Dilma: País vive interação de instabilidade política profunda com crise econômica

A presidente repetiu o discurso de que a crise econômica é cíclica, que primeiro atingiu os países desenvolvidos e depois as nações em desenvolvimento

A presidente Dilma Rousseff admitiu nesta quarta-feira, em entrevista a um grupo de jornalistas no Palácio do Planalto, que o País vive a interação entre uma instabilidade política extremamente profunda, que há 15 meses afeta o País, e a crise econômica.
"Eu não digo que a crise econômica derive integralmente da política, acho que ela é intensificada, acho que ela é bastante piorada, agora, sobretudo eu acho que a nossa capacidade de recuperação se mostrou limitada pela crise política", afirmou a presidente.

Dilma repetiu o discurso de que a crise econômica é cíclica, que primeiro atingiu os países desenvolvidos e depois as nações em desenvolvimento. Para ela, ninguém pode subestimar o efeito da queda das commodities sobre o conjunto da economia e o fato de que não houve uma recuperação significativa da economia americana. "Mas tem características próprias do Brasil. Eu não acredito que se deve fundamentalmente à política anticíclica que nós adotamos a partir de 2009 as nossas mazelas econômicas. Acho que não".

A presidente avaliou que as ações do governo adiaram os efeitos da crise, mas o que o Brasil ainda tem várias "disfunções" que precisam ser superadas. "Acredito que tivemos um aprofundamento da crise derivado do fato de que nós, ao fazer a política anticíclica, nós derrubamos bastante a arrecadação do País", afirmou. "Nós tivemos um nível de redução de impostos bem elevado", afirmou.

Entre as medidas citadas por ela para tentar mitigar e adiar os efeitos da crise no País, as quais tiveram como resultado a queda na arrecadação estão o Programa de Sustentação do Investimento (PSI), com juros de 2,5% ao ano, a redução do imposto sobre bens de capital de 30% para 4%.
Essas medidas, para ela, seguraram o emprego "Se você for olhar no meu período - sem contar o período do presidente Lula - de 2011 a 2014, críamos um pouco mais de 5,2 milhões de empregos. Se a gente for olhar hoje o saldo, mesmo com 15 meses de profunda crise econômica, nós perdemos em torno de 2,6 milhões empregos. Conseguimos manter um saldo de 3 milhões e pouco (de empregos)".

A presidente avaliou ainda que a economia internacional começa a dar sinais que vai diminuir o crescimento do lado dos emergentes e processo que necessariamente terá de ser enfrentado pelo governo. "Ninguém saiu de processo de crises sem enfrentá-las". Por outro lado, segundo a presidente, o Brasil tem uma situação externa favorável, com a projeção de US$ 40 bilhões de superávit na balança comercial feita pelo Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior, ante um déficit de US$ 4 bilhões obtido em 2014. "Todos os países mais parecidos conosco tiveram uma saída via aumento das exportações, substituição de importação por insumos mais caros".

Dilma considerou que outro ponto de melhora na economia foi a queda da inflação, mas relacionou a redução, bem como a alta no ano passado, ao preço da energia elétrica. "Tivemos um ajuste de tarifas brutal, tivemos bandeira vermelha e tivemos que botar todas as térmicas para funcionar para não termos racionamento. Tem gente que acha isso errado. Não, isso faz parte de qual é a estrutura do sistema e é um dos fatores que pesa na inflação tanto para cima quanto para baixo".

Pauta-bomba


Na entrevista, a presidente afirmou ainda que serão necessárias reformas profundas para o País, mas admitiu que para isso é preciso unidade. Ela criticou, por exemplo, as chamadas pautas-bomba votadas no Congresso, consideradas por ela como "disfunções" e citou, entre elas, o projeto de decreto legislativo (PDL) do deputado Espiridião Amin (PSD-SC) que altera contabilização das dívidas dos Estados com a aplicação de juros simples em vez dos juros compostos. Segundo a Fazenda, a medida tem o potencial de gerar um rombo superior a R$ 300 bilhões aos cofres da União.

"Uma pauta-bomba (que) veio da Câmara (são) os juros simples. Estamos brigando com ele (PDL), pergunta pro Nelson Barbosa, desde o primeiro dia de 2016. O deputado Espiridião Amin fez esse projeto terrível".
Para Dilma, mais que os R$ 300 bilhões de perdas potenciais de receita, o problema maior é a paralisia que pauta-bomba como essa causa. "Nós termos que ir sistematicamente ao Congresso dizer: não façam isso, não podem fazer isso, isso é um absurdo para o País", disse. "Pauta-bomba é aquela pauta que a pessoa, ou o conjunto, acha que é possível sair de uma situação difícil colocando fogo em todo o restante"

Dilma lembrou que no ano passado ao menos cinco grandes pautas-bomba com R$ 140 bilhões de perdas para o governo tramitaram no Congresso. "Nós tivemos esse processo durante 15 meses, desde a minha eleição e não preciso comprovar, basta que vocês leiam o que vocês mesmos escreveram", afirmou.

Reforma política

A presidente considerou também que é difícil supor que alguém reestruture a política no País sem uma reforma no setor. Dilma criticou o crescimento no número de partidos, o que torna difícil um acordo de governabilidade, e lembrou que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) conseguiu a maioria no parlamento com apenas três partidos e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também necessitou de um grupo menor de legendas. "No início do meu segundo mandato, nós temos 26 ou 27 partidos, com partidos que não têm representação congressual e ainda o nível de unidade é diferenciada, com várias tendências de um único partido".

Dilma criticou novamente o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), responsável por aceitar o processo de impeachment que tramita contra ela. Para a presidente, Cunha é um dos grandes responsáveis pelas pautas-bomba e pela não votação de reformas necessárias no Congresso.

Para Dilma, processo de impeachment marcará profundamente a história do presidencialismo no Brasil. Com fez ontem, a presidente voltou a criticar na entrevista Cunha e Temer, sem citá-los nominalmente, classificando os políticos como chefe e vice-chefe do golpe, agindo ocultamente..