Eduardo Cunha divide a bancada feminina

Deputadas não têm consenso sobre cassação do mandato do presidente da Câmara, mas, nas ruas, mulheres protestam contra projetos como o que dificulta aborto legal

Marcella Fernandes
Mulheres já foram às ruas várias vezes criticar o projeto que restringe o atendimento médico às vítimas de estupro e dificulta o aborto legalizado - Foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press - 5/11/15

Brasília – Diante da demora dos parlamentares em assumir um posicionamento contrário ao presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, as primeiras vozes a defenderem com força o “Fora, Cunha” foram femininas e partiram das ruas. A aprovação do PL  6.059 na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), em 21 de outubro, provocou uma onda de manifestações de mulheres contra o peemedebista em diversas cidades, em um misto de indignação contra a proposta dele que limita o acesso ao aborto legal, inclusive proíbe a pílula do dia seguinte, e com as denúncias de corrupção e lavagem de dinheiro do parlamentar investigado na Operação Lava-Jato. Dentro da Câmara, por sua vez, o enfrentamento feminino a Cunha é disperso.

 

A bancada feminina não tem um posicionamento oficial sobre o afastamento do parlamentar. O assunto nem sequer chegou a ser discutido nas reuniões semanais. Na avaliação de deputadas ouvidas pela reportagem, a atuação de aliadas do peemedebista, a influência partidária e a diversidade do grupo – são 53 parlamentares de 18 siglas – impedem que a questão avance. Hoje, o grupo só tem um entendimento unificado em torno do combate à violência contra a mulher e na luta pelo aumento da participação feminina na atividade parlamentar. Ainda assim há opiniões distintas quanto às formas de enfrentamento a essas questões, tanto pela influência das legendas quanto por posições pessoais e religiosas.

No caso do PL 6.059, parte considera a mudança proposta um ato de violência por se tratar de métodos abortivos em casos de estupro, mas algumas deputadas são radicalmente contra qualquer tipo de interrupção da gravidez. A proposta uniu parlamentares de orientações políticas opostas, como Erika Kokay (PT-DF) e Cristiane Brasil (PTB-RJ).

“As manifestações nas ruas e nas redes sociais foi muito importante como suporte na Câmara. Somos muito poucas, e os deputados estavam escarnecendo, rindo das mulheres lá dentro, acusando as deputadas que não querem que as vítimas de violência percam direitos fundamentais de serem contra a vida”, conta Cristiane Brasil.

IMPOSIÇÃO Para Erika Kokay a interferência de Cunha nos critérios de distribuição dos cargos de chefia em fevereiro contribuiu para fragilizar o grupo. Antes, havia autonomia nas definições da Coordenação e da Procuradoria, estruturas da Secretaria da Mulher. Neste ano, o peemedebista decidiu que os cargos seriam divididos de acordo com os blocos montados na eleição para o comando da Casa, o que favoreceu o seu partido. Foi a primeira vez que a presidência da Câmara interveio no assunto. “Esse direito foi usurpado pelo presidente que se sente no direito de interferir em assuntos diversos”, critica.

No início do ano, foi decidido que a bancada só se pronunciaria quando houvesse consenso. Apesar de respeitar a decisão, a deputada Clarissa Garotinho (PR-RJ) acredita que deveria partir do grupo uma posição de “Fora, Cunha”. “A bancada deveria ser mais politizada e se posicionar mesmo quando não houvesse consenso”, defende. Opositora do peemedebista, ela tem feito duros discursos em plenário, além de ter pedido a renúncia do parlamentar durante um protesto na Câmara em outubro.

Única mulher no Conselho de Ética, a deputada Eliziane Gama (Rede-MA) considera que seu voto tem peso diferente por esse motivo. “É uma responsabilidade política dupla, porque se reflete em todo o grupo de mulheres”, afirmou. Ela é uma das que assinaram o pedido de afastamento do peemedebista em agosto. Procurada pela reportagem, a deputada Dâmina Pereira (PMN-MG), coordenadora da bancada feminina, afirmou via assessoria de imprensa que não se pronunciará sobre o tema.

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