Mar de Lama, da PF, aponta 128 crimes de corrupção em Governador Valadares

Segundo o procurador da República Felipe Valente Siman, o início da investigação se deu a partir da transferência de recursos federais para Governador Valadares por causa das fortes chuvas no final de 2013

São Paulo - A Operação Mar de Lama, deflagrada nessa segunda-feira, 11, para combater desvios de R$ 1,5 bilhão de verbas dos cofres públicos para empresas ligadas ao Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) de Governador Valadares (MG), levou ao afastamento 20 agentes públicos e políticos, entre eles oito vereadores da Câmara Municipal.
A PF descartou o envolvimento da prefeita Elisa Maria Costa (PT).

Foram apreendidos carros de luxo, um jet ski, uma quantia em dinheiro vivo não contabilizada, planilhas, documentos, computadores e celulares. A PF ainda não catalogou todos os itens apreendidos.

Segundo o procurador da República Felipe Valente Siman, o início da investigação se deu a partir da transferência de recursos federais para Governador Valadares por causa das fortes chuvas no final de 2013. O Ministério Público Federal instaurou um inquérito civil com o objetivo de fiscalizar a aplicação desse dinheiro.

"Logo nós percebemos que o quadro que se apresentava era muito grave. De modo que quase que a integralidade dos recursos repassados foram desviados. E nos chamou atenção e causou perplexidade o fato de que o dinheiro que veio para Governador Valadares para custear quedas de barreiras e estradas vicinais deterioradas foi utilizado para satisfazer interesses privados dos investigados. Inclusive, foi acompanhado pela investigação compra de carros de luxo", disse o procurador.

"Então, foi assim que o dinheiro foi repassado. A partir daí o Ministério Público requisitou a instalação de inquérito policial com o valoroso apoio da Controladoria Geral da União.
Um quadro que se apresenta hoje dentro da prefeitura e do SAEE é de verdadeiro descalabro, organização criminosa mesmo", adicionou.

O delegado da Polícia Federal Cristiano Jomar Costa Campidell disse que Mar de Lama representa a fase ostensiva da operação, após mais de um ano de investigações sobre desvios de verbas de obras para recuperação de Valadares.

A PF cumpriu 63 mandados de busca e apreensão, 47 em Governador Valadares, 9 em Belo Horizonte, dois em Nova Lima, um em Esmeraldas, um em Jequeri, dois em Castelo e um em Muqui, no Espírito Santo. Foram cumpridos oito mandados de prisão temporária, sendo cinco em Governador Valadares, dois em belo Horizonte e um em Jequeri.

"Essa é a investigação. Algumas pessoas, é importante dizer, praticaram tantos crimes durante as investigações que a soma das penas máximas pode chegar a 775 anos de prisão", disse o delegado.

"Nós apuramos até o presente momento 150 crimes praticados, sendo por exemplo, 64 por corrupção passiva, 64 por corrupção ativa. Enfim, uma imensa gama de crimes praticados por essa organização criminosa instalada na prefeitura municipal de Governador Valadares no Serviço Autônomo de Água e Esgoto da cidade”, afirmou Campidell.

A força-tarefa da Polícia Federal informou que a operação deflagrada hoje começou em 2013 quando o Ministério da Integração Nacional repassou R$ 4,5 milhões à cidade para ajudar a recuperar vias e canais destruídos pela chuva.

"A investigação continuou e chegou a outras quatro dispensas de licitação e posteriormente a dois procedimentos chamados RDC (Regime Diferenciado de Contratação) e por fim há uma licitação totalizando 11 contratos fraudulentos, no total de R$ 1,5 bilhão", explicou o delegado.

O procurador Siman informou que Mar de Lama obteve judicialmente a indisponibilidade de bens dos investigados.

Em nota, a prefeitura de Governador Valadares informou que todas as obras de recuperação foram concluídas. "Refutamos a informação que tem sido divulgada equivocadamente de que R$ 1,5 bilhão teriam sido desviados por agentes políticos, deixando a população sem as obras e serviços correspondentes", afirma a administração municipal.

"Os agentes públicos foram afastados por serem detentores de cargos de confiança", declarou o delegado Campidell. "O afastamento é com prejuízo da remuneração. O município não vai mais pagar salário para essas pessoas. Porém, os agentes políticos (vereadores), por terem mandatos eletivos, vão receber até que seus mandatos sejam cassados na Câmara Municipal. Então, a população vai ficar pagando os salários deles até que a o mandato deles seja cassado."

A operação identificou fraudes em dois procedimentos de dispensa de licitação para serviços de limpeza, por meio dos quais uma empresa de fachada recebeu R$ 4 milhões. Esse valor é parte de R$ 4,7 milhões repassados pelo Ministério da Integração Nacional, em 2013.

Os oito vereadores afastados só poderão ter o mandato cassado caso isso seja votado na Câmara Municipal. São eles: Ricardo Assunção (PTB), Levi Vieira da Silva (PMN), Marinaldo Carlos de Amorim, o Zangado (PROS), Sezary de Oliveira Alvarenga, o Cezinha (PRB), Ananias Paula da Silva (PSB), Geovanne Honório (PT), Gledston Gomes de Araújo (PT) e Milvio José da Silva, o Milvinho (PROS).

O delegado Campidelli destacou o papel dos vereadores sob suspeita. "Foi apurado que eles votariam projetos de interesse da organização criminosa", disse.

Defesas

A prefeitura de Governador Valadares informou por meio de nota que as obras foram realizadas. "Assim, diferente do que se tem afirmado, o recurso destinado à recuperação dos estragos causados pela chuva, ou seja, os R$ 4,7 milhões foram utilizados para os fins aos quais se destinava.
"Foi feita e aprovada prestação de contas deste valor para a Defesa Civil Nacional e Ministério de Integração Nacional, estando a Prefeitura totalmente regularizada quanto a esses recursos", diz o texto.

A Câmara Municipal de Governador Valadares informou que vai encaminhar pedido à Justiça Eleitoral para saber qual deve ser o processo para indicação e quais suplentes assumirão os mandatos. Isso porque vários funcionários trocaram ou deixaram as funções de suplente desde o início do mandato, em 2013..