"Não há lugar, na América do Sul do século XXI, para soluções políticas fora da institucionalidade e do mais absoluto respeito à democracia e ao Estado de Direito", avisou o Brasil, em nota distribuída nesta terça-feira, 5, à tarde, pelo Ministério das Relações Exteriores.
A carta foi aprovada pelo Palácio do Planalto, em resposta à tentativa dos governantes chavistas de tentar impugnar a posse de alguns deputados eleitos pela oposição ao Tribunal Supremo de Justiça, no qual a maioria dos juízes foi nomeada pelo governo venezuelano e dificilmente toma decisões contrárias aos interesses de Nicolás Maduro.
"Como afirmou em outras ocasiões, o governo brasileiro confia que será plenamente respeitada a vontade soberana do povo venezuelano, expressada de forma livre e democrática nas urnas", disse o Itamaraty.
O governo brasileiro tinha comemorado o fato de Nicolás Maduro, em um primeiro momento, ter aceito e respeitado o resultado das eleições de dezembro, que deu vantagem à oposição venezuelana no Parlamento daquele País. Mas ficou perplexo e muito preocupado com os últimos atos ocorridos, que culminaram com as ações dos chavistas comandadas por Maduro.
O Brasil, então, decidiu se posicionar de forma dura, de imediato, para repudiar as tentativas de manobras jurídicas dos chavistas, mostrando que é contra este tipo de atitude. O assessor internacional do Palácio do PLanalto, Marco Aurélio Garcia, conhecido por sua simpatia aos bolivarianos, também defendeu o duro tom da nota do governo da presidente Dilma Rousseff.
Apesar de Maduro aparentemente ter reagido como se tivesse acatado o resultado das eleições e ter mandado sinais ao Brasil de que entendera o recado do vizinho em relação à manutenção de práticas democráticas e respeito às urnas, ainda em dezembro, começou a adotar atitudes que acenderam uma luz amarela em Brasília.
Além da tentativa de impugnação impetrada pelo Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), o chavismo também apressou a aprovação de leis nos últimos dias nos quais ainda estava vigorando a Lei Habilitante, aprovada pelo Congresso anterior, de maioria chavista, que permitia a Nicolás Maduro governar por decreto até 31 de dezembro, em temas econômicos. Com isso, uma das últimas medidas do presidente foi retirar do Legislativo o poder de nomear parte dos diretores do Banco Central da Venezuela (BCV).
A nota do Itamaraty traz um recado de repúdio a estas manobras quando diz que "o governo brasileiro confia, igualmente, que serão preservadas e respeitadas as atribuições e prerrogativas constitucionais da nova Assembleia Nacional venezuelana e de seus membros, eleitos naquele pleito".
Ainda segundo a nota, o governo brasileiro "insta todos os atores políticos venezuelanos a manter e aprimorar o diálogo e a boa convivência, que devem ser a marca por excelência das sociedades democráticas". O Itamaraty lembrou ainda que "a lisura da votação do dia seis de dezembro", na qual a oposição obteve a maioria qualificada da Assembleia Nacional, e que contou com expressiva participação dos eleitores, foi atestada pela Missão Eleitoral da União de Nações sul-americanas (Unasul), validada pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE).
Esta é a segunda nota que o Brasil divulga atacando o governo Maduro em pouco mais de um mês. A primeira foi em 27 de novembro, quando, em texto cuidadosamente escrito e aprovado pessoalmente pela presidente Dilma Rousseff, o governo brasileiro condenou, com veemência, a morte do político oposicionista venezuelano Luís Díaz, secretário-geral do partido Ação Democrática (AD), assassinado durante um comício, e cobrou das autoridades da Venezuela a necessidade de "investigar os fatos e punir os responsáveis", para que as eleições marcadas para o dia seis de dezembro, transcorressem de forma "limpa e pacífica".
Quando o novo presidente da Argentina, Maurício Macri, foi eleito e anunciou que iria questionar a presença da Venezuela no Mercosul, por estar violando cláusulas pétreas de democracia que regem o bloco, o Brasil foi contrário à iniciativa. Na reunião do Mercosul, em 21 de dezembro, no Paraguai, a presidente Dilma Rousseff fez um discurso entendido como conciliador, já que se congratulou com Macri e elogiou o processo democrático venezuelano.
Um interlocutor da presidente ressalvou, no entanto, que talvez os venezuelanos tenham entendido, erroneamente, que as falas de Dilma foram de apoio a Maduro.