Brasília - Daqui a três semanas, quando o relatório do processo de impeachment provavelmente estiver pronto para ser votado na comissão especial e remetido ao plenário, o debate sobre o fim ou a continuidade do governo da presidente Dilma Rousseff (PT) terá enfrentado uma longa batalha política. Os exércitos de lado a lado estão alinhados há um bom tempo e prontos para o embate, exercendo pressão sobre parlamentares, buscando atrair o máximo possível de apoio popular e flertando com a incapacidade do diálogo para sair da maior crise política da história brasileira recente. Os novos capítulos da Operação Lava-Jato, as manifestações nas ruas e as batalhas judiciais também terão um peso importante na balança do impeachment. “Estamos diante de uma tempestade perfeita”, como resumiu o presidente da Comissão, deputado Rogério Rosso (PSD-DF), em entrevista publicada ontem no EM. Ele não está errado. O Brasil vive a pior recessão econômica desde 1930. O desemprego aumenta, a inflação está resiliente e os investidores nacionais e estrangeiros estão assustados e cautelosos, sem saber para onde o país vai. Consequentemente, sem ter as garantias de que vale a pena investir por aqui, motor principal para mitigar o tombo no Produto Interno Brasileiro (PIB), que poderá acumular, em dois anos, quase 9% de encolhimento.
As manifestações de sexta-feira favoráveis a Dilma e ao ex-presidente Lula, sobretudo na Avenida Paulista, onde quase 100 mil pessoas, pela contagem do Instituto DataFolha, foram assistir ao discurso do ministro sub judice da Casa Civil, jogaram mais interrogação no processo. “Pode ser até que os eventos de hoje (sexta-feira) não sejam suficientes para nos manter no poder. Mas, com certeza, mostrarão que será muito mais difícil nos tirar daqui como eles pensavam antes”, disse um petista com bom trânsito no Palácio do Planalto.
“Para saber se terá um mínimo de chances de sobreviver, o governo precisará manter o PMDB ao seu lado”, afirmou o diretor de documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antonio Augusto de Queiroz. Pelos corredores do Palácio do Planalto circula a informação de que o governo está disposto a incluir o PMDB na articulação política e a oferecer mais cargos na Esplanada para mantê-lo aliado à base. Mas as negociações seguem acanhadas. A vice-presidência assegura que ninguém da coordenação política de Dilma os procurou para conversar. Interlocutores ligados ao vice-presidente Michel Temer relatam que Lula tentou jantar com ele em São Paulo na última quarta-feira, antes da posse, mas não conseguiu. Temer pediu para que o encontro ocorra em Brasília, nesta semana. “É melhor esperar a poeira baixar mais um pouco”, desdenhou Temer.
Entre as principais reclamações do vice, que inclusive deixou explícita sua insatisfação por meio de carta a presidente – é o fato de ter sido isolado das articulações do governo. Sem Lula na Casa Civil, Temer poderia ser aproveitado para ajudar nas negociações. No entanto, na contramão dos interesses governistas, interlocutores ligados a Temer afirmam que o rompimento é dado como certo, com data marcada: 29 de março, quando acontecerá a reunião do diretório nacional da legenda. Toninho lembra que a luta do governo não é, na verdade, para conseguir os 171 votos necessários com o objetivo de barrar o processo de impeachment. A oposição precisa, sim, de 392 votos para abrir o processo. “Esses 171 votos poderiam incluir, por exemplo, votos contrários, abstenções ou ausências de deputados em plenário para impedir que o quórum qualificado seja atingido”, explicou Toninho.
SESSÕES A depender do primeiro dia de tramitação do processo na casa, contudo, é bom não contar com essa hipótese. Antes das 9h de sexta-feira, 51 deputados haviam marcado presença no plenário, o que permitiu a realização da primeira sessão – das 10 necessárias – que regulam os prazos na comissão especial do impeachment. “Parlamentares têm um instinto de sobrevivência gigantesco e jamais vão virar as costas ao desejo expresso pelas ruas, especialmente, em ano de eleições municipais”, decretou o cientista político e professor do Insper Carlos Melo. Ele lembra que a divulgação dos grampos telefônicos nos quais Lula teceu profundas críticas ao Judiciário e ao Congresso gerou reações intempestivas de magistrados, juízes e procuradores, que culminaram com a redação, pelo petista, de uma carta na qual dizia sempre ter tido todo o respeito com o Judiciário. “Ele percebeu que errou e que isso complicou ainda mais a vida dele. Por isso, promoveu um recuo tático”, justificou o cientista político.