O convidado mais ilustre, por três ocasiões, foi o ex-ministro e ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim.
Outro convidado, na área econômica, por duas vezes, foi o economista Arminio Fraga, ex-presidente do Banco Central no governo Fernando Henrique Cardoso. O senador e economista José Serra (PSDB-SP) compareceu com frequência.
Agora eu já posso contar, disse Heráclito Fortes ao jornal O Estado de S. Paulo no burburinho do café anexo ao plenário da Câmara dos Deputados. Muitas vezes deputado - desde 1982, pela Arena, e depois pelo PMDB, onde, deputado constituinte, ganhou a confiança de Ulysses Guimarães -, uma vez prefeito de Teresina e outra senador, Heráclito não conseguiu se reeleger em 2010. Administrou a paulada - que atribuiu parcialmente ao governo petista - e voltou, em 2014, como o mais improvável socialista que se possa imaginar.
Não viu muita gente de confiança para jogar conversa fora, como nos velhos tempos. Angustiado com isso, fez um primeiro jantar-laboratório na casa do Lago Sul. Era 15 de abril do ano passado.
Dezoito convidados ouviram o ex-ministro Nelson Jobim, pela primeira vez, no primeiro mês da articulação. Nós precisávamos ter uma noção técnica de um processo de impeachment. E ele foi perfeito. Mostrou os três lados da moeda, lembrou o deputado piauiense.
G de geriátricos
Além dos jantares - informais, para a média de 20 convidados, entre os fixos e os variáveis -, havia um almoço, quase semanal, com um grupo mais restrito: Heráclito Fortes, Jarbas Vasconcelos, José Carlos Aleluia, Raul Jungmann, Marcos Pestana (PSDB-MG), Tadeu Alencar, Rubens Bueno (PPS-PR) e Mendonça Filho. Era o cérebro da conspiração - para usar uma imagem que os mais velhos, os quatro primeiros, conhecem bem. Entre eles próprios, com a intimidade que as amizades permitem, batizaram-se de G-8. O G, no caso, significando geriátrico - uma homenagem aos setentões, ou quase. Heráclito, por exemplo, ainda tem 65.
Reuniam-se no restaurante argentino 348 - e rachavam a conta. Não houve tema importante da crise política que não passasse por esse grupo, o do almoço e o dos jantares, disse o deputado Raul Jungmann. Foi um estado-maior informal do impeachment, reuniões onde se preparava o cardápio do que iria ser servido.
Sorriso amarelo. No animado e barulhento café da Câmara, Heráclito é cumprimentado a cada cinco minutos. Um dos que chegam, com um tablet na mão, é o deputado petista Ságuas Moraes (MT).
Os encontros foram importantes, avalia Heráclito, porque arrumava a cabeça, e cada um saía com orientação do que falar.
Na sexta passada, quando o acesso dos jornalistas ao plenário ficou muito restrito, o deputado Júlio Lopes (PP-RJ) fez a gentileza de comparecer a um outro café da Câmara, o que fica no Salão Verde (por conta do carpete desbotado). Tem água e café de graça para qualquer um que queira. Num dia comum, as dez máquinas produzem 600 litros de café, gentilmente servidos, no balcão, por cinco garçons. Lopes é a própria elegância - e traz, na lapela do terno bem cortado, a fita verde-amarela que tem simbolizado a oposição. O Heráclito montou um núcleo de inteligência, com pessoas que têm um comprometimento maior, uma reflexão mais aprofundada, disse, modestamente excluindo-se. Lá, nos jantares, a gente discutia dentro de uma contextualização real dos fatos, sem a necessidade de estar adjetivando tudo. Como ninguém é de ferro, Heráclito era generoso nos comes e bebes que mandava servir. Posso garantir que não há comida melhor em Brasília, uma culinária nordestina perfeita, sempre regada dos melhores vinhos de uma adega extraordinária.
Lopes ilustrou os motivos de Heráclito para criar o núcleo de inteligência com uma história já algo conhecida, mas sempre saborosa: o dia em que o ministro da Articulação Política, o deputado petista Pepe Vargas, foi à Câmara dos Deputados e não reconheceu justo Heráclito Fortes, que muito antes de seu homônimo grego já sabia que não se pode percorrer duas vezes o mesmo rio, ainda mais naquele estuário. É como ir a Disneylândia e não reconhecer o Mickey. Ir a Roma e não reconhecer o Papa. Já dizia tudo sobre como esse governo trata a política, disse o parlamentar do Rio de Janeiro.
Oráculo
Lopes também ficou bem impressionado com as contribuições de Nelson Jobim: Suas exposições nos permitiram ver com clareza como os fatos se dariam, sob suas diferentes perspectivas.
Danilo Forte, do PSB do Ceará - que chama o núcleo de ágora, a praça grega das assembleias populares - troca em miúdos a contribuição do ex-ministro Nelson Jobim: Ele nos deu conforto nos momentos em que decisões do Supremo nos desanimaram. Disse que era necessário criar um ambiente político dentro do Congresso, para poder viabilizar uma votação do impeachment, e que também era necessário apresentar um projeto de alternância de poder.
Carlos Marun, do PMDB do Mato Grosso do Sul, está no primeiro mandato. Defensor vigoroso do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, já fala grosso como linha de frente da oposição mais empedernida. Foi convidado para uma dúzia dos jantares de Heráclito. Esse grupo foi fundamental, disse. Ajudou a ampliar o número de deputados pró-impeachment e, principalmente, aparou as arestas entre estratégias momentaneamente discordantes.
Estrela esmagada
Pauderney Avelino, outro entusiasta do impeachment, é o líder dos Democratas. Na sala de imprensa de seu gabinete, um designer gráfico martela, no computador, uma estrela vermelha, o símbolo do PT. O artista experimenta várias formas de marteladas. A ideia é que a estrela esteja totalmente esmigalhada, e a imagem pronta para a capa do boletim diário, na hipótese de o impeachment passar. Avelino vai aos jantares desde o começo. O Heráclito é o meu socialista predileto, diz. O grupo que ele montou foi muito importante no momento em que estávamos num turbilhão, e sem uma direção certa. Foi lá que o impeachment foi tomando corpo.
O grupo do Heráclito teve muita conversa, e pouquíssimo vazamento, disse o ex-governador de Pernambuco e deputado de terceiro mandato Mendonça Filho, outro de seus participantes frequentes, inclusive no G-8. Não era uma agenda de conspiração, mas uma agenda de construção do Brasil, afirmou. Discutiu o impeachment durante 12 meses, e foi uma bússola, sem a qual teríamos errado mais. Das comidas memoráveis, Mendoncinha, como também é conhecido, citou a farofa, a carne de sol e o bacalhau. Se fôssemos pagar a conta de vinho, não ia dar, brincou.
O Heráclito, com esse grupo, foi muito mais do que um supridor, comentou o bom humor do deputado federal Benito Gama (PTB-BA), outro integrante do grupo, desde os primórdios. A crise brasileira foi pauta de todos os encontros - e por aí é que achamos a solução que se avizinha, melhor para o País.
Convidado especial
No plenário, na sexta de manhã, Gama se divertia com a piada da hora (ou do minuto): as três maiores peregrinações do mundo são a de Fátima, a de Aparecida e a do Palácio Jaburu. Este é, por enquanto, o bunker do vice-presidente Michel Temer.
Na semana que passou, o grupo de Heráclito o recepcionou duas vezes. A primeira, muito restrita, foi na terça, com 14 parlamentares presentes na casa do senador Jarbas Vasconcelos. Temer ouviu um relato e uma avaliação de como estavam as coisas. Gostou - sem arroubos.
A segunda, na quinta-feira, foi na casa da filha de Heráclito, no Lago Sul - uma espécie de reunião ampliada do núcleo de inteligência, com cerca de 80 presentes. O vice-presidente manteve a contenção. Não queremos criar um clima de já ganhou, disse Raul Jungmann, que lá esteve.
No café dos deputados, pela terceira ou quarta água, Heráclito Fortes disse, na quinta-feira, que apostava 99,9% que o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff seria aprovado na Câmara.
Só um fato imponderável poderá modificar esse quadro, afirmou. Sobre o drama político e pessoal que a presidente está vivendo, foi implacável: Todo esse drama foi criado pelo partido dela. Nós da oposição não tivemos capacidade e competência para criar uma crise. Ela é produto da arrogância, da prepotência e da incompetência do governo. Jogaram um cesto de pedras para cima e não estão conseguindo sair de baixo. As informações são do jornal
O Estado de S. Paulo..