A decisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de assumir o cargo de ministro-chefe da Casa Civil dá a ele direito a foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal (STF), tirando-o das mãos do juiz federal Sérgio Moro, responsável pelos processos da Operação Lava-Jato. Apesar da prerrogativa, a sombra de Moro ainda ronda o petista. Juristas consideram remota, mas não descartam a possibilidade de o STF remeter novamente o julgamento do ex-presidente para o juiz federal. Crítico do governo, o ministro da suprema corte Gilmar Mendes chamou ontem a nomeação de Lula de “grave interferência política” na Justiça e afirmou que o tribunal pode suspender o foro privilegiado do novo ministro e remetê-lo, novamente, à primeira instância. (Veja arte abaixo)
Nessa quarta-feira (16), Dilma reforçou que a indicação de Lula para a Casa Civil fortalece seu governo e não é uma estratégia para o petista fugir de Moro. “A troco de que vou achar que a investigação do juiz Sérgio Moro é melhor que do STF?”, questionou Dilma. Segundo ela, a prerrogativa de foro trata apenas de onde se dará a investigação, e não se alguém será ou não investigado. “Por trás dessa afirmação de que o Lula quer se esconder, estaria uma desconfiança na suprema corte do país”.
A ex-primeira dama dona Marisa Letícia e um dos filhos do petista, Fábio Luís Lula da Silva, também são acusados, mas a ida de Lula para a Casa Civil não dá benefícios à família. Ontem, inclusive, o ministro do STF Teori Zavascki, responsável pela Lava-Jato no STF, decidiu remeter para o juiz Sérgio Moro, em Curitiba, o processo contra Cláudia Cruz e Danielle Dytz, respectivamente, mulher e filha do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), acusado de receber propina no esquema de corrupção da Petrobras.
O jurista e presidente do Instituto Avante Brasil, Luiz Flávio Gomes, Luiz Flávio Gomes, afirma que, assim que assumir o cargo, o processo de Lula vai para o STF. “O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, analisa tudo e vê se é o caso de arquivar, continuar a investigação ou já denunciar”, reforça, convicto de que o processo correrá no Supremo . O ministro do STF Teori Zavascki será o relator do processo.
O professor de direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e juiz federal Carlos Henrique Haddad também considera remota a possibilidade de o processo voltar para Moro, embora não descarte essa hipótese. Haddad lembra o caso do ex-deputado Natan Donandon, que renunciou para não ser julgado pelo STF. “Os ministros entenderam que foi uma manobra para se livrar do STF e não aceitaram passar o processo para a primeira instância. Mas, com o Lula, a denúncia sequer foi recebida, o processo está muito no início”, diz Haddad, apostando que o tema será tratado no Supremo. Juristas apontam prós e contras da mudança do processo da primeira instância para o STF. “Sérgio Moro julgaria muito mais rápido. Mas em primeira instância, haveria ainda três instâncias para recorrer”, diz. O professor de direito constitucional da Faculdade Arnaldo Bruno Albergaria reforça que, à exceção do mensalão, os ministros não lidam com direito penal a fundo. “Essa parte de colhimento de provas não é o que sabem fazer com mais afinco. O Moro tem um aparato específico full-time para isso”, diz.
Há ainda uma corrente entre juristas que levanta a impossibilidade de Lula ser ministro da Casa Civil, argumentando que o cargo estaria sendo usado como um “desvio de finalidade”. Na avaliação de Gomes, não há impedimento para o presidente Lula assumir a Casa Civil. “A Constituição exige 21 anos de idade e exercício dos direitos políticos. Para comprovar um desvio de finalidade, será preciso saber o que vai fazer quando for nomeado”, reforça. Já Albergaria pondera que, embora não vá contra os critérios estabelecidos para ser ministro, o ato pode ferir o princípio da moralidade. “O governo está querendo se sustentar e proteger Lula. Para mim, isso é amoral”, afirma.
MP DE SP RECORRE
Os promotores Cassio Conserino, José Carlos Blat e Fernando Henrique Araújo, que fizeram a denúncia contra Lula à Justiça de São Paulo entraram com recurso na 4ª Vara Criminal da capital contra a decisão da juíza Maria Priscilla Ernandes Veiga de Oliveira, que repassou o processo para o juiz federal Sérgio Moro, em Curitiba. Eles entendem que os crimes antecedentes e a lavagem de dinheiro são de competência estadual e o processo deve ficar em São Paulo. Querem ainda que, caso a juíza não reveja a sua decisão, os autos sejam remetidos à 10ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo para análise da denúncia ofertada e de outras medidas.