Se o brasileiro já estava confuso sobre como se dará o desfecho da crise que assola o governo da presidente Dilma Rousseff (PT), os lances dos dois últimos dias tornaram essa terça-feira (5) o cenário ainda mais nebuloso. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello concedeu liminar que obriga a Câmara dos Deputados a examinar um pedido de impeachment contra o vice-presidente Michel Temer, o que faz com que o primeiro na linha de sucessão presidencial também possa ser afastado. Há ainda uma proposta patrocinada por um grupo de senadores de mudar a Constituição para antecipar as eleições gerais para outubro deste ano. Em meio a incertezas, os palpites sobre qual seria a melhor solução se multiplicam.
O presidente da Câmara considerou absurda a decisão do ministro e disse que, se for assim, teria de reabrir oito pedidos de impeachment de Dilma que ficaram pendentes de análise. Cunha informou que a Câmara vai recorrer hoje. “Entendemos que a determinação afronta decisão do próprio plenário do Supremo na análise do rito de impeachment e é contrária até ao voto dele mesmo”, afirmou. A resposta de Marco Aurélio não demorou. Ele considera “impensável” que Cunha, não cumpra a determinação de imediato. Segundo ele, é crime de responsabilidade e sujeito a penas.
A liminar de Marco Aurélio, que ainda será apreciada pelo plenário do Supremo, gerou divergências também dentro da Corte. Ao comentar a decisão, o ministro Gilmar Mendes ironizou o colega, dizendo que não conhecia impeachment de vice. “É tudo novo para mim. Mas o ministro Marco Aurélio está sempre nos ensinando”, disse. Tal previsão, porém, está no artigo 51 da Constituição, que atribui à Câmara a competência para autorizar processo contra presidente, vice-presidente e ministros. Já a Lei do Impeachment não menciona o vice.
ELEIÇÕES GERAIS Também nessa terça-feira (5), o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), admitiu a possibilidade de antecipação das eleições para todos os cargos. Ou seja, além dos prefeitos e vereadores, como está previsto, os eleitores votariam para presidente, governadores, senadores e deputados. A tese foi apresentada pelo senador Valdir Raupp (PMDB-RO) na segunda-feira na tribuna do Senado. “Se vai ser aprovada ou não, nós não sabemos, mas acho que temos que guardá-la como alternativa”, afirmou Calheiros. O senador disse ver “com bons olhos” a ideia de antecipação.
O presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), avalia que medidas alternativas ao impeachment da presidente Dilma, como a convocação de novas eleições, “servem apenas para “fragilizar” a tese do afastamento da petista. “Neste instante, quaisquer dessas medidas criativas e utópicas – porque não têm qualquer correlação com a realidade – servem apenas para fragilizar a tese do impeachment”, disse Aécio. O tucano afirmou que não há convergência entre presidentes dos poderes para que uma proposta de emenda à Constituição (PEC), que antecipasse as eleições, tivesse condições de prosperar no Congresso Nacional.
A presidente Dilma ironizou a proposta de eleições gerais. “Essa proposta, como várias outras, é proposta. Não rechaço nem aceito, mas convença a Câmara e o Senado primeiro a abrir mão dos seus mandatos. Aí vem conversar comigo”, afirmou. Dilma, mais uma vez, disse que não está disposta a renunciar, o que seria uma outra opção para o desfecho da crise. A outra hipótese é que ela seja absolvida no processo de impeachment e, nesse caso, trabalhe para reconstruir sua base no Congresso, que foi esfacelada nos últimos meses e mais minada ainda depois do desembarque do PMDB.
Um outro caminho foi defendido pela ex-ministra Marina Silva (Rede). Para ela, a via constitucional para as novas eleições tem de ser o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Marina defendeu a convocação de novas eleições presidenciais, caso se comprove que dinheiro oriundo da corrupção tenha “alterado a vontade soberana da sociedade brasileira nas (últimas) eleições”. Segundo a ex-ministra, se o dinheiro da corrupção foi usado “para fraudar as eleições, que se casse a chapa Dilma-Temer”. Ela falou durante o lançamento da campanha da Rede Sustentabilidade chamada de “Nem Dilma, nem Temer, nova eleição é a solução”.
‘MEDIDAS RADICAIS’ Para o professor de direito constitucional José Alfredo de Oliveira Baracho Junior, a hipótese juridicamente mais difícil é a de eleições gerais, já que as hipóteses de perda de mandato são especificadas na Constituição. “Sob o ponto de vista jurídico, dependeria de medidas muito radicais, acho o cenário mais improvável. Na minha avaliação, uma emenda constitucional não poderia alterar os mandatos em curso, poderia repercutir apenas sobre os novos”, afirmou.
Já a hipótese de um duplo impeachment, da presidente Dilma e do vice Temer, segundo o advogado, poderia levar o Brasil a ser governado até 270 dias por Eduardo Cunha. “Isso ocorre tão somente no caso de conclusão dos dois processos com condenação. Não basta admitir o processo porque isso não gera vaga”, disse. Nessa hipótese, segundo Baracho, o presidente da Câmara tem mais 90 dias para convocar novas eleições somente para presidente e vice-presidente. Se isso ocorrer até o fim deste ano, serão eleições diretas. Caso a vacância ocorra nos dois últimos anos de mandato, caberá ao Congresso escolher os novos governantes. A renúncia dupla, segundo o advogado, abreviaria tudo, sendo necessários apenas os 90 dias para a convocação de novas eleições. Já se apenas Dilma abrir mão do cargo, Temer assume seu posto como presidente. (Com agências)
Os últimos acordes
Proposta do senador Valdir Raupp (PMDB-RO) de antecipar as eleições gerais para outubro deste ano é apontada como opção pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que a vê “com bons olhos”.
Já a presidente Dilma Rousseff (PT) ironizou a opção e disse que poderia conversar, desde que os deputados e senadores aceitassem antes abrir mão dos seus mandatos. Pela proposta, os eleitores votariam para presidente, governador, senador e deputado, além de prefeitos e vereadores.
Mais tarde, o presidente do PSDB, senador Aécio Neves, criticou a convocação de novas eleições como solução para a crise política. Para ele, além de ser utópica, a proposta fragiliza o processo de impeachment.
Já ex-ministra Marina da Silva defendeu a cassação dos mandatos de Dilma e Michel Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que convocaria novas eleições caso se comprove que dinheiro oriundo da corrupção tenha sido usado “para fraudar as eleições”.
Ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, concedeu liminar determinando que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), dê seguimento a um pedido de impeachment contra o vice-presidente Michel Temer, enviando o processo para comissão especial. Nele, um advogado mineiro alega que Temer também cometeu crime de responsabilidade ao assinar decretos de créditos suplementares em desacordo com o orçamento.
O ministro Gilmar Mendes, usou do sarcasmo para comentar a decisão do colega de Corte. Disse que não conhecia impeachment de vice-presidente, mas que Marco Aurélio está “sempre ensinando”.
Oposição pressiona Eduardo Cunha a não cumprir a decisão do STF. Irritado com a liminar, o peemedebista afirmou que vai ignorar a ordem do ministro. À imprensa Cunha disse que a decisão foi absurda e que, por ela, teria que abrir oito pedidos de afastamento de Dilma pendentes de análise. Ele vai recorrer hoje. Marco Aurélio rebateu e diz considerar “impensável” o descumprimento da decisão, que poder considerado crime de responsabilidade.
Impeachment de Temer
O advogado mineiro Mariel Marley Marra acredita que é “tendência natural” o plenário do Supremo Tribunal Federal confirmar a liminar concedida pelo ministro Marco Aurélio Mello que determina abertura de impeachment do vice-presidente Michel Temer. Marley recorreu ao STF depois que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, arquivou seu pedido. “Dilma foi responsável pela assinatura de decretos abrindo créditos suplementares em desacordo com a lei orçamentária anual e o Michel havia também assinado e realizado a mesma conduta”, afirma o advogado para justificar o pedido de impeachment. “O que fiz foi um senso de justiça, um caso de pau que dá em Chico dá em Francisco”, explicou.