A falta ou o excesso de água em Minas Gerais levaram praticamente um quinto dos 853 municípios do estado a decretar situação de emergência ou estado de calamidade pública entre o início do ano passado e janeiro de 2016.
Em Guidoval, na Zona da Mata, os produtores da cidade, que vive basicamente de hortifrútis, já perderam aproximadamente R$ 1,5 milhão por causa da seca. Com base na constatação dos prejuízos pela Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater), a prefeita Soraia Vieira (PSDB) editou o decreto e está correndo atrás de R$ 1 milhão do governo federal para fazer barraginhas na tentativa de evitar novos episódios. “Temos produção de cebola, berinjela, pimentão, abobrinha e também criação de gado, foi bastante prejuízo por causa da seca. A prefeitura tem que ficar levando caminhão-pipa para encher as represas da população rural, muito atingida”, explica. Do estado, o município conseguiu 120 cestas básicas.
Dados do Ministério da Integração Nacional e da Coordenadoria Estadual de Defesa Civil mostram que outras 132 cidades decretaram situação de emergência por causa da seca ou estiagem. Já a chuva levou 10 municípios a oficializarem a mesma condição e outros três a se colocarem em estado de calamidade.
O prefeito de Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha, Armando Jardim Paixão (PT), também decretou emergência desde o ano passado por causa da seca. Foram quatro ou cinco anos de escassez e a falta d’água deu lugar à chuva nos últimos 15 dias. Segundo o prefeito, a intensidade da água acabou com a lavoura. “Não tem produção nenhuma e isso tem levado o pessoal da zona rural a abandonar seus lares e ir para a cidade”, disse. De acordo com o petista, falta emprego e infraestrutura. Também não há mecanismos para represar a água quando ela vem. Paixão não sabe quantificar o prejuízo, mas diz que também está pedindo dinheiro à União e ao estado para construir poços artesianos e barraginhas. De dois anos para cá, ele conta que a cidade recebeu benefícios em torno de R$ 1 milhão.
Desabastecimento
Em Barbacena, na Região Central, o excesso de água acabou levando à falta dela. A chuva inundou o Rio das Mortes, onde funciona o sistema de captação, e a população ficou sem abastecimento. A situação de emergência foi decretada na sexta-feira pelo prefeito Antônio Andrada (PSB), que prevê pelo menos cinco dias para restabelecimento total. “Decretamos emergência para poder operar toda essa situação com rapidez, sem entrave burocrático.
Andrada poderá consertar as bombas sem processo licitatório e fazer compras diretamente. A Copasa, que atende 40% da população e capta em outro rio, já ofereceu ajuda para quem ficar sem água. Também terá acesso com mais facilidade, só que a remédios e sorologia, o prefeito de Raposos, Carlos Alberto Coelho de Azevedo (PSL).
A cidade está em emergência por causa da dengue. Em 2014, havia apenas 14 casos e, de outubro de 2015 até a presente data, foram 728 notificações e 212 casos confirmados. “Nossa estrutura física não tem condições e não tivemos saída senão decretar emergência. Assim, podemos adentrar as residências para combater o mosquito, solicitar apoio dos governos, conseguimos ajuda do Exército com mais agilidade”, explica. Segundo Azevedo, o governo estadual forneceu o veneno para exterminar os criadouros do Aedes aegypti e algumas bombas para pulverização, além de material educativo.
Em análise
No ano passado, o Ministério da Integração Nacional repassou R$ 3,17 milhões a Capitão Andrade, Conselheiro Pena, Pocrane e São Pedro do Suaçuí para ações de reconstrução de áreas danificadas. Outros R$ 6,64 milhões para socorro e assistência foram para o governo do estado e o município de Franciscópolis. Planos de trabalho das cidades de Coromandel, Franciscópolis e Itaverava estão em análise pela equipe técnica. O governo do estado informou que, em 2015, “vários municípios foram atendidos com cesta básica e distribuição de água” e houve distribuição de itens de ajuda humanitária como colchões, cobertores, kits de higiene e limpeza, telhas e lonas.
Malabarismo para pagar as contas
Com os cofres vazios e depois de passar por um dos anos mais difíceis para a administração pública no Brasil, os prefeitos mineiros terão de fazer malabarismo para pagar as contas em 2016. Isso porque a projeção dos repasses do Fundo de Participação de Municípios (FPM), principal fonte de arrecadação para 80% das prefeituras mineiras, terá um crescimento abaixo da inflação. Segundo levantamento do Observatório de Informações Municipais, as 853 prefeituras mineiras terão rateados entre elas R$ 9.274.699.119,00, valor apenas 3,83% maior do que o estimado para 2015.
Para a média dos municípios de Minas, o crescimento será de 5,58%. O percentual é inflado em relação ao global porque algumas cidades tiveram o coeficiente modificado, já que houve aumento da população. Araxá, no Alto Paranaíba, terá um repasse 12,6 % maior do que o recebido em 2015. Para Bambuí, no Centro-Oeste, esse percentual será ainda maior, de 23,18%. Outras cidades também ajudaram a jogar o reajuste para cima, como Brumadinho (18%), na Região Central, e Conceição do Rio Verde (31,9%), no Sul.
O levantamento mostra que nem mesmo essa perspectiva é segura. O repasse de fato realizado no ano passado foi de R$ 8.962.833.643,75, quando o previsto inicialmente era R$ 9.569.730.234,00. Para todo o Brasil, eram previstos R$ 72.884.464.851,00, mas foram de fato repassados R$ 68.398.980.853,00. A expectativa para 2016 é de um FPM total de R$ 75.677.286.310,00. Minas Gerais recebe 13,1% desse valor.
Expectativa
Responsável pelo levantamento, o consultor François Bremaeker acredita que os repasses do fundo ficarão abaixo da previsão. “Não existe nenhuma expectativa de crescimento na arrecadação federal com Imposto de Renda e IPI e a inflação está alta”, afirmou. Segundo o pesquisador, a única saída para os municípios que tiverem essa opção é tentar melhorar suas receitas próprias.
O presidente da Associação Mineira de Municípios e prefeito de Pará de Minas, Antônio Júlio (PMDB), disse que o cálculo interno é de uma diminuição de 8%, que será somada ao impacto do reajuste de 11% no salário mínimo. Tem ainda o novo piso da educação, aumentado em 11,3%. “Tudo subiu e o repasse do FPM caiu. A situação é terrível, se for nessa expectativa, o ano vai ser muito pior do que o segundo semestre de 2015, quando tivemos muitas prefeituras reunidas, fazendo contas, paralisadas e cortando serviço. Quem paga é a população, mas não tem outro caminho”, afirmou o prefeito.