Sob forte pressão política, desde que foram retomadas as novas fases da Operação Lava-Jato, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sofreu ontem uma derrota com decisão unânime do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) de manter o promotor Cássio Conserino, de São Paulo, à frente das investigações sobre vínculos entre o petista e um apartamento triplex da empreiteira OAS no Condomínio Solaris, no Guarujá. No âmbito da Lava-Jato, o ex-presidente também é investigado em razão de suas relações com a Odebrecht, em Curitiba, e, com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), na Procuradoria da República, em Brasília.
Perdeu Lula, mas Conserino também saiu chamuscado da queda de braço. Apesar da decisão de mantê-lo no caso, o CNMP decidiu pelo envio do processo à Corregedoria Nacional do Ministério Público, “a fim de que possa supervisionar a tramitação do processo disciplinar já instaurado no âmbito da corregedoria local para apurar se houve excessos do requerido nas suas manifestações perante a imprensa”. Conserino deu entrevista à revista Veja dizendo que denunciaria Lula por ocultação da propriedade do apartamento no Guarujá. Dessa forma, nova data para o depoimento do petista deve ser marcada pelo promotor. No dia 16, mesmo com o adiamento do depoimento, grupos contrários e favoráveis a Lula entraram em confronto em frente ao fórum de São Paulo.
Em seu voto, o relator do CNMP, Shuenquener, defendeu o princípio do promotor natural e a distribuição aleatória dos procedimentos criminais, conforme previsto na Constituição. O objetivo da regra é garantir a independência dos integrantes do Ministério Público e uma proteção da sociedade contra o que ele chama de “promotor de encomenda”. Mas, mesmo com este ponto de vista, o conselheiro entendeu que a decisão de Conserino está amparada pela Resolução 13, aprovada em 2006 pelo CNMP.
Também estaria ancorada na Portaria 10.941, editada pela Procuradoria-Geral de Justiça de São Paulo no ano passado. Pelo parágrafo 4º do artigo 3º da Resolução 13 do CNMP, “no caso de instauração de ofício, o membro do Ministério Público poderá prosseguir na presidência do procedimento investigatório criminal até a distribuição da denúncia ou promoção de arquivamento em juízo”.
RECURSO O advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins, disse que deverá recorrer à Justiça contra a decisão. “O debate foi importante, e expôs a indefinição sobre a investigação. Se for o caso, submeteremos o caso ao Poder Judiciário. Aguardamos o acórdão para decidir o próximo caminho. Continuamos entendendo que a situação é ilegal.” Na segunda-feira, a defesa do petista acusou o promotor Conserino de instaurar a investigação apenas para ganhar “notoriedade”. Depois da sessão, o deputado Paulo Teixeira (PT), que questionou a legalidade da ação do promotor junto ao CNMP, disse que o objetivo não era barrar a investigação, mas apenas garantir que as regras do Ministério Público estivessem sendo observadas na condução do caso.
Presente também à votação, o procurador-geral de Justiça do Ministério Público de São Paulo, Márcio Fernando Elias Rosa, disse que as investigações sobre Lula e o triplex seguirão normalmente a partir de agora, inclusive com o depoimento do ex-presidente. “O procedimento será retomado e o depoimento remarcado. A decisão do CNMP reconheceu a capacidade do MP de investigar. Reafirmou o poder investigativo e a correção dos procedimentos”, comemorou o procurador-geral. Como em outras sessões envolvendo o ex-presidente Lula, pelo menos 10 manifestantes com faixas contra a corrupção gritavam pedindo que o procurador-geral da República prendesse o petista.