A turbulência no mercado internacional de petróleo e os anúncios de reduções nos investimentos da Petrobras serão combustível para uma disputa que vai ocorrer no Congresso este ano. No centro do debate – que terá requintes ideológicos envolvendo partidos de direita e de esquerda –, está o projeto, apresentado no ano passado pelo senador José Serra (PSDB-SP), que acaba com a obrigatoriedade de a Petrobras participar na exploração do pré-sal. O texto está com a Mesa Diretora do Senado e tem pedido de urgência para ser votado no plenário. Parlamentares de base governista e movimentos sindicais ligados ao setor afirmam que o texto “ameaça a soberania energética do país” ao abrir o mercado para multinacionais. Dentro do próprio Palácio do Planalto, cresce a ideia de que, em algumas situações, a abertura de campos do pré-sal para petroleiras de fora pode gerar investimentos importantes para a economia.
No início da semana passada, em reunião com representantes do Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Combustível (IBP) e com o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga (PMDB), a presidente Dilma Rousseff sinalizou que o governo poderá flexibilizar a regra para investimentos em reservas descobertas próximas às áreas de concessões. O presidente do IBP, Jorge Camargo, ressaltou que as mudanças na legislação serão positivas em momento que a estatal passa por dificuldade e enfrenta redução de investimentos.
Segundo o órgão, as estimativas das reservas nas áreas contíguas às do pré-sal apontam a existência de 8 bilhões a 13 bilhões de barris de petróleo, o que poderia render investimentos acima de US$ 100 bilhões para a exploração nos locais. A alteração, no entanto, representaria uma mudança em uma das principais bandeiras políticas do governo petista, que defendia a participação da Petrobras em todas as áreas de exploração no litoral brasileiro.
Um dos contrários à medida é o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), que criticou o projeto de Serra, alertando que “o pré-sal é uma das riquezas mais importantes para o Estado e extremamente estratégico para a soberania energética e para o desenvolvimento econômico do país”. “O mercado internacional do petróleo é bastante competitivo.
Oferta interna
Em sua justificativa para alterar a lei, o senador José Serra apontou a queda nos investimentos da Petrobras e os escândalos de corrupção como fatos que precisam ser levados em conta para permitir que empresas estrangeiras não precisem de firmar parcerias com a estatal para explorar o pré-sal. “A exploração do pré-sal tem urgência, pois a oferta interna de petróleo em futuro próximo dependerá dessa exploração, sobretudo a partir de 2020. Além disso, as investigações da Justiça sobre negócios da Petrobras têm afetado a estatal”, explica Serra.
Segundo o tucano, a ligação de integrantes da estatal com grupos criminosos que são investigados pela formação de um cartel, pagamento de propinas e lavagem de dinheiro colocam em xeque o “futuro de uma companhia que tem de implementar um programa de investimentos da ordem de US$ 220,6 bilhões até 2018”.
Preços tornam exploração inviável
O cenário catastrófico no mercado de combustível em todo o mundo fez com que duas posições antagônicas viessem à tona nesta semana em relação ao futuro da exploração da camada pré-sal no Brasil. Com o valor do barril de petróleo ficando abaixo de US$ 30 pela primeira vez em mais de uma década, especialistas apontaram que os investimentos em novos projetos para extração em alto-mar se tornam pouco rentáveis.
Durante o Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, o diretor da Agência Internacional de Energia (AIE), Fatih Birol, alertou que a queda no preço do combustível torna arriscada a realização de novos leilões para campos ainda não explorados. “Para projetos futuros, essas não são boas notícias para o Brasil e outros países que apostam na exploração offshore, porque ela é mais cara e complexa. É preciso ter preços mais altos para viabilizar novos investimentos, incluindo o pré-sal”, afirmou Birol em entrevista ao Valor Econômico.
Para a AIE, no entanto, o momento catastrófico não vai se estender por muitos anos e a tendência é que o preço do barril volte a se estabilizar e que o valor de mercado recupere as cotações normais até 2020. Mesmo com o valor baixo, o presidente da Petrobras, Aldemir Bendine, defendeu nesta semana que a exploração nas áreas do pré-sal são viáveis financeiramente. Segundo Bendine, o pré-sal continua competitivo e deve ser o foco prioritário da companhia devido ao seu custo/benefício.
Ao anunciar a redução de 30% nas funções gerenciais da empresa e suas subsidiárias, Bendine afirmou que o valor da produção nas bacias pré-sal gira em torno de US$ 8. Especialistas afirmam que o valor final fica em torno de US$ 26, uma vez que são levados em conta outros custos ligados à produção, como o pagamento de royalties e extração especial.
Três perguntas para...
Paulo César Ribeiro Lima, ex-funcionário da Petrobras e consultor legislativo especialista em produção e transporte de petróleo e gás natural
A queda no preço do barril do petróleo pode inviabilizar os investimentos no pré-sal?
A exploração de um campo ocorre por um período de 30 a 40 anos. O fato de o petróleo estar a US$ 30 não quer dizer que o pré-sal não seja um bom ativo.
Como o sr. vê a proposta do senador José Serra, de acabar com a obrigatoriedade de a Petrobras participar com 30% no pré-sal?
A proposta tem vantagens e desvantagens. Na situação em que a Petrobras está, a atual legislação faz muito sentido. Porque o pré-sal tem áreas ótimas, em que a produção é muito rentável, mas tem áreas ruins e outras péssimas.
É possível saber até quando o preço do barril de petróleo ficará em níveis tão baixos?
Para que o preço volte aos altos patamares, entre US$ 80 e US$ 100, alguns países, como Arábia Saudita e Rússia, teriam de reduzir a produção. O que não ocorreu até agora. Pelo contrário, eles estão aumentando a produção. Em algum momento, terão de sentar e avaliar o cenário, talvez criar um teto na produção. O preço baixo tira investimentos e faz com que apenas as boas áreas de produção sejam exploradas. É uma redução de investimentos em escala global. Ninguém sabe hoje com certeza sobre o que será feito no mercado internacional, não existe bola de cristal, mas a aposta é que esse preço tão baixo não se sustenta por dois anos, no máximo..