A gravação da conversa telefônica entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente Dilma Rousseff foi feita sem autorização do juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba (PR), Sérgio Moro. A conversa aconteceu duas horas depois de ter sido determinado o fim das interceptações no telefone do ex-presidente. A determinação foi juntada ao processo às 11h12 dessa quarta-feira (17), em despacho com ordem para imediata comunicação à Polícia Federal (PF). “Com urgência, inclusive por telefone”, frisou o magistrado. Vinte e dois minutos depois, a diretora da secretaria informa que a ordem foi cumprida. Apesar disso, às 13h32, é interceptado o diálogo no qual Dilma diz a Lula que enviaria a ele o “termo de posse” para que ele utilizasse o documento “em caso de necessidade”.
O delegado federal Luciano Flores de Lima, o mesmo que interrogou o petista depois de sua condução coercitiva até o Aeroporto de Congonhas, foi o responsável pela determinação para a juntada nos autos do áudio. Luciano Flores é também autor do relatório que, apesar de ter caráter sigiloso, descreve como reagiu o ex-presidente Lula diante dos delegados, quando chegaram à sua casa. Segundo ele, Lula teria dito, por exemplo, que só sairia de casa algemado. Além disso já foi alvo de ação por promoção pessoal. Uma foto dele estampada na capa de uma revista do Rio Grande do Sul trazia os dizeres: “O cara da PF”.
Para justificar a manutenção do grampo, o Departamento de Polícia Federal, por meio de nota, informou que o diálogo foi captado devido à demora das empresas telefônicas em desativar o sistema. Segundo a PF, estavam sendo monitorados alvos por diferentes empresas. E se eximiu de qualquer responsabilidade afirmando: “Encerrado efetivamente o sinal pela companhia, foi elaborada a respectiva relatoria e encaminhado ao juízo competente a quem cabe decidir sobre sua utilização no processo.”
Justificativa
“Interesse público e a previsão constitucional de publicidade dos processos” foram as justificativas apresentadas pelo juiz federal de Curitiba (PR) Sérgio Moro, que preside as ações da Operação Lava-Jato, para levantar o sigilo das gravações telefônicas de conversas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nomeado nessa qurata-feira (17) ministro-chefe da Casa Civil.
“O levantamento propiciará assim não só o exercício da ampla defesa pelos investigados, mas também o saudável escrutínio público sobre a atuação da Administração Pública e da própria Justiça criminal. A democracia em uma sociedade livre exige que os governados saibam o que fazem os governantes, mesmo quando estes buscam agir protegidos pelas sombras”, afirmou Moro, em seu despacho, em pedido do Ministério Público Federal de fim do sigilo nas gravações.
Terminal
Para embasar a divulgação dos diálogos de Lula com autoridades, o juiz frisou que “somente o terminal utilizado pelo ex-presidente foi interceptado e jamais os das autoridades com foro privilegiado, colhidos fortuitamente”. Além disso, faz outra ressalva: “Rigorosamente, sequer o terminal do ex-presidente foi interceptado, mas apenas o terminal telefônico utilizado por assessor dele, do qual ele fazia uso frequente”, afirmou o magistrado.
“Não muda esse quadro o fato de a prova ser resultante de interceptação telefônica. Sigilo absoluto sobre esta deve ser mantido em relação a diálogos de conteúdo pessoal inadvertidamente interceptados, preservando-se a intimidade, mas jamais, à luz do art. 5º, LX, e art. 93, IX, da Constituição Federal, sobre diálogos relevantes para investigação de supostos crimes contra a administração pública”, afirma Moro, no despacho.
Esta, no entanto, foi a última decisão de Moro nas investigações sobre as suspeitas de favorecimento do ex-presidente com recursos desviados da Petrobras. Em pouco mais de duas páginas, o juiz determinou a remessa para o Supremo Tribunal Federal (STF) de todas as apurações que envolvem o petista.
“Diante da notícia divulgada na presente data de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria aceito convite para ocupar o cargo de ministro-chefe da Casa Civil, deve o feito, com os conexos, ser remetido, após a posse, aparentemente marcada para a próxima terça-feira (dia 22), quando efetivamente adquire o foro privilegiado, ao Egrégio Supremo Tribunal Federal”, decidiu.
Interferência No despacho, Moro expõe seu entendimento de que Lula e seus interlocutores agiram para influenciar autoridades do Ministério Público e da magistratura em favor do petista, “em um cenário de aparentes tentativas de obstrução da Justiça”. E faz um paralelo da iniciativa de proteção de Lula com o caso da prisão do senador Delcídio do Amaral, que teria tentado impedir que o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró – preso e condenado na Operação Lava-Jato –, colaborasse com a Justiça, por meio da delação premiada.
Moro teve o cuidado, no entanto, de não deixar suspeita sobre membros das instituições citadas nas gravações. “Cumpre aqui ressalvar que não há nenhum indício nos diálogos ou fora deles de que estes citados teriam de fato procedido de forma inapropriada e, em alguns casos, sequer há informação se a intenção em influenciar ou obter intervenção chegou a ser efetivada”, ressaltou o magistrado. Ele ainda fez menção à ministra Rosa Weber que decidiu contra o pedido do ex-presidente ao autorizar a continuidade das investigações sobre Lula no Ministério Público Estadual de São Paulo. “A eminente magistrada, além de conhecida por sua extrema honradez e retidão, denegou os pleitos da defesa do ex-presidente”, destacou.