menos três situações em que foram chamados a definir o mecanismo de votações no Legislativo – seja ele nacional ou estadual – os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) adotaram posturas diferentes. Há 23 anos, o processo envolvendo o afastamento do então presidente e hoje senador Fernando Collor de Mello também foi parar no Judiciário. Naquela ocasião, Collor ajuizou um mandado de segurança para tentar assegurar mais prazo para a apresentação da sua defesa e para que a votação do impeachment fosse feita pelo voto secreto.
Os parlamentares haviam decidido que a votação seria aberta – o que pavimentaria à perda do mandato dele, já que se tratava de um momento em que o presidente tinha baixa popularidade e estava envolvido em várias denúncias de corrupção. O entendimento dos ministros não foi unânime, mas prevaleceu a tese da autonomia do Congresso Nacional em decidir qual seria o mecanismo de votação, caso a Constituição não trouxesse a regra. De fato, os artigos da Constituição nada diziam sobre o processo de perda de mandato de um presidente, apenas de deputados e senadores, em voto secreto (regra que foi alterada em 2013). Em 1992, Collor tentou adotar a regra para si por analogia, mas foi vencido.
“Os requisitos de validade da denúncia, o modo como é ela recebida, sua leitura, a nomeação de Comissão Especial e a decisão do plenário são formalidades que podem estar previstas na Constituição, em leis ou no Regimento Interno. Se a Constituição, a lei ou o Regimento Interno, no espaço que lhes está reservado pela Constituição, estabelece um procedimento a ser atendido, não fica a critério da autoridade, do órgão, ou do Poder, observá-lo. Entendimento em sentido contrário, valeria pela negação do Estado de Direito e pela instauração do regime do arbítrio”, diz trecho do acórdão do processo.
Recentemente, tema semelhante voltou ao STF. Desta vez a discussão se deu em torno da prisão do senador Delcídio Amaral, ocorrida no último dia 25, sob a acusação de tentar atrapalhar as investigações da Operação Lava-Jato. O ministro Edson Fachin determinou que a votação no Senado para definir se ele deveria ser libertado fosse aberta porque o artigo 53 da Constituição Federal não traz esse tipo de caso entre aqueles que devem ter voto secreto. Emenda aprovada há dois anos prevê a modalidade apenas para a apreciação de vetos, eleição da Mesa Diretora e indicação de nomes para cargos públicos.
Com esse mesmo entendimento, o ministro concedeu liminar suspendendo a sessão plenária que elegeu os integrantes da Comissão Especial que discutirá a abertura do processo de impeachment da presidente Dilma. Embora artigo do Regimento Interno do Senado estabeleça o sigilo na votação de casos como o de Delcídio, para o ministro, o princípio da publicidade sempre deve prevalecer. “Sendo assim, não há liberdade à Casa Legislativa em estabelecer, em seu regimento, o caráter secreto dessa votação. Em havendo disposição regimental em sentido contrário, sucumbe diante do que estatui a Constituição como regra”, decidiu Fachin.
Sergipe
Em julho do ano passado, os ministros também se viram diante de outra polêmica envolvendo o voto secreto, mas desta vez a analogia foi aceita. Tratava-se da eleição de Susana Maria Fontes Azevedo para conselheira do Tribunal de Contas de Sergipe. Ela foi escolhida por votação secreta, mecanismo que foi questionado judicialmente. Ao decidir a questão, o ministro Ricardo Lewandowski entendeu que a regra prevista na Constituição sergipana não fere a Constituição Federal.
“Entendo que, não tendo a Constituição Federal estabelecido expressamente a forma de votação para os indicados ao Tribunal de Contas pelo próprio Legislativo, o escrutínio secreto não afronta o texto constitucional, uma vez que é o mesmo tipo de votação utilizado para aprovar os conselheiros indicados pelo chefe do Executivo”, afirmou o ministro em sua sentença. No caso em questão, o deputado estadual Belivaldo Chagas Silva recorreu à Justiça com a alegação de que a votação seria inconstitucional porque o voto secreto é previsto apenas quando a indicação para o TCE couber ao governador.