Uma joia loteada

Veja como funcionou o esquema de nomeações que tomou conta da Petrobras

Levantamento do Estado de Minas demonstra que, a partir de 2009, o senador e ex-presidente da República Fernando Collor (PTB-AL) conseguiu emplacar apadrinhados em três das quatro principais diretorias da empresa

Marcelo da Fonseca
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Com uma receita operacional que gira em torno de R$ 80 bilhões – envolvendo a distribuição de combustíveis em mais de 7,5 mil postos – e um lucro líquido acima de R$ 3,2 bilhões entre 2013 e 2014, a BR Distribuidora é um alvo cobiçado por partidos políticos. Assumir sua presidência ou mesmo uma de suas quatro diretorias representa um passo importante para conquistar poder e influência em todas as regiões do Brasil. Os quatro diretores e o presidente têm em suas canetas o poder para indicar cerca de 1 mil nomes para trabalhar na empresa sem a necessidade de concurso público. A denúncia do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que veio à tona na semana passada e está sob análise do ministro Teori Zavascki, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), passa a limpo como funcionou o esquema de nomeações com interesses políticos e financeiros que tomou conta da empresa.


Levantamento do Estado de Minas com os nomes que ocuparam os principais cargos da BR Distribuidora nos últimos 10 anos demonstra que, a partir de 2009, o senador e ex-presidente da República Fernando Collor (PTB-AL) conseguiu emplacar apadrinhados em três das quatro principais diretorias da empresa. Na subsidiária da Petrobras, os cargos foram ocupados por funcionários de carreira – a maioria deles com mais de duas décadas na empresa –, no entanto, para ocupar as cadeiras mais altas, foram necessárias indicações de partidos políticos e de ministros influentes no Palácio do Planalto.

Desde o segundo mandato do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o senador Fernando Collor passou a integrar a base aliada do governo federal. Em 2010, após ser derrotado na disputa pelo governo de Alagoas em primeiro turno, o ex-presidente declarou apoio ao ex-governador Ronaldo Lessa (PDT) no segundo turno – que disputava com Teotônio Vilela Filho (PSDB) – e à presidente Dilma Rousseff (PT). “Não se esqueçam, o voto é Dilma para presidente e Lessa para governador, para recuperarmos a esperança de futuro”, disse Collor durante a campanha eleitoral. A aproximação do alagoano com o Planalto gerou insatisfação dentro do PT, mas as críticas foram controladas.

Menos de um ano antes, em 2009, Collor e seu partido, PTB, apoiariam pela primeira vez nomes para a BR Distribuidora.

Foram indicados Luiz Cláudio Caseira Sanches, para a Diretoria de Rede de Postos e Serviços, e José Zonis, para a Diretoria de Operações e Logística. A nomeação de pessoas ligadas ao ex-presidente Collor foi motivo de ataques durante a disputa eleitoral de 2010, com o candidato José Serra (PSDB) criticando a postura do PT de entregar cargos para um político destituído do Planalto “por atos de corrupção”.

Os dois primeiros nomes indicados por Collor para a distribuidora foram alvo da Operação Politeia, desdobramento da Lava-jato, em julho do ano passado, e afastados do quadro de funcionários da empresa. Os envolvidos foram citados em delações do empreiteiro dono da UTC, Ricardo Pessoa, e do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa como integrantes de um esquema de pagamentos de propinas acima de R$ 20 milhões. Antes, em 2013, Zonis e Sanches já tinham sido destituídos das diretorias, mas foram substituídos por outros nomes indicados também por Collor e pelo PTB: Luis Alves de Lima Filho, na Rede de Postos e Serviços, e Vilson Reichemback Silva, para Operações e Logística.

Os novos indicados também foram alvo de investigações da Polícia Federal (PF) e deixaram os cargos de diretores da BR Distribuidora em 2015. Além de Reichemback e Alves de Lima, o diretor de Mercado Consumidor, Andurte de Barros Duarte, aparece na lista de envolvidos delatados pelos operadores do esquema como beneficiários das propinas. Andurte teria sido uma indicação da bancada do PT na Câmara, sendo apoiado pelo deputado Cândido Vacarezza (PT).

O último nome ligado ao ex-presidente Collor a deixar a BR Distribuidora foi José Lima de Andrade Neto, que ocupou o principal cargo da empresa por seis anos – desde agosto de 2009 até setembro de 2015. Na época, ele foi indicado com o apoio do então ministro de Minas e Energia, Edison Lobão (PMDB). Ao renunciar à presidência da distribuidora, em setembro, Andrade Neto apresentou como justificativa motivos de saúde. Segundo levantamento do jornal O Estado de S. Paulo, Andrade Neto se encontrou com Collor em seu gabinete no Senado por cinco vezes desde que assumiu a presidência da BR.

‘ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA’
Segundo a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), entre 2010 e 2014, foi criada “uma organização criminosa preordenada principalmente ao desvio de recursos públicos em proveito particular”. O documento integra uma peça protocolada no STF contra o deputado federal Vander Loubet (PT-MS), acusado de lavagem de dinheiro e corrupção no esquema investigado pela Lava-Jato. Apesar de Lula não ser alvo da investigação, Janot aponta que o ex-presidente deu poder a Collor na BR Distribuidora.

Procurada pela reportagem para comentar as denúncias do procurador-geral, a assessoria do senador Fernando Collor não retornou. Segundo a assessoria do PTB, que também não quis se manifestar sobre as denúncias, a equipe do senador está de férias.
A liderança do PT na Câmara dos Deputados também não se posicionou sobre as acusações de Rodrigo Janot e afirmou que não vai se manifestar sobre o assunto por enquanto. O Instituto Lula divulgou nota afirmando que as denúncias envolvendo o ex-presidente já foram esclarecidas em depoimento à PF, em dezembro.

 

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