Às vésperas de protesto, Dilma nega qualquer possibilidade de renúncia

Presidente afirma não ter 'cara de quem vai renunciar', dispara contra a oposição e abre as portas do seu ministério para Lula. Oposição afirma que falta de 'senso público'

Naira Andrade

Brasília - A presidente Dilma Rousseff rompeu o isolamento dos últimos dias e convocou a imprensa para defender o governo e aliados, às vésperas da manifestação pelo impeachment, marcada para amanhã.

Ela foi enfática ao garantir que não vai renunciar.  A petista respondeu às insinuações de que estaria resignada com a crise e ao possível convite para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva assumir um cargo no Palácio do Planalto. “Vocês acham que tenho cara de estar resignada? Que eu tenho gênio de estar resignada?”, indagou. A oposição, por sua vez, rebateu as declarações e disse que falta “senso público” à presidente para reconhecer a situação atual do Brasil.

A fala de Dilma teve como objetivo tirar a impressão de imobilidade da presidente, frente ao agravamento das crises política e econômica. A decisão de se pronunciar veio depois de uma reunião emergencial convocada logo no início da manhã de ontem com os principais ministros da coordenação política. Segundo interlocutores do Palácio do Planalto, já havia um desejo que a presidente fizesse alguma declaração após o imbróglio criado com a nomeação do procurador de Justiça da Bahia Wellington César Lima e Silva para o Ministério da Justiça. “É impossível, quem me conhece, achar que, pela minha trajetória pessoal, pela minha honradez e pelo respeito que eu tenho pelo povo brasileiro, eu me renuncie… eu me resigno diante de absoluto desrespeito a lei e à Constituição”, criticou. “Fui presa, torturada pelas minhas convicções.
E devo ao povo brasileiro o respeito pelos votos que me deram. Não estou resignada diante de nada”, afirmou.

Dilma negou qualquer possibilidade de renúncia. “Nenhum líder da oposição, ninguém tem o direito de pedir a renúncia de um presidente legitimamente eleito pelo povo sem dar elementos comprobatórios de que eu tenha de alguma forma ferido qualquer inciso da Constituição. (...) A renúncia é um ato voluntário. Aqueles que querem a renúncia estão, ao propô-la, reconhecendo que não há uma base real para pedir a minha saída desse cargo”, rebateu a presidente.  Foi uma resposta ao senador Aécio Neves, presidente do PSDB, que subiu à tribuna do Senado na quinta-feira, para pedir a renúncia dela

Reunidos no Alvorada, os ministros da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini; da Casa Civil, Jaques Wagner; da Advocacia Geral da União, José Eduardo Cardozo; e o assessor especial da presidente, Giles Azevedo, conversaram por mais de uma hora com a presidente analisando as possibilidades de entregar um ministério a Lula. Em relação ao foro privilegiado, uma parte entendeu que ele ajudaria Lula, por retirar o processo das mãos do juiz Sérgio Moro. Há no entanto, quem acredita que convencer os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), depois da manobra, seria ainda mais complicado do que o magistrado paranaense.

Mesmo sob investigação, Dilma afirmou receber com “orgulho” o antecessor. “Eu teria o maior orgulho de ter o presidente Lula no meu governo, porque é uma pessoa com experiência, com grande capacidade de formulação de políticas, e aí eu estou dizendo da capacidade gerencial dele.” A presidente ofereceu ao antecessor a Casa Civil ou a Secretaria de Governo.

A presidente criticou o pedido de prisão do antecessor. “Passou de todos os limites. Não existe, e acho que isso é quase consenso entre os juristas, não existe base nenhuma para esse pedido. É um ato que ultrapassa o bom senso, é um ato de injustiça e é um absurdo que um país como o nosso assista calmamente um ato desses contra uma liderança política responsável por grandes transformações no país, respeitado internacionalmente”, afirmou. Sobre as manifestações de amanhã, ela disse que o direito ao protesto é um patrimônio da democracia e fez um apelo pela tolerância aos manifestantes.

REAÇÃO A oposição reagiu com intensidade aos ataques de Dilma.
O deputado federal Nelson Machezan (PSDB-RS), disse que a fala mostra “falta de senso público” da petista. “A renúncia seria uma alternativa. Se a presidente tivesse um pouquinho mais de senso público, provavelmente já teria entendido que o Brasil inteiro está exigindo que o país mude de rumo e que mude de dono. Hoje, o Brasil é uma propriedade privada de algumas pessoas que integram alguns partidos. Nós queremos devolvê-lo aos brasileiros”, avaliou.

 

“Uma das vitórias da democracia brasileira é o direito de livre manifestação. Não cabe, de jeito nenhum, a gente perder esse patrimônio da tolerância, característica do nosso país”
Sobre as manifestações de amanhã contra o governo

 

“Por interesses políticos de quem quer que seja, por definições de quem quer que seja, não sairei deste cargo sem que haja motivo para tal”
Sobre a possibilidade de renúncia

 

“Eu teria o maior orgulho de ter Lula no meu governo, porque ele é uma pessoa com experiência, grande capacidade de formulação de políticas”
Sobre Lula no governo

 

“Meu querido (ministro), você decida o seu destino de acordo com suas convicções e com aquilo que lhe é interessante”
Sobre a permanência de Wellington César no Ministério da Justiça

 

 

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