O pânico foi provocado pela interpretação dada recentemente a um artigo da resolução 23.465, publicada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em dezembro do ano passado. Advogados e especialistas em direito eleitoral consideraram que a resolução, ao limitar a 120 dias a validade das comissões provisórias dos partidos nos municípios, só permitiria o lançamento de candidatos a prefeito onde houvesse diretórios formalmente instalados. O problema é que nenhum partido tem diretórios em todas as cidades brasileiras, e muitos não estão devidamente instalados nem sequer nas capitais.
O PSDB, por exemplo, tem diretórios em apenas 1.704 (31%) dos 5.570 municípios, e comissões provisórias em 2.945 (53%). O PMDB, tido como o partido mais enraizado nos distantes "rincões" do País, ainda não formou diretórios em 51% das cidades. Partidos mais novos apresentam taxa de penetração ainda muito menores que estas. É o caso do PSD, por exemplo, que só tem diretórios em 8% dos municípios.
O mapa publicado nesta página mostra como esses três partidos, além do PT, estão organizados no nível municipal - quanto mais áreas em verde, mais diretórios formados.
Como o próprio nome indica, as comissões provisórias são órgãos precários, que deveriam funcionar apenas até a eleição do diretório municipal, uma instância de caráter permanente. Na prática, porém, a maioria dos partidos não se esforça para que essa transição aconteça.
Hierarquia
Trata-se de uma questão de centralização de poder: os integrantes das comissões provisórias nos municípios são nomeados pelos diretórios estaduais, e seus mandatos não têm prazo definido - ou seja, podem ser destituídos e substituídos a qualquer momento se essa for a vontade dos "caciques" da legenda no Estado.
Ou seja, quanto mais comissões provisórias um partido tiver em determinado Estado, mais o poder de escolher candidatos ou fazer coligações estará concentrado em seu diretório estadual. Para o TSE, essa concentração de poder é antidemocrática - daí a resolução que limita o prazo das comissões provisórias. Mas não está claro se essa medida terá ou não impacto nas próximas eleições.
Na semana passada, assediados por diversos advogados de partidos, o ministro Henrique Neves afirmou que o TSE não proibiu o lançamento de candidatos por comissões provisórias, mas não esclareceu se estava se referindo também àquelas que têm mais de 120 dias. Por outro lado, ele manifestou claramente a necessidade de as legendas substituírem esses órgãos provisórios por diretórios.
Essa recomendação, em suas palavras, deve ser seguida "porque os partidos políticos têm, por definição constitucional, de seguir o regime democrático, ou seja, seus filiados têm de votar". Neves disse ainda que ouvirá o Ministério Público Eleitoral sobre o assunto, antes de prestar mais esclarecimentos aos partidos, provavelmente nesta semana.
Para o cientista político Jairo Nicolau, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a forma como os partidos se constituem nos municípios não deveria ser regulada pela Justiça Eleitoral. "Em nenhuma grande democracia existe um controle estatal tão forte sobre a vida dos partidos", afirmou.
Por outro lado, o pesquisador ressaltou que a existência de tantas comissões provisórias é uma "evidência da centralização do poder" nos diretórios estaduais. "É uma hipótese muito razoável o fenômeno não estar relacionado à precariedade ou à desorganização dos partidos, mas a uma decisão deliberada dos líderes estaduais."
.