Brasília – O andamento de um processo emblemático contra o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), preocupou o Palácio do Planalto, por colocar luz sobre um aliado na disputa dos governistas contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), defensor do impeachment de Dilma Rousseff. Na noite de terça-feira, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin liberou o voto – cujo conteúdo não foi divulgado – sobre a denúncia do Ministério Público contra o senador por peculato e uso de documentos falsos na hora de justificar renda suficiente para pagar pensão à jornalista Mônica Veloso. O caso envolve um relacionamento extraconjugal do parlamentar, revelado em 2007, que fez Renan perder a Presidência do Senado à época e quase lhe custou o mandato.
Em duas ocasiões ontem, Renan esquivou-se de responder diretamente se vai permanecer no cargo caso o STF aceite a denúncia de Fachin. Na chegada a seu gabinete, ele disse que a investigação corre sob segredo de Justiça e que a denúncia foi oferecida às vésperas da eleição para presidente do Senado há quase três anos, pelo então procurador-geral da República, Roberto Gurgel. “Nós já demos todas as explicações, eu não posso tratar de detalhes porque isso está tramitando lá em segredo de Justiça. Duas outras denúncias já foram arquivadas”, disse Renan, sem detalhar o que teria sido rejeitado.
Questionado pela primeira vez se fica no cargo, Renan não respondeu diretamente: “Ninguém mais do que eu tem interesse no esclarecimento desses fatos. Vocês lembram, eu é que pedi a investigação para que essas coisas todas definitivamente se esclarecessem”. Perguntado se novamente permanece, ele disse apenas um “obrigado” e encerrou a entrevista. Em nota divulgada ontem, o senador disse apenas que “já prestou todos os esclarecimentos” sobre o tema.
O processo deve ser pautado em breve, segundo fontes do STF. Os ministros vão decidir se recebem ou rejeitam a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR). Em caso positivo, Renan, que já é investigado na Lava-Jato, passará a ser réu em uma ação criminal. O voto de Fachin era esperado desde janeiro de 2013, quando o caso ainda estava sob a relatoria do presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski. Desde aquela época, o ministro não votou se receberia ou rejeitaria a acusação. Quando Lewandowski assumiu a Presidência do STF, alguns processos foram remetidos a outros gabinetes. Em julho de 2015, com a posse de Fachin, o caso ficou com ele.
Ironicamente, Renan atuou como um dos principais adversários da chegada de Fachin ao Supremo. Após a indicação da presidente Dilma, o peemedebista chegou a mostrar aos senadores dossiês contra o então advogado. À época, o senador não estava alinhado com o Palácio do Planalto e defendia outro candidato ao cargo.
Agora, a situação é diferente. Renan é um dos principais interlocutores de Dilma no Congresso. O fato de um processo criminal emblemático sair da inércia no Supremo chocou os governistas. Surpresos, eles não esperavam que isso ocorresse justamente agora, quando precisam de apoio para minar a influência de Eduardo Cunha no parlamento. Tudo o que os governistas não querem, apurou o Estado de Minas, é “tirar o foco de Cunha”, também alvo da Lava-Jato, mas com uma denúncia formulada e um pedido de afastamento do cargo. Ao contrário, entende que Renan precisa ser preservado por ser aliado importante. Ele responde a cinco inquéritos na Lava-Jato, sendo dois deles sigilosos.
Empreiteira
Em 2007, logo após uma reeleição tranquila para o Senado, surgiu a notícia de que o lobista Cláudio Gontijo, da empreiteira Mendes Júnior, pagava a pensão alimentícia devida pelo senador a uma criança fruto de caso extraconjugal dele com a jornalista Mônica Veloso. Dois dos três relatores do caso no Conselho de Ética, Renato Casagrande (PSB-ES) e Marisa Serrano (PSDB-MS), asseguraram que Renan recebia os valores em troca de uma emenda à Lei de Diretrizes Orçamentárias para favorecer a empreiteira. Em 2013, acabou denunciado pelo procurador-geral da República, quando fazia campanha pela presidência do Senado. À época, ele acusou o procurador de agir politicamente para prejudicá-lo e beneficiar seu oponente, o procurador licenciado Pedro Taques (PDT-MT).
Na denúncia, Roberto Gurgel explicou que o parlamentar usou notas fiscais emitidas por serviços não prestados para comprovar despesas da verba de representação do gabinete. “Para justificar a renda, ele usou de recursos da verba de representação e comprovou com notas frias. A prova documental é farta nesse sentido”, escreveu Gurgel. Se Renan for condenado pelos três crimes, a soma das penas pode variar de cinco a 23 anos de cadeia, mais pagamento de multa.
Enquanto isso...
…Acordo com Temer
O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), afirmou ontem que apoia a reeleição do presidente do partido, o vice Michel Temer, desde que todos os segmentos da legenda estejam representados na chapa. Renan e Temer fecharam um acordo para que o vice continue à frente do PMDB pelos próximos dois anos. Em encontro na terça-feira, ficou acertado que, na convenção partidária marcada para março, haverá o lançamento de uma chapa única e o grupo peemedebista ligado a Renan dividirá com aliados de Temer os principais cargos da executiva da legenda. Os dois trocaram uma série de acusações públicas sobre a condução do partido no final do ano passado. “Que o presidente seja presidente do PMDB e não de uma facção. Para isso é preciso que a chapa expresse a unidade”, destacou o senador.