Brasília - No pedido de afastamento de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) do cargo de deputado federal, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresenta indícios de pagamento de propina em troca da aprovação de outra operação do FI-FGTS, o bilionário fundo de investimento gerido pela Caixa com dinheiro dos trabalhadores. Trata-se do aporte de R$ 571 milhões para empresa de energia eólica do Grupo Rialma, que pertence a Emival Caiado, primo do senador Ronaldo Caiado (DEM-GO). O valor correspondia a 49% da empresa.
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Cunha transformou a Câmara em um "balcão de negócios", diz JanotCunha fez "manobras espúrias" para obstruir Conselho de Ética, diz JanotPrisão preventiva de Cunha foi afastada "em um primeiro momento", destaca JanotCaiado: delação de Cerveró mostra 'digitais' de Dilma em esquema da PetrobrasMP investiga venda de rádio de CunhaDefesa de Cunha terá como foco recursos para mudar decisão do Conselho de Ética"Em outras palavras: a anotação indica que Eduardo Cunha e Fábio Cleto cobraram propina em troca de liberação de verbas do FI-FGTS", afirma Janot. A anotação da agenda chegou à PGR no dia 9 de dezembro deste ano por meio de informações da Justiça do Rio de Janeiro em meio à "Operação Alcateia Fluminense", que apura fraudes na Receita no Rio de Janeiro.
Janot cita reportagem do jornal O Estado de S. Paulo de outubro do ano passado, quando houve o primeiro aval para o aporte do fundo na usina. O comitê de investimento do FI-FGTS faz reuniões fechadas, cujo teor não é divulgado à imprensa. O jornal já ressaltava a influência de Cleto no comitê, onde pediu retirada de projetos de pauta e aprovações de outros itens como "moeda de troca" com o governo.
Segundo Janot, a anotação coloca Cleto e seu padrinho Cunha em situação "muito semelhante" aos fatos narrados pelos delatores Ricardo Pernambucano e Ricardo Pernambucano Junior.
A propina paga a Cunha tinha como finalidade a aprovação de uma operação que permitiu levantar recursos de uma vez só para a revitalização do Porto Maravilha, no Rio de Janeiro. O consórcio responsável pelas obras recebeu R$ 3,5 bilhões de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), a poupança forçada que todo trabalhador brasileiro é obrigado a fazer.
Os dados levantados pela PGR indicam que Cunha vendia "facilidades" na Caixa porque tinha o aliado Fábio Cleto como braço-direito no banco estatal. Ele atuava de acordo com os interesses do parlamentar, mesmo quando esses iam de encontro ao que queria o governo. Foi o próprio presidente da Câmara, segundo o relato dos dois delatores, que acertou e cobrou a propina.
A Carioca Engenharia é sócia da Odebrecht e da OAS na concessionária Porto Novo, responsável pela revitalização da zona portuária do Rio. Em abril de 2011, um fundo imobiliário de gestão da Caixa comprou o lote todo de títulos da região portuária e desembolsou de uma vez R$ 3,5 bilhões de dinheiro dos trabalhadores.
A operação tinha como objetivo financiar as obras na região, estimadas em R$ 7,5 bilhões - o restante seria levantado pela Caixa com a revenda de papeis no mercado para os interessados nos imóveis comerciais da região.
Cleto sempre foi considerado "o cara de Cunha" na Caixa. A presidente Dilma o exonerou na semana passada. A informação era de que se tratava de uma retaliação ao presidente da Câmara, que aceitou o pedido de impeachment contra a petista. Na semana seguinte, porém, foi autorizada operação de busca e apreensão na casa de Cleto, em São Paulo, e surgiram novos indícios da ligação dele com o presidente da Câmara.
Para a PGR, o pagamento de suborno a Cunha e Cleto para a aprovação de projetos no FI-FGTS também é confirmada com as mensagens de "negociações ilícitas envolvendo liberação de verbas do fundo" encontradas no celular do ex-diretor da OAS, Leo Pinheiro.
Janot cita outra matéria do jornal O Estado de S. Paulo sobre a pressão do Cunha para emplacar o afilhado na vice-presidência da Caixa responsável pela gestão do FI-FGTS, justamente para ampliar a influência dele no fundo.
Em nota, a Caixa informou que a operação com o consórcio Porto Novo seguiu "todos os ritos normativos e de governança corporativa" do banco, passando por diversos comitês internos. O banco diz que determinou à corregedoria da instituição a instauração de apuração de todas as operações realizadas no projeto de revitalização do Porto Maravilha. Questionado, Cunha disse que não comentaria porque não leu a acusação..