Brasília – Em um duro discurso direcionado ao vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB), e ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a presidente Dilma Rousseff afirmou, sem citá-los nominalmente, que "existem dois chefes do golpe que agem em conjunto e de forma premeditada".
Em evento com representantes do setor de educação nesta terça-feira, Dilma se referiu aos políticos como "chefe e vice-chefe do gabinete do golpe" que estão tentando montar uma fraude para interromperem, no Congresso, o mandato dela.
A saraivada de críticas de Dilma começou quando a presidente citou o vazamento, na segunda-feira, de áudio no qual Temer fala como se o processo de admissibilidade do impeachment já tivesse sido aprovado na Câmara, em votação prevista para d.omingo.
Temer assumiu o áudio e atribuiu o vazamento a um equívoco. "Vivemos tempos estranhos e preocupantes; tempos de golpe, de farsa e de traição. Ontem utilizaram a farsa do vazamento para difundir a ordem unida da conspiração", afirmou. "Conspiram abertamente, à luz do dia, para desestabilizar uma presidente legitimamente eleita", emendou Dilma, sob os gritos de "Fora Temer" dos presentes.
Para a presidente, as calúnias contra ela ocorrem enquanto "leiloam posições no gabinete do golpe, no governo dos sem-voto", numa referência às negociações feitas para a formação de um governo caso ela seja afastada. O vazamento do áudio foi, de acordo com a presidente, um disfarce para o golpe. Com a atitude, avaliou Dilma, "subestimaram a inteligência dos brasileiros e brasileiras".
No áudio, segundo ela, "um dos chefes da conspiração", no caso Temer, assume a condição de presidente da República, "gesto que revela a traição a mim e, ainda, à democracia, e explicita que esse chefe conspirador também não tem compromissos com o povo". Dilma acrescentou que a acusam de usar expedientes escusos, "me olhando pelo espelho deles".
Numa tentativa de colocar Temer contra os parlamentares, a presidente disse no discurso que o vice atropela ritos em curso no Congresso Nacional "em completo desrespeito ao Legislativo". Para ela, isso seria "uma traição" a ela e à democracia.
A presidente ironizou ainda o fato de Temer dizer, na gravação, que pensa em manter as conquistas sociais do governo dela e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, entre elas o Bolsa-Família. "Como se conquistas sociais se pensasse, ou não, em manter", desabafou. "É uma atitude de arrogância e desprezo pelo povo. Se ainda havia uma dúvida que há um golpe de estado em andamento, não há mais".
Dilma disse não saber exatamente quem é o "chefe ou o vice-chefe do gabinete do golpe" e que estão "tentando montar uma fraude para interromper no Congresso" o mandato dela. Mas a presidente, sempre sem citá-los nominalmente, se referiu a Cunha como a "mão, não tão invisível assim, que conduz desvios de poder e abusos inimagináveis no processo de impeachment" e a Temer, como o "outro (que) esfrega as mãos e ensaia a farsa do vazamento de um pretenso discurso de posse".
Para a presidente, o relatório aprovado ontem na comissão da Câmara é frágil e o processo contra ela é comandado pelos que pretendem rasgar os mais de 54 milhões votos que obteve em 2014 e ainda os dos que não votaram nela e respeitaram o processo democrático. "Os golpistas tentarão de tudo, nos intimidar, nos tirar das ruas. Vazamentos ilegais e acusações sem provas podem acontecer", afirmou. "Mas fiquem atentos, não aceitem provocações; não somos do ódio, somos da paz", concluiu.
Dilma, que tem feito pelo menos dois discursos por semana contra os ataques que vem sofrendo, voltou a avisar que vai vencer a votação de domingo e a partir de hoje estará ao lado do ex-presidente Lula para discutir as estratégias e próximos passos para convencer os indecisos e aqueles que mudaram de lado.